Marcelo de Almeida Barbosa, da Barbosa & Andrade
Data: 19/04/2017
Edição: EM Março 2017 - Ano 45 - No 516
Compartilhe:Os sistemas de aterramento em edificações, indústrias, subestações, etc. devem ser inspecionados periodicamente para assegurar a manutenção das condições de segurança pessoal e patrimonial das instalações, e, consequentemente, atender às recomendações das normas NR-10 e NBR-5419-3-2015 [1-2].
A NR-10, subitem 10.2.4, estabelece que a documentação dessas inspeções e medições do SPDA e aterramentos elétricos deve ser parte integrante dos Prontuários de Instalações Elétricas. Por sua vez, a NBR 54193, no item 7, apresenta recomendações quanto ao conteúdo, periodicidade e documentação da inspeção.
Em relação ao conteúdo, a norma sugere:
Em relação à documentação gerada, inclusive para atendimento à NR-10, devem ser observados:
Este trabalho apresenta um método para inspeções e diagnósticos de sistemas de aterramento de grandes dimensões, de forma a possibilitar:
Diagnósticos foram realizados em uma grande planta de pelotização de minério de ferro, cuja malha de aterramento industrial é constituída por um sistema único de aterramento de grande porte, ocupando área de aproximadamente 180 mil m2.
Em primeiro lugar, deve-se avaliar a característica do solo onde está implantada a malha. A resistividade aparente do solo (ρa), que é subsídio para estimativa da resistência de aterramento, é determinada através de medições da resistividade do solo pelo método de Wenner [3] e de software computacional específico para obtenção da estratificação do solo. A tabela I apresenta os resultados das medições de resistividade e estratificação do solo.
Por se tratar de uma malha de um grande sistema de aterramento, as medições de resistividade têm de ser feitas na periferia da planta industrial, para que as massas metálicas não interfiram nas medições, provocando erros nos valores obtidos. Recomenda-se afastamento mínimo de 10 m.
Para que os valores de resistividade sejam representativos do solo, sugerese, no mínimo, quatro locais de medição nos quatro lados da planta.
A partir das medições de resistividade, do conceito do raio do círculo equivalente que abrange a área do sistema de aterramento (ρ) e de ábacos (0, d, ρ2/ρ1), determina-se a resistividade aparente do solo (ρa), sendo no caso estudado:
r = 77,1; ρ2/ρ1 = 3,68; N = 3
Obtém-se então:
ρa = N . ρ1
ρa = 235 Ω m
Para uma área isolada de pequenas dimensões, utiliza-se o método da Queda de Potencial, no qual o eletrodo de corrente é cravado a uma distância não inferior à maior dimensão da malha de aterramento. Algumas concessionárias recomendam distâncias superiores a três vezes a maior dimensão, para garantir o patamar da curva resistência x distância.
No entanto, para grandes sistemas de aterramento, como a do exemplo em questão, o uso do método da Queda de Potencial é impraticável. Neste caso, recomenda-se o método de Interseção de Curvas, que resolve dois problemas práticos: a determinação do centro elétrico e a dificuldade de emprego de distâncias consideráveis para afastamento dos eletrodos auxiliares.
No exemplo em questão, foram feitas quatro séries de medidas, em locais diferentes, conforme mostra a figura 1.
A figura 2 apresenta os resultados de uma das séries de medições para distâncias do eletrodo de corrente de 200 e 100 metros (c) em função das distâncias de eletrodo de potencial (p).
Aplicando-se o método da Interseção de Curvas, traça-se uma segunda curva ou curvas a partir do traçado para o método da Queda de Potencial. Sendo λ a distância do ponto de origem ao centro elétrico do sistema, a solução gráfica assume um grupo de valores para λ e, então, são calculados os correspondentes valores de r = 0,618 (c+λ) – λ, e a resistência obtida direto da curva p x R para uma determinada distância c [4].
As resistências obtidas são plotadas contra os correspondentes valores de λ em um segundo gráfico (curva R x λ) para os diferentes valores de c. A interseção dessas curvas será o valor verdadeiro da resistência de terra, mostrado na figura 3.
Considerou-se no trabalho o valor verdadeiro da resistência de terra da malha da planta industrial como a média das quatro séries de medidas, resultando em uma resistência R = 1,37 Ω.
Um cálculo teórico da resistência ôhmica de uma malha de terra pode ser obtida através da equação abaixo:
onde:
ρa = resistividade aparente do solo (Ωm);
A = área ocupada pela malha (m2); e
L = comprimento total dos cabos e eletrodos que formam a malha (m);
Alguns softwares já fornecem uma medição calculada através da equação. No exemplo dado, a resistência esperada da malha é de aproximadamente 0,32 Ω, considerando comprimento de cabos e hastes de 3000 m (estimado a partir do desenho do sistema geral de aterramento).
A tabela II mostra uma comparação entre os valores obtidos em 2015 com as medições realizadas há três anos. Apesar dos valores medidos serem bem inferiores a 10 ohms, a malha apresenta resistência de aterramento bem superior à esperada (0,32 Ω) em um solo de resistividade relativamente baixa.
Observando os resultados da tabela, pode-se concluir:
O objetivo destas medições é verificar a integridade entre os principais pontos do sistema de aterramento geral da planta industrial. A metodologia utilizada baseia-se na injeção de corrente contínua entre cada dois pontos (A e B). Para isto, utilizou-se um microhmímetro digital, que pode fornecer corrente de até 10 A, conforme figura 4. Este ensaio não deve ser feito com multímetro ou equipamento de baixa potência, pois pode levar a falsas conclusões.
Como critério geral, considerouse a existência de continuidade das interligações metálicas entre subestações, estruturas ou anéis de aterramento com resistência ôhmica inferior a 1,0 ohm. Acima deste valor, o retorno da corrente de curto faseterra é comprometido, assim como a equalização para descargas atmosféricas (fator importante para equipamentos sensíveis). Esta metodologia está fundamentada no Anexo F da NBR 5419-3.
A tabela III apresenta um modelo de relatório para ensaios de continuidade.
A inspeção/medição da integridade da malha de aterramento revelou várias não-conformidades:
A NBR 5419 estabelece novos conceitos para inspeções, como o uso demicro-ohmímetros com corrente fortepara ensaios de continuidade e a avaliação da resistência de aterramentoatravés de cálculo. Para maior consistência, pode-se utilizar o método daInterseção de Curvas, a fim de se obtervalores medidos para efeito comparativo.
A periodicidade também foi maisclaramente definida: frequência anualpara indústrias situadas em ambientesagressivos, incluindo as localizadasem região litorânea ou as que lidamcom explosivos.
A nova norma suprimiu ainda o valor da resistência de aterramento de 10 ohms, orientando que este seja compatível com o arranjo, dimensões do sistema e resistividade do solo, avaliando os gradientes de potencial no solo.
No exemplo apresentado, foi mostrado um método para inspeções e diagnósticos que destaca a importância da determinação da estratificação da resistividade do solo; da comparação dos valores medidos e calculados da resistência de aterramento; dos resultados dos ensaios de continuidade; e principalmente da interpretação desses resultados junto com as inspeções visuais das condições físicas do sistema de aterramento.
A malha avaliada apresentou uma série de problemas, incluindo número elevado de descontinuidades e diversas estruturas sem aterramento (vigas I dos galpões), o que justifica a resistência de terra acima do valor esperado para uma malha de grandes dimensões e solo de baixa resistividade. Outro problema encontrado foi o comprometimento do retorno da corrente de curto-circuito e a equalização de potenciais entre as áreas — fator particularmente importante para equipamentos sensíveis.
Na instalação industrial considerada, houve um sinistro com grandes perdas, devido a um curto-circuito fase-terra em um dos cabos isolados de média tensão de um dos alimentadores da planta, conforme mostrado na figura 5.
Uma descontinuidade do sistema de aterramento, no retorno da corrente de curto fase-terra, em um sistema aterrado via resistor, reduziu a IcØT. Desta forma, os relés de proteção não atuaram, causando sobretensões nas fases sãs do cubículo de manobra (da ordem de tensão entre fases para as tensões fase terra) e gerando arco elétrico. Portanto, é de suma importância que nos ensaios de continuidade sejam conferidas todas as interligações do sistema de aterramento com o aterramento do neutro dos transformadores.
Outro ponto importante a ser destacado nas inspeções de aterramento de grandes plantas industriais diz respeito à interligação da malha de terra da subestação principal com a malha de aterramento do processo industrial. Geralmente, deve ser feito um estudo prévio durante o projeto das malhas, a fim de determinar ou não sua interligação, baseando-se na análise das condições de segurança. Por um lado, se a interconexão reduz o GPR do sistema devido ao paralelismo, com consequente redução da resistência de terra, de outro, a interconexão pode ser muito perigosa, pois pode haver transferência de potenciais perigosos para a malha industrial, onde geralmente há locais sem controle de gradientes.
No caso das inspeções, é importante verificar o atendimento às condições impostas pelos estudos. A recomendação ou não de interconexão deve ser verificada nos ensaios de continuidade.
Uma situação extremamente perigosa detectada nas inspeções de grandes malhas é a interligação não-proposital, cujo isolamento foi recomendado em estudos. Citam-se como exemplos mais frequentes uma nova tubulação metálica de água de incêndio com hidrantes da subestação interligada com o processo industrial ou eletrodutos e leitos de cabos também saindo da subestação para o processo industrial.
Trabalho apresentado no XVI Enie - Encontro Nacional de Instalações Elétricas (23 a 25 de agosto, em São Paulo, SP).