Os requisitos associados ao processo de união por colagem entre metais são a sua molhabilidade peso adesivo e sua adesão sobre essa superfície. É indispensável que impurezas e camadas de adsorção presentes sobre a superfície do material, tais como as mostradas na figura 1 (pág. 17), sejam removidas por meio de pré-tratamentos adequados. No caso dos materiais metálicos pode posteriormente ocorrer a formação de camadas definidas de óxidos (1). Por exemplo, no caso do alumínio (4-9), essas camadas podem promover a formação de ligações químicas entre as superfícies dos componentes a serem unidos e os adesivos.
Portanto, para conseguir tanto a molhabilidade quanto o efeito de adesão, é necessário efetuar um pré-tratamento da superfície do metal-base. O tratamento clássico de superfícies para colagem (figura 2, pág. 17) objetiva, além da limpeza, também um aumento da área superficial por meio de raspagem (11). Ele é constituído, primeiramente, pela limpeza da superfície com solventes orgânicos
Fig. 1 – Configuração das camadas sobre a superfície metálica (2,3)
(por exemplo, acetona ou isopropanol) para remover as camadas de sujeira, gordura aderente e os filmes coloridos. A molhabilidade e adesão podem ser adicionalmente melhoradas por meio de tratamentos químicos ou mecânicos com o objetivo de remover camadas de óxidos antigas que apresentam baixa adesão. Na prática têm sido usados processos mecânicos, tais como jateamento, escovação, polimento ou lixamento (2).
Por sua vez, o tratamento por arco voltaico é mais eficiente. Conforme as condições físicas, o processo catódico efetua conjuntamente a limpeza e a microestruturação da superfície. Dessa forma, eventualmente é possível dispensar o pré-tratamento com solventes orgânicos. Sob condições normais, é possível abreviar o processamento convencional do tratamento de superfície antes da colagem, que normalmente é efetuado em três estágios, mostrados na figura 2, para apenas um, de pré-tratamento da superfície.
Efeito de limpeza catódica pelo arco voltaico
O arco voltaico é basicamente uma descarga elétrica autossustentável entre dois eletrodos dentro de uma atmosfera gasosa, a qual apresenta diferença de potencial elétrico (tensão) suficientemente alta para manter a alta densidade de corrente necessária para a ionização por impacto. Sabe-se, a partir da soldagem sob gás inerte com eletrodo de tungstênio (soldagem TIG) de ligas de alumínio, que a aplicação de arcos voltaicos catódicos sobre as peças que estão sendo soldadas efetua um forte efeito de limpeza, o qual rompe e elimina a camada de óxido sobre a superfície. Esse efeito de limpeza da superfície do eletrodo ocorre exclusivamente no catodo. A literatura propôs diferentes mecanismos associados a ela (12) . Uma nova tese descreve essa limpeza como o resultado do impacto local da vaporização e a desagregação das camadas de óxido no ponto de incidência do catodo. A densidade de corrente extremamente alta nesse ponto microscópico provoca ampla vaporização local do material do catodo. A forte vaporização forma uma alta densidade de íons metálicos carregados positivamente sobre o ponto de incidência do catodo, o qual, por sua vez, promove um forte campo elétrico necessário para a termoemissão por efeito de campo. A extensiva vaporização atua
Fig. 2 – Tratamento superficial antes da colagem (10)
simultaneamente na desagregação da sujeira, nas camadas de óxido e na eliminação de material fluido a partir do ponto de incidência do catodo (figura 3).
O ponto de incidência do catodo é muito instável do ponto de vista local e temporal. Os aspectos visíveis do arco voltaico podem decorrer de múltiplos pontos de incidência do catodo que atuam de forma simultânea. Investigações experimentais efetuadas com auxílio de imagens obtidas sob alta velocidade dão suporte a essa hipótese (12) . Até o momento não há comprovações experimentais adicionais dessa hipótese na literatura. Essas novas teses descrevem o mecanismo de limpeza pela vaporização/desagregação de camadas de óxidos no ponto do catodo. Este trabalho tem como objetivo tentar esclarecer esta questão.
Vantagens do processo com arco-voltaico
O pré-tratamento da superfície por meio do arco voltaico é vantajoso
Fig. 3 – Efeito de limpeza catódica (12)
também para empresas de pequeno e médio porte, particularmente quando elas puderem fazer uso de equipamentos de soldagem TIG já existentes para efetuar a limpeza catódica. Equipamentos convencionais para soldagem TIG podem ser adaptados a baixo custo para efetuar o tratamento superficial com arco voltaico. Uma tocha TIG simples (com configuração axial e usando eletrodo robusto de tungstênio com 4 a 5 mm de diâmetro) é a mais adequada para esse fim. A tradicional configuração de pinça de pressão para suporte do eletrodo em bastão permite o livre ajuste da distância até a peça. Bocais para gás de proteção feitos com material cerâmico, nos mais diversos formatos e dimensões, já se encontram disponíveis no mer- cado, permitindo sua adaptação à geometria da peça específica sob processamento.
Uma vantagem adicional da limpeza superficial de cobre com arco voltaico é a economia de tempo conseguida pela supressão de etapas de processo – como, por exemplo, a raspagem mecânica da superfície a ser colada. No caso específico do pré-tratamento para a colagem, a limpeza de gordura com solvente ou com um agente limpante aquoso não é necessária nem antes, nem depois da limpeza superficial com arco voltaico. Esse método é adequado para a limpeza tanto de chapas (figura 4, quadrante superior esquerdo), como de tubos de cobre (figura 4, quadrante superior direito). A limpeza das superfícies internas de tubos com pequenos diâmetros pode ser feita usando-se eletrodos de tungstênio com maior extensão (figura 4, parte inferior), os quais são introduzidos no tubo e
Fig. 4 – Acima, à esquerda: limpeza catódica de chapas de cobre. Acima, à direita: tubos de cobre. Abaixo: Parede interna de tubo de cobre.
envolvidos por gás de proteção. O intenso efeito de limpeza, bem como o baixo nível de agressão ao meio ambiente desse processo em comparação com o uso de solventes e as emissões de ruído e fumos associados aos métodos convencionais, sinalizam que o novo processo pode ser aplicado de forma vantajosa (13) .
Investigações laboratoriais com chapas de cobre
A seguir serão descritos alguns ensaios laboratoriais envolvendo superfícies de cobre, com o objetivo de analisar o tratamento superficial antes da colagem para assegurar a confecção de uma junta adesiva segura e com longa durabilidade. A
tabela 1 reproduz os parâmetros dos ensaios de limpeza catódica aplicados durante o pré-ratamento da superfície para a colagem.
Além do cobre, não há nenhum outro metal importante dentro da série eletroquímica que seja mais nobre que o hidrogênio. As ligas de cobre possuem a capacidade de formar camadas de cobertura estáveis, que as protege do ataque corrosivo e, obviamente, lhes concede boa resistência à corrosão. Essas camadas compactas, com seu efeito protetor, quando formadas sob a atmosfera comum, são constituídas de óxidos e sais básicos com baixa solubilidade(4). Na superfície do cobre polido exposta a ar seco puro forma-se uma camada de óxido de cobre (I), a qual geralmente é fina e invisível (15-17).
A figura 5 (pág. 20) mostra duas micrografias obtidas por meio de microscopia eletrônica de varredura, relativa a uma amostra não tratada e a outra que foi submetida à limpeza catódica. O material que não foi tratado apresenta uma grande quantidade de par tículas. Contudo, a análise no microscópio eletrônico de varredura não conseguiu identificar com precisão o tipo de partícula envolvido, particularmente porque elas eram cons tituídas por compostos orgânicos. Por outro lado, é claramente visível na micrografia à direita na figura 5 a estruturação superficial decorrente do processamento por laminação. O depósito de partículas presente na amostra (figura 5, à esquerda) foi totalmente eliminado por essa limpeza.
Para determinar os grupos químicos presentes na superfície do metal frequentemente se recorre à espectroscopia de fotoelétrons excitados raios-X. Essa análise determina a composição química da superfície de corpos de prova até uma profundidade de aproximadamente 5 nm. A chapa de cobre, após ter sido submetida ao tratamento por arco voltaico, foi
Fig. 5 – Micrografias obtidas por microscopia eletrônica de varredura. À esquerda:superfície de uma chapa de cobre não preparada (tensão de 15 kV). À direita: superfície de uma chapa de cobre após tratamento com arco voltaico (tensão de 20 kV).
Fig. 6 – Representação esquemática da chapa de cobre mostrando os pontos de análise por espectrometria fotoeletrônica de raios-X: 1) superfície; 2) na profundidade de 3 nm.
analisada por meio desse procedimento. O objetivo foi avaliar a influência da passagem do arco voltaico sobre a composição química da superfície, ou seja, a efetividade da limpeza. O equipamento de análise empregado, modelo PHI 5600 CI (fabricado pela Physical Electronics)estava dotado com um analisador de energia hemisférico. Os raios-X emitidos eram cons tituídos por radiação monocromática Al-Kα (350 W); a superfície analisada tinha aproximadamente 8 0 0 micra de diâmetro. Foi executada a deposição de íons sobre a superfície da amostra para eliminar a camada de contaminantes existente sobre ela. Trata-se de um processo no qual os átomos presentes sobre um corpo rígido são eliminados pelobombardeamento de íons com alta energia. A deposição foi feita com um jato de íons de Ar+ (3,5 keV, varredura de 2 mm x 2 mm) sob uma taxa de erosão de 0,7 nm/min - ou seja, consegue-se uma profundidade de aproximadamente 3 nm após um tempo de deposição de 4,5 min (figura 6, pág. 20).
A figura 7 apresenta as concentrações de elementos sobre uma chapa de cobre imediatamente após o seu tratamento por arco voltaico, determinadas pela análise por espectroscopia de fotoelétrons excitados por raios-X. Uma das análises foi feita sobre superfície lisa, resultante do uso de arco voltaico sem fusão. A segunda análise foi feita sobre um ponto fundido da chapa de cobre, ou seja, um ponto gerado por arco voltaico sobre a superfície. Os resultados das análises mostraram que as superfícies das amostras de cobre ainda apresentavam muito carbono, um sinal que comprovou a presença de impurezas orgânicas.
Fig. 7 – Concentrações de elementos próximos à superfície na região da amostra de cobre sem deposição de íons.
O teor de carbono foi inversamente proporcional ao de oxigênio (e também ao teor de cobre). Quando se considerou a camada de óxido presente sobre a superfície da amostra – ou seja, os teores de oxigênio e cobre, sem carbono – foi constatado que as amostras apresentaram uma camada de óxido mais fina após a deposição de íons do que antes desse processo (figura 8, pág. 22).
Quanto mais alto foi o teor de carbono ainda mensurável após a deposição de íons, mais espessa era a camada de impurezas. A princípio, pode-se constatar que quase não se consegue mais detectar as camadas de contaminação da superfície após o tratamento por arco voltaico (figura 9, pág. 22). Isso decorreu da forte queda ocorrida no sinal relativo ao carbono após a deposição de íons. Também foi observada a formação imediata e inevitável de uma nova camada de óxido sobre a superfície recém-tratada exposta à atmosfera. Por esse motivo é recomendável proceder rapidamente à colagem após ter sido efetuada a limpeza da superfície.
A figura 10 (pág. 24) mostra duas chapas de cobre sem e com tratamento com isopropanol antes da limpeza catódica. No lado esquerdo dessa figura encontra-se a chapa tratada apenas com o arco voltaico. Aqui não foi feito o pré-tratamento superficial com o solvente. No lado direito está a chapa de cobre que foi primeiramente limpa com isopropanol e, em seguida, submetida ao tratamento com arco voltaico. Pode-se constatar que a superfície mostrada no lado esquerdo (limpeza catódica sem isopropanol) mostrou-se uniforme, enquanto a superfície apresentada no lado direito (limpeza catódica com pré-tratamento de isopropanol) apresentou a ocorrência de oxidação e fusão (figura 11, pág. 24). A aplicação do arco voltaico catódico sobre uma superfície pré-limpa da chapa tende a estabelecer um arco local estável e mais intenso, levando a um maior aporte de energia e à fusão da superfície. O maior aquecimento da amostra leva a um crescimento mais rápido da camada de óxido recém-formada, a qual, conforme as circunstâncias, pode exercer efeitos negativos sobre a adesão da cola. No momento ainda não há uma explicação clara sobre essa ocorrência. Ou seja, é um comportamento que ainda precisa ser esclarecido.
Os resultados desses estudos foram confirmados por meio de ensaios mecânicos feitos utilizando-se dois tipos de adesivos à base de epóxi com cura a frio, provenientes de diferentes fornecedores. Uma parte dos corpos de prova foi pré-tratada com isopropanol como solvente, en-
Fig. 8 – Comparação entre os teores de cobre e oxigênio sobre a superfície. À esquerda: sem deposição de íons; à direita: após a deposição de íons.
quanto a outra não sofreu qualquer pré-tratamento. No caso dos corpos de prova em que se usou o segundo adesivo somente foi feita a limpeza com isopropanol. O resultado está mostrado na figura 12 (pág. 25), na qual se pode observar claramente o menor nível de resistência mecânica apresentado pelos corpos de prova que foram desengraxados só com o solvente. Os corpos de prova processados com isopropanol e arco voltaico, bem como aqueles que só foram processados com o arco voltaico, apresentaram resultados muito similares ao serem submetidos aos ensaios de tração. Em ambos os casos, o limite de resistência obtido foi
Fig.9 – Concentrações de elementos próximos à superfície na região da amostra de cobre após a deposição de íons
consideravelmente superior ao alcançado pelos corpos de prova nos quais ocorreu a preparação manual da superfície a ser colada – por exemplo, por meio de desengraxamento com solvente orgânico (isopropanol). Tais resultados permitem concluir que a pré-limpeza com isopropanol antes do tratamento por arco voltaico é uma etapa de trabalho que deve ser eliminada, ao menos quando o grau de sujeira presente nas peças não for muito alto.
Conclusões
Uma nova tese sobre a limpeza por meio de vaporização e desagregação locais e instantâneas das camadas de óxido no ponto de incidência do arco voltaico catódico (2) esclareceu plenamente os resultados obtidos. A incidência do catodo em um ponto localizado gera uma impressão microscópica sobre a superfície fundida, aparentemente causada por uma intensa vaporização de material. Dessa forma, a superfície é submetida a uma raspagem microscópica. A emissão de elétrons a partir da superfície da peça sob limpeza leva à vaporização e à desagregação das camadas de óxido e, simultaneamente, à remoção da sujeira presente. Além disso, a microfusão au-
Fig. 10 – Efeito de limpeza catódica, sem (à esquerda) e com (à direita) pré-limpeza usando isopropanol.
menta a rugosidade da superfície metálica (neste caso, da chapa de cobre), promovendo uma melhor união por adesivo.
O pré-tratamento superficial para a colagem por meio de arco voltaico representa uma abordagem nova e não convencional para o processo de colagem. Os objetivos dos processos clássicos, que efetuam de forma separada a preparação (desengraxamento) e o pré-tratamento (remoção de óxidos/estruturação da superfície), são unificados pelo efeito de limpeza do arco voltaico. Por outro lado, a adoção de um procedimento adicional de desengraxamento da superfície aumentará de forma apenas insignificante a resistência da união por adesivos.
Simultaneamente, o fato de esse processo dispensar contato físico lhe garante alta flexibilidade. As superfícies, acessíveis tanto de forma interna quanto externa, precisam apenas ser raspadas pelo arco voltaico. Além disso, há a vantagem decorrente do fato de
Fig. 11 – Micrografias obtidas por meio de microscopia eletrônica de varredura (tensão de 20 kV): a) superfície lisa de chapa de cobre após tratamento com arco voltaico (aumento de 500 vezes); b) ponto de incidência do arco voltaico (fusão) da superfície da chapa de cobre (aumento de 500 vezes).
Fig. 12 – Resultados dos ensaios de tração de uniões adesivas. Chapas sem e com preparação usando isopropanol e limpas com arco voltaico; dimensões dos componentes unidos: comprimento, 105 mm; largura, 45 mm; comprimento da sobreposição, 9 mm.
que as regiões que eventualmente não foram limpas podem ser claramente percebidas e tratadas novamente com facilidade. A manipulação simples e rápida do tratamento a arco voltaico pode simultaneamente aumentar a confiabilidade do processo e reduzir o tempo necessário para executar a preparação necessária aos processos de colagem.
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