Desempenho de sistemas FV de acordo com a inclinação e azimute


Pesquisas têm sido realizadas para identificar os arranjos mais eficientes de sistemas fotovoltaicos e os principais parâmetros a serem controlados para obter o máximo de potência gerada. Este artigo avalia o impacto do ângulo de inclinação e da orientação dos painéis na produção anual de eletricidade. Para subsidiar as análises, foram realizadas simulações computacionais.


Alcy M. Júnior e Karla G.S. Santana, da UFT - Universidade Federal do Tocantins; Ane C. Macedo, da UFMG - Universidade Federal de Minas Gerais; e Olívio C.S. Nascimento e Sergio B. Silva, do Instituto Federal de Goiás

Data: 21/02/2017

Edição: FV Janeiro 2017 No 8

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Dados do relatório de 2016 da Agência Internacional de Energias Renováveis (Irena - International Renewable Energy Agency) apontam que em 2015 as instalações FV foram responsáveis por aproximadamente 47 GWp na matriz energética mundial [1]. A figura 1 ilustra o crescimento da capacidade instalada global de energia solar FV.

No Brasil, as condições para o desenvolvimento da geração fotovoltaica são favoráveis. O País possui radiação solar média diária entre 1500 kWh/ m2/ano e 2200 kWh/m2/ano, podendo alcançar até 2400 kWh/m2/ano [2]. No entanto, o uso da tecnologia solar FV ainda é recente e insignificante, conforme dados fornecidos pela Aneel - Agência Nacional de Energia Elétrica, que indicam participação da geração FV na matriz energética brasileira da ordem de 0,0144% [3].

A fim de incentivar a expansão da geração distribuída e com o objetivo de atender o Plano Nacional de Energia, a Aneel regulamentou em abril de 2012 a conexão de micro e minigeradores a partir de fontes renováveis nas redes de distribuição, em especial a solar FV, por meio da Resolução Normativa no 482/2012 (RN482) [4]. A partir da RN482, houve aumento significativo do número de micro e minissistemas FV conectados à rede elétrica (SFCR). De acordo com a Aneel [5], até o final de 2015, a potência instalada total no País era de 32 MWp, com um total de 1274 instalações registradas. Somente no primeiro semestre de 2016, segundo dados do BIG - Banco de Informação de Geração, o número de SFCR já alcançou 3370 unidades [3], demonstrando a tendência de evolução desses sistemas.

Fig.1 - Capacidade instalada global de sistemas fotovoltaicos (fonte: Irena 2016)

Este cenário de expansão da energia FV exige a investigação do desempenho desses sistemas de geração, a fim de identificar melhores opções de instalação sob o ponto de vista técnico e econômico. Adicionalmente às questões inerentes ao próprio SFCR, outros fatores influenciam sobremaneira na produção de energia, como, por exemplo, a intermitência da luz solar, a passagem de nuvens e sujeira acumulada nos painéis ao longo do tempo, entre outro. O desempenho desses sistemas pode ser observado por meio de simuladores computacionais, como Homer, PVSystem, etc. [6], os quais permitem avaliar os projetos de SFCR considerando questões técnicas — ou seja, as variáveis que interferem na produção de energia, como tempera‐ tura dos módulos FV, irradiação solar, orientação e inclinação do arranjo FV, entre outros — e econômicas. Uma vez que os módulos FV apresentam baixo rendimento, todo esforço para maximizar a produção de energia e para atingir a melhor opção financeira deve ser avaliado.

Estudos mostram que a produção anual de energia de SFCR com arranjos fixos é otimizada quando este é orientado para o norte geográfico e com inclinação igual à latitude do local de instalação. No entanto, em geral, os SFCR são instalados em telhados cuja orientação e inclinação não atendem a situação ideal, resultando numa baixa produção de energia. O projetista de SFCR deve conhecer quais condições proporcionam ganhos de produção de energia elétrica. Neste contexto, este artigo visa investigar o impacto do ângulo de inclinação e a orientação dos arranjos FV na produção anual de eletricidade de um sistema fotovoltaico conectado à rede. Para tanto, foram utilizados dados de um sistema típico localizado na cidade de Palmas, TO, e do programa computacional SOLergo

Metodologia

Fig.2 - Média da radiação solar diária (fonte Cresesb/Cepel)

A avaliação da produção de energia pelo sistema FV utilizou dados de um sistema real com potência de geração de 3,12 kWp, composto por um inversor modelo ABB PVI‐3.0‐TL‐OUTD e módulos da Canadian Solar. O arranjo FV é composto de 12 placas CS6P ‐ 260P com capacidade de produção de 260 Wp cada. O sistema encontra‐se instalado na cidade de Palmas, TO, na latitude 10,19° Sul e longitude 48,30° Oeste, com elevação de 230 metros.

A figura 2 mostra a média diária mensal da radiação solar disponível no site do Cresesb para a localidade avaliada.

Simulações computacionais foram realizadas utilizando a ferramenta computacional SOLergo (figura 4), desenvolvido pela italiana Electro Graphics, que permite avaliar sistemas FV conectados ou isolados. Inúmeros recursos são disponibilizados pelo programa computacional para avaliar o desempenho operacional desses sistemas, como cálculo da radiação solar local; produção de energia em função dos parâmetros de operação; posição dos módulos na planta arquitetônica no formato DWG; cálculo do retorno de investimento; e elaboração automática da documentação do sistema.

Neste artigo, o objetivo principal é avaliar o impacto da inclinação e da orientação do arranjo na produção de energia. Para tanto, considerou-se as 16 orientações da rosa dos ventos e, para cada orientação, variou-se a inclinação de 0° a 30° com intervalos de 5°. A figura 3 mostra a rosa dos ventos, com base nas quatro direções fundamentais e suas intermediárias utilizadas nesta análise.

Fig.3 - Rosa dos ventos com as direções fundamentais e parciais

Resultados

Considerando a condição ideal de operação do SFCR foram determinados alguns dos indicadores de desempenho com azimute a 0° (norte) e inclinação igual a latitude (10°).

A produtividade do sistema (YF, na sigla em inglês) relaciona a energia produzida pela capacidade instalada do sistema. Uma vantagem da definição da YF diz respeito à utilização da potência nominal do gerador FV, podendo comparar o desempenho entre sistemas com diferentes eficiências de conversão CC/CA ou até mesmo de geradores FV com diversas formas de montagem [7].

O desempenho global, ou razão de performance (PR, na sigla em inglês), é definido entre a razão da produtividade do sistema e a produtividade de referência. Este índice é utilizado para avaliações e comparações de sistemas fotovoltaicos conectados à rede de diferentes latitudes [8]. Já o fator de capacidade (FC) é determinado pela razão entre a produção de energia elétrica real e a produção de energia teórica, considerando que o sistema opera 24h em sua potência nominal em condição padrão (1000W/m2 e 25oC) [8]. Nestas condições, têm-se os resultados apresentados na tabela I.

Fig.4 - Tela parcial do SOLergo para simulações das orientações e inclinações

Para verificar o impacto da variação do ângulo de inclinação, bem como da orientação dos painéis FV, o sistema foi simulado e os valores de produção de energia foram normalizados considerando como valor de referência a energia produzida pelo SFCR para a condição ideal.

A tabela II apresenta os resultados obtidos para diversas condições físicas de instalação do sistema FV. Verifica-se que a energia anual produzida pelo arranjo disposto na condição horizontal (inclinação igual a 0°), independente da orientação, tem redução de apenas 1% da situação ideal. Embora seja uma condição de instalação fácil, o acúmulo de sujeira é maior nesta inclinação, prejudicando o rendimento global do sistema. De acordo com [9-10], o acúmulo de sujeira é o terceiro principal fator ambiental que influencia os valores de geração dos sistemas FV, superado apenas pelo nível de irradiação solar e temperatura dos módulos. Estudos mostram que o acúmulo de sujeira nos módulos pode reduzir em cerca de 20% a energia mensal produzida [11-13].

Nas edificações, comumente os painéis são instalados em telhados orientados para leste ou oeste e com inclinações típicas entre 10° e 15°.

Nestas condições, conforme mostra a tabela II, a produção anual de energia elétrica apresenta redução da ordem de 2%. A produção anual de energia na orientação leste é 1,2% superior quando comparada com a orientação oeste. As tabelas II e III mostram que a pior condição de produção anual de energia ocorre quando o arranjo FV encontra-se orientado para o sul e com inclinação da ordem de 30°, acarretando perdas anuais de energia da ordem de 17,75%.

Conclusões

Conforme [14], a potência de um gerador FV depende diretamente do ângulo de inclinação e orientação. A escolha do local em que o arranjo fotovoltaico deverá ser instalado é um dos fatores determinantes para o melhor desempenho do SFCR. Em áreas urbanas, estudos mais precisos do ângulo de inclinação e orientação azimutal do painel são relevantes. Análises realizadas por meio de simulações computacionais de SFCR, considerando não somente os dados da radiação incidente no plano inclinado, permitem o cálculo do impacto da orientação do arranjo. Os resultados apresentados neste trabalho mostram que, em geral, há uma faixa relativamente ampla de inclinações e orientações azimutais do arranjo FV em que as perdas anuais não ultrapassam 2% da energia produzida por um sistema de referência, isto é, com inclinação igual à latitude e azimute 0 (orientado para o norte geográfico). Neste sentido, o custo de instalação dos microgeradores FV pode ser reduzido, haja vista não ser necessário realizar modificações no telhado de uma edificação existente, ou mesmo na instalação de suportes/ estruturas de fixação dos módulos FV, para garantir as condições ideais.

Mesmo para inclinações e orientações do arranjo FV diferentes das condições consideradas ideais, a energia anual pode apresentar os mesmos resultados ou perdas mínimas frente ao desempenho anual. Esses fatores são importantes nas análises de viabilidade econômica dos SFCR.

Referências

  1. Irena - International Renewable Energy Agency. “Renewable capacity statustucs 2016. Acedido em 20 de maio de 2016 em http://www.irena.org.
  2. Martins F. R.; Ruther, R.; Pereira, E. B.; Abreu, S.L.: Solar energy scenarios in Brazil. Part two: photovoltaics applications. Energy Policy, 2008.
  3. Aneel: BIG - Banco de Informações de Geração - Capacidade de geração do Brasil. Acedido em 29 de junho de 2016 em: http://www.aneel.gov.br.
  4. Aneel: Resolução Normativa no 482, 2012. Acedido em 1 outubro de 2014 em: http://www.aneel.gov.br.
  5. MME - Ministério de Minas e Energia. Energia solar no Brasil e mundo - Ano de referência 2014. Edição 16/12/2015. Acedido em 20 de abril de 2016 em http://www.mme.gov.br.
  6. Lalwani M.; Kothari, D.P.; Singh, M.: Investigation of solar photovoltaic simulation softwares. International Journal of Applied Engineering Research, Dindigul Vol. 1, no 3, 2010.
  7. Zilles, R.; Macêdo, W.N.; Marcos A.B., Galhardo; Oliveira, S.H.F.: Sistemas fotovoltaicos conectados à rede elétrica. São Paulo, Oficina de Textos. 2012.
  8. Rampinelli, G.A.: Estudo de características elétricas e térmicas de inversores para sistemas fotovoltaicos conectados à rede. 2010. 285 f. Tese - Programa de Pós-Graduação em Engenharia Mecânica, UFRS, Porto Alegre, 2010.
  9. Gostein, M.; Caron, J.R.; Littmann, B.: Measuring soiling losses at utility-scale PV power plants. Photovoltaic Specialist Conference (PVSC), 2014 IEEE 40th , pp.0885-0890, 8-13 June 2014.
  10. L. Dunn; B. Littmann; J.R. Caron; M. Gostein: PV module soiling measurement uncertainty analysis. 39th IEEE Photovoltaic Specialists Conference, Tampa, FL, 2013.
  11. A. Kimber; L. Mitchell; S. Nogradi; H. Wenger: The effect of soiling on large grid-connected photovoltaic systems in California and the southwest region of the United States. Conference Record of the 2006 IEEE 4th World Conference on Photovoltaic Energy Conversion, Waikoloa, HI, 2006.
  12. T.U. Townsend; P.A. Hutchinson: Soiling analysis at PVUSA. Proceedings of ASES-2000, Madison, WI, 2000.
  13. Zorrilla-Casanova, J.; M. Piliougine; J. Carretero; P. Bernaola; P. Carpena; L. Mora-López; M. Sidrach-de-Cardona: Analysis of dust losses in photovoltaic modules. Proceedings of the World Renewable Energy Congress 2011, Linköping, Sweden, 2011.
  14. Cresesb: Manual de engenharia para sistemas fotovoltaicos. Rio de Janeiro. 2014.

Trabalho apresentado no Enie 2016 - XVI Encontro Nacional de Instalações Elétricas (23 a 25 de agosto, em São Paulo, SP).