Stefan Fassbinder, Instituto Alemão do Cobre (Alemanha)
Data: 26/09/2017
Edição: EM Setembro 2016 - Ano - 44 No 510
Compartilhe:Nos últimos anos, tem-se manifestado o receio de que a disseminação de aparalhos eletrônicos com correntes não lineares possa resultar em sobrecarga dos condutores N ou PEN, e até em incêndio. Casos isolados ocorreram de fato, mas é preciso considerar outros fatores que possam também ter sido determinantes. Entretanto, existem outros riscos implícitos nas aplicações de iluminação com lâmpadas LED.
A eficácia luminosa das lâmpadas LED disponíveis atualmente no comércio é similar à das lâmpadas fluorescentes compactas (LFC). Portanto, é quatro vezes mais alta que a das lâmpadas incandescentes a serem substituídas. Porém, todas as desvantagens das LFC, reais ou percebidas como tal, são evitadas com os LED.
Contudo, o problema de dissipação das perdas térmicas devido às diminutas dimensões dos LED, e à sua sensibilidade como semicondutores, impõe limites à respectiva potência por unidade. Um tipo de lâmpada destinada a suceder os modelos atuais em instalações existentes (retrofit) [3], que se encontra apenas a meio caminho de poder substituir uma incandescente de 100 W, continua a apresentar dificuldades. E por que “continua”, neste caso? O problema físico da dissipação térmica permanece apesar de todas as melhorias de eficiência: ou a área de arrefecimento deve ser proporcionalmente ampliada, o que levaria a uma lâmpada de bulbo, tal como as LFC, das quais queremos nos livrar, ou é necessário embutir um “resfriamento ativo”, cujo funcionamento torna a iluminação audível (figura 1), o que para ambientes residenciais está fora de cogitação [4].
Justamente nos ambientes residenciais é preferível uma iluminação distribuída com diversos pequenos pontos de luz, a uns poucos pontos de iluminação forte. A primeira ofusca menos e simplesmente tem melhor aspecto visual. A tecnologia do LED torna a realização da iluminação dirigida tão fácil como nunca, algo que as LFC não conseguem, e que a lâmpada incandescente só o faz gerando calor.
Por razões insondáveis, com o advento das lâmpadas halógenas de extra-baixa tensão veio a moda de instalar iluminação dirigida por toda parte, independentemente de sua utilidade. Os projetores passaram a ser direcionados para uma parede (oxalá) branca, para que a luz, custosa e ineficiente, se tornasse novamente difusa de modo igualmente custoso e ineficiente. Já as lâmpadas LED podem ser fabricadas com um ângulo de saída estreito, sem necessidade de que a luz assim produzida tenha de ser direcionada por meio de um refletor — o que impli-caria perdas. A óptica intrínseca ao LEDpermite ser configurada dessa forma,constituindo ela própria um “projetor”.
A iluminação de uma sala de estar,por exemplo, com quatro lâmpadas in-candescentes de 40 W cada, foi inicial-mente modificada para quatro LFCs de10 W cada. Agora nota-se um esforçopara obter quatro lâmpadas LED tam-bém de 10 W, mas isso já se mostra umtanto difícil. Pretende-se que todas se-jam compatíveis, também no sentido es-tético, com as diversas luminárias exis-tentes — inclusive a tonalidade da luz,que, por sua vez, deve ser idêntica nos quatro pontos.
Futuramente, quando o look retrô ti-ver sido superado e for fabricada uma luminária concebida desde o início para(ou com) LED, vamos descobrir que é muito mais bonito iluminar essa sala deestar com 40 lâmpadas de 1 W. A ilumi-nação da árvore de Natal já nos permiteantever. Mesmo que esta comparaçãonão seja inteiramente válida, porquecom a distribuição em unidades tão pe-quenas a eficiência volta a declinar, essetipo de iluminação é e será sempre mui-tas vezes mais eficiente do que com lâm-padas incandescentes. Afinal, a percep-ção humana de luminosidade é uma fun-ção logarítmica.
Com a tecnologia LED, a parcela dailuminação no consumo de energia torna-se tão pequena, que ela deixa de estar no centro das atenções.
Exatamente a tendência à miniaturização facilita a maneira de “lidar” com as normas. Co mo descrito na referência [1], valores limite realmente efetivos para harmônicas em lâmpadas só se aplicam a partir de potências de 25 W [5], medidos em amostras individuais. Distribuindo-se a potência total exclusivamente por unidades abaixo de 25W, o requisito da norma é considerado “atendido”. Se isto funciona também para os problemas que deveriam, na verdade, ser evitados por meio da observância dos valores limite, é uma outra questão.
De grão em grão se faz um milhão, diz o adágio popular. As pequenas lâmpadas LED instaladas em ambientes residenciais são fontes de distorção (figuras 2 e 3). Elas dispõem, como a maioria dos aparelhos eletrônicos de sua classe de potência, predominantemente (mas não sempre – ver figura 5) de um módulo de entrada, que inicialmente consiste de uma ponte retificadora e de um capacitor de alisamento. Daí resultam picos de corrente periódicos sempre no centro de um meio período, quando o capacitor é carregado, e pausas no fluxo de corrente durante o tempo restante, enquanto a tensão residual no capacitor é maior do que o valor instantâneo da curva senoidal retificada.
Uma análise mais acurada mostra que o carregamento ocorre um pouco antes, na parte superior do flanco ascendente. Como muitos desses “grãozinhos” sempre se encontram na rede, a tensão também já está visivelmente deformada. Se a lâmpada for sobejamente provida de capacitância de alisamento, o ângulo de condução de corrente resulta proporcionalmente pequeno, porque o capacitor não perde muita tensão durante a pausa que ele deve “by-passar”. Com um pouco de sorte, consegue-se uma lâmpada cuja potência seja bem menor que 25 W, mas ainda assim provida de correção eletrônica de fator de potência (PFC, na sigla em inglês), conforme figura 5, uma vez que atualmente o custo da eletrônica necessária para isso é insignificante.
Assim sendo, o conteúdo harmônico da corrente de entrada dispensa aqui maior discussão, mas nota-se que o alisamento “grosso” é realizado à custa de transitórios “finos” de alta frequência na onda de corrente, como também pode ser observado na figura 5.
Conectando-se agora três cargas desse tipo — ou, melhor dito, três grupos completos de cargas desse tipo — aos três condutores fase de uma rede 1(figuras 6 e 7), verifica-se uma situação bem conhecida, na qual, mesmo com a distribuição simétrica das cargas, as correntes de retorno não se compensam necessariamente, ocorrendo, antes, exatamente o oposto. No presente exemplo, o ângulo de condução de corrente das cargas individuais é inferior a 60°, de modo que não existe absolutamente nenhuma superposição recíproca das correntes de fase. Em consequência, as correntes de ida e de retorno não podem se neutralizar mutuamente, resultando uma corrente no condutor neutro, cujo valor médio é o triplo da respectiva corrente de fase, mas em valor eficaz é Ö3 maior (figura 8).
O que ocorre, então, quando se interrompe o condutor neutro, que aqui parece ser mais importante que qualquer condutor fase? Afinal, não se trata de um clássico desequilíbrio de carga. Será realizado um teste com base no exemplo da figura 8. O analisador de rede utilizado (PQ-Box 200) permite registrar também a tensão entre o neutro e o condutor de proteção, o que é necessário para pesquisar problemas de EMC. Neste caso, essa funcionalidade pôde ser aproveitada para medir a tensão entre o ponto estrela da rede e o novo ponto estrela das três lâmpadas; este último se mantém “de algum modo” no centro, mas não permanece estável em hipótese nenhuma. Ele salta descrevendo um hexágono — um hexágono irregular, aleatório, porque se trata de uma carga ativa que nessa situação inusitada se comporta de modo imprevisível. Os picos de tensão entre os dois pontos estrela atingem 145 V! Nessas circunstâncias, as tensões e correntes nas cargas são muito irregulares (figura 8).
urpreendentemente, as lâmpadas ainda funcionam. Por quanto tempo elas se manteriam nesse estado, porém, não se sabe. Só após o desligamento de uma lâmpada, ou seja, da interrupção de um condutor fase, as duas restantes começaram a oscilar — embora, pelo cálculo, cada uma delas ainda devesse receber 200 V.
Um teste comparativo com um transformador de tensão variável demonstra que uma lâmpada individual só começa a oscilar abaixo de 36 V, e acende com plena potência já a partir de 75 V! O mau funcionamento do exemplo em análise deve ser atribuído, portanto, exclusivamente à ligação de duas lâmpadas iguais em série. Assim é a eletrônica: às vezes se tem a impressão de que a eletrotécnica inteira não faz sentido quando entra um pouco de eletrônica.
A confirmação dos fenômenos descritos pode ser encontrada observandose o curso dos valores eficazes ao longo de todo o ensaio (figura 9), em vez do curso dos valores instantâneos durante um único período ou poucos períodos (figuras 6, 7 e 8):
Um problema adicional, causadoigualmente pela alimentação de apare-lhos eletrônicos através de pontes retifi-cadoras e capacitores de filtro, são as correntes de partida extremamente ele-vadas (figura 10). Este artigo não com-porta uma abordagem das consequênciaspara as chaves, contatores e relés, e co-mo lidar com elas. Mas, a fim de evitardefeitos, deve-se antecipar que, mesmoaparelhos com outra arquitetura (comcorreção eletrônica de fator de potência),embora praticamente não causem har-mônicas, frequentemente apresentam al-tos picos de corrente de partida. Ex -ceções (como a da figura 5) confirmam aregra, mas isso pode não ser necessariamente assim.
Recentemente tem se ampliado a dis-cussão sobre a introdução de redes de corrente contínua, o que na maioria das vezes é apresentado como complemento, raramente como alternativa, às redes de distribuição de baixa tensão em corrente alternada monofásica e trifásica. Apenas em instalações como os data centers haverá possivelmente uma alimentação exclusiva por corrente contínua, uma vez que, tanto sob o ponto de vista dos custos de investimento, da confiabilidade, quanto da eficiência energética, é um enorme contrassenso retificar a corrente trifásica para poder armazená-la nas baterias da fonte de alimentação ininterrupta (UPS, na sigla em inglês), convertê-la novamente em corrente alternada na saída, e em seguida retificá-la mais uma vez em cada computador.
Todavia, está em curso também uma discussão sobre a alimentação suplementar de corrente contínua para os múltiplos aparelhos eletrônicos de pequeno porte nas residências e escritórios. Neste caso, cogitam-se tensões de 48 V ou 60 V, que ainda se enquadrariam na faixa de extrabaixa tensão de segurança SELV (Safety Extra Low Voltage). Isto facilitaria a proteção contra choque elétrico, e viria ao encontro do uso disseminado de muitas lampadazinhas LED com suas diminutas potências.
Dependendo do quão estável essa tensão possa ser mantida, poderia ser considerada a ligação em série de lâmpadas LED, que dispensariam fonte de alimentação e necessitariam meramente de um pequeno resistor, além de um circuito linear estabilizador de corrente provido de um transistor série [6]. Provavelmente imagina-se um retificador por residência, com tensão de saída eletronicamente estabilizada, de modo que eventuais oscilações só possam ocorrer devido à queda de tensão na linha de corrente contínua.
Contudo, a manobra de correntes contínuas que, com essas pequenas tensões, assumem, no total, valores consideráveis, representa um novo e importante desafio. Isto é particularmente válido para os já mencionados data centers, para os quais se cogita atualmente uma tensão de 400 V, mas vale também para pequenas cargas a LED, cuja extra-baixa tensão de segurança não pode ser tão “extra-baixa”, a fim de poder ainda transmitir potências razoáveis. Tudo é possível – até 120 V – mas a manobra é problemática. Não é por outra razão que a mudança para 42 V da eletrônica embarcada na indústria automotiva foi congelada, pois com 12 V em corrente contínua um arco não se sustenta, mas com 42 V, sim.
A tecnologia a LED é muito elogiada, mas às vezes fica a impressão de que o seu verdadeiro forte ainda não foi percebido. É na iluminação do ambiente residencial que suas vantagens se manifestam com nitidez. Os efeitos de interferência na rede que se apresentam nesse contexto já ocorriam exatamente, ou quase isso, com as lâmpadas fluorescentes compactas, e, portanto, não deveriam significar novidade. É o caso das harmônicas e dos picos de corrente de partida. Quem não teve problemas com ambos até o momento, também não tem o que recear agora. E se eles mesmo assim surgirem, existem soluções.