Os principais testes utilizados para a caracterização da estampabilidade das chapas metálicas são:
Fig. 1 – Parâmetros importantes para a caracterização da estampabilidade da matéria prima usada na indústria automotiva (Fonte: Schaeffer 2004).
Fig. 2 – Diagrama do ensaio de tração: tensão convencional ( σ ) x deformação relativa (ε) (Fonte: Schaeffer 2004).
A figura 1 (pág. 14) mostra esquematicamente alguns parâmetros importantes na fabricação de um produto complexo formado por inúmeros componentes.
Propriedades mecânicas
O teste mais comum e tradicional para a determinação das propriedades mecânicas é o ensaio de tração. Conforme é mostrado na figura 2, por meio do ensaio de tração de um corpo de prova em formato de chapa é possível obter as seguintes informações:
Módulo de elasticidade ou módulo de Young (E);
Conforme as normas ABNT 6152 (ou DIN EM 10002), o ensaio de tração consiste em fixar um corpo de prova nas garras de uma máquina de ensaios mecânicos, garantindo um estado uniaxial de tensão. O corpo de prova é tracionado com velocidade constante até a ruptura, registrando a força F (N) e o comprimento instantâneo l (mm).
Fig. 3 – Diagrama tensão convencional (σ) x deformação relativa (ε) para duas ligas de aços (Fonte: Schaeffer 2004).
Com o registro da medição de força (F) e do comprimento (l) proveniente da máquina de ensaio são obtidas a tensão convencional (σ) e a deformação relativa (ε) para cada instante do ensaio.
A tensão convencional (σ) é determinada por:
Onde A0 é a área da seção transversal inicial do corpo de prova.
A deformação relativa (ε) é determinada por:
Onde l é o comprimento inicial 0do corpo de prova e “l” é o comprimento instantâneo do corpo de prova.
A figura 3 mostra resultados do diagrama tensão convencional (σ) x deformação relativa (ε) para duas ligas de aço. As curvas apresentadas nesta figura mostram os parâmetros mais importantes para a conformação mecânica de chapas: tensão de escoamento (aproximadamente 300 N/mm2 para o aço DIN X5CrNi18.10 e 210 N/mm2 para o aço DC04), tensão máxima e o alongamento total no momento da força máxima.
Curva de escoamento
Nos processos de conformação mecânica a região de maior importância é delimitada pelo limite de escoamento, ou tensão de escoamento, e pelo limite de resistência, ou tensão máxima, quando observado o diagrama da tensão convencional pela deformação relativa, conforme é mostrado na figura 2 (pág. 15). Isso se deve ao fato de o limite de escoamento ter início na deformação plástica do material, ao passo que no limite de resistência ela deixa de ser generalizada e passa a se concentrar na região da estricção, e o material se aproxima da ruptura (3, 4).
Fig. 4 – Diagrama tensão x deformação com a curva convencional e a curva verdadeira (Fonte: Schaeffer 2004).
Para a análise dos processos de conformação mecânica é utilizada a curva verdadeira, como mostra a figura 4, que é obtida considerando-se a atuação da força na área instantânea durante a deformação do material.
A parte da curva verdadeira que se encontra acima do limite de escoamento recebe o nome de curva de escoamento do material, e representa a tensão de escoamento do material para diferentes valores de deformação verdadeira.
A tensão de escoamento de determinado material é influenciada pela sua microestrutura, temperatura, deformação e velocidade de deformação (3, 4) .
A tensão de escoamento (kf) que um material apresenta em razão da deformação verdadeira (j) pode ser obtida pelo ensaio de tração uniaxial, no qual, de forma semelhante ao ensaio convencional, é calculada a força (F) e medido o comprimento instantâneo do corpo de prova (l).
A tensão de escoamento (kf) em cada instante é determinada por:
Onde “A” é a área da secção transversal instantânea do corpo de prova, que é determinada pela lei da constância de volume.
A área da seção transversal instantânea do corpo de prova é determinada por:
A deformação verdadeira (j) em cada instante é determinada por:
As curvas de escoamento podem ter seu comportamento descrito por uma equação matemática. Em geral, na deformação a frio de chapas, essa equação tem a seguinte forma:
Onde “C” é o coeficiente de resistência do material (MPa ou N/mm2) e “n” é o coeficiente de encruamento do material (adimensional).
Fig. 5 – Influência do coeficiente de resistência e coeficiente de encruamento no gráfico descrito pela equação da curva de escoamento (Fonte: Garcia 2014).
O coeficiente de resistência indica o nível de resistência que o material apresenta para ser deformado plasticamente (1).
O coeficiente de encruamento indica a capacidade do material de se deformar plasticamente de maneira uniforme. Materiais com baixos coeficientes de encruamento tendem a concentrar a deformação plástica em pequenas porções do seu volume, fazendo com que baixos níveis de deformação os levem a condições críticas como, por exemplo, o surgimento de estricções e fraturas (1).
Fig. 6 – Alongamento dos grãos da chapa durante a laminação (a) e orelhamento na estampagem (b) (Fonte: Schaeffer 2004).
Fig. 7 – Determinação do índice de anisotropia (Fonte: Schaeffer 2004).
Materiais com coeficientes mais altos de encruamento são mais adequados a processos de estampagem por permitirem a obtenção de maiores deformações, devido ao maior patamar entre a tensão de escoamento e a tensão máxima. O coeficiente de resistência e o coeficiente de encruamento são características intrínsecas de cada liga metálica, porém podem ser alterados por meio de tratamentos térmicos ou termoquímicos (1).
A figura 5 (pág. 17) ilustra a influência do coeficiente de resistência e do coeficiente de encruamento sobre o gráfico descrito pela equação da curva de escoamento.
Fig. 8 – Diferentes combinações de deformações que formam a curva limite de conformação (Fonte: Shaeffer 2004).
Índice de anisotropia
Durante o processo de laminação das chapas metálicas ocorre a deformação da sua microestrutura e se originam grãos mais alongados na direção de laminação, conforme é mostrado na figura 6 (a). Essa característica provoca uma heterogeneidade nas propriedades mecânicas das chapas. Uma das consequências disso é o fenômeno de orelhamento nos processos de estampagem profunda, também ilustrado na figura 6 (b) (3, 4).
A quantificação do efeito dessa deformação diferenciada dos grãos da microestrutura durante a laminação é realizada pelo “índice de anisotropia” (r), que é definido como a razão entre as deformações principais na direção da largura (j2) e na espessura (j3),
Fig. 9 – Curva limite de conformação para três ligas diferentes (a) e zonas de falha, marginal e segura, na curva CLC (b) (Fonte: LdTM).
conforme é mostrado na figura 7.
O índice de anisotropia é determinado por:
A anisotropia apresenta valores diferentes, cuja obtenção depende de como os corpos de prova são cortados em relação à direção em que o material foi laminado. Assim, a direção de laminação pode ter um efeito importante no processo de estampagem. O índice de anisotropia (r) mostra o quanto um material é heterogêneo ou não em razão da direção de laminação (3, 4).
Curva limite de conformação
As curvas limite de conformação (CLCs) fornecem informações de como a combinação das principais deformações verdadeiras que ocorrerão no processo de fabricação poderão ou não gerar defeitos na peça final. Tais combinações de deformações, oriundas das diferentes solicitações durante a estampagem, podem ser classificadas como: estiramento biaxial, deformação plana ou embutimento profundo, conforme mostra a figura 8 (pág. 18).
Examinar a curva CLC é uma das análises importantes para garantir o sucesso do projeto e da confecção de um determinado componente. Ela mostra se a chapa a ser processada pode sofrer deformações sem que ocorram falhas, sejam elas por ruptura ou estricção localizada (3, 4).
Como é mostrado na figura 9 (pág. 18), qualquer combinação de deformações que esteja localizada acima da curva limite de conformação indica a impossibilidade de execução da estampagem.
Para a determinação da curva CLC podem ser executados diferentes ensaios, porém o mais usual e prático é o ensaio denominado “Nakajima”, em que corpos de prova de diferentes geometrias
Fig. 10 – Ferramental utilizado para a realização do ensaio Nakajima (Fonte: LdTM).
Fig. 11 – Corpos de prova para o ensaio Nakajima: a) antes do ensaio; e b) ruptura dos corpos de prova após o ensaio (Fonte: LdTM).
Fig. 12 – Projeto de um componente estampado com a curva limite de conformação (Fonte: Shaeffer 2004).
são estirados em uma ferramenta composta por matriz, prensa-chapa e um punção (3, 4), conforme é mostrado na figura 10 (pág. 20).
Devido à variação da geometria dos corpos de prova, como mostra a figura 11 (pág. 20), ocorrem diferentes estados de deformações na chapa. Tais deformações são medidas e seus valores inseridos em um diagrama j1 x j2. A curva CLC é obtida pelos pontos gerados por todos os corpos de prova. Assim, qualquer ponto dado pelas coordenadas j1 x j2 , que estiver abaixo da curva CLC, indicará condições favoráveis para a estampagem e, consequentemente, valores acima da curva indicam a ocorrência de estricção localizada (3, 4).
O conhecimento das curvas CLC de diferentes chapas auxilia o projetista, por exemplo, na escolha do material mais adequado para o projeto do componente estampado, conforme mostra a figura 12. Por meio desse tipo de verificação é possível evitar as falhas decorrentes da escolha de um material de baixa qualidade, bem como os elevados custos em razão da utilização de materiais de qualidade muito alta.
Agradecimentos
Os autores agradecem à Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), à Escola de Engenharia da UFRGS e ao Laboratório de Transformação Mecânica (LdTM) pelo uso de sua estrutura.
Referências
Mais Artigos CCM
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