Por Taylan Altan e equipe do Center for Precision Forming (CPF)*

 

Publicado em Corte e Conformação de Metais, edição de setembro de 2010.

 

 

Os fabricantes de componentes originais, em sua busca pela redução de peso nos projetos de carrocerias automotivas, usam materiais leves convencionais, tais como alumínio, magnésio e polímeros. Contudo, o uso de aços com resistência mecânica ultra-alta também está aumentando.

 

Métodos convencionais de estampagem a frio e o processamento de aço microligado ao boro (22MnB5) podem ser executados por um processo não-isotérmico para conformação de chapas metálicas denominado estampagem a quente, que combina conformação a quente e o subsequente endurecimento por têmpera em uma única etapa.

 

 

Artigo técnico traz uma revisão sobre estampagem a quente de aços, em sua segunda parte de uma série de três.

Fig. 1 – Alterações no limite de resistência e na microestrutura durante a estampagem a quente.

 

 

A estampagem a quente é compatível com a composição química dos aços ligados ao boro, uma vez que ela cria uma robusta janela de processo para a têmpera, a qual promove a transformação martensítica (1, 2). Os aços ao boro pertencem a um grupo de aços martensíticos com boa temperabilidade sob baixas taxas de resfriamento.

 

O material-base, 22MnB5, possui microestrutura ferrítico-martensítica com limite de resistência de aproximadamente 600 MPa. Após a peça ser estampada a quente, ela apresenta microestrutura martensítica e resistência mecânica elevada, a qual atinge até 250% de seu valor inicial (2).

 

Essa tecnologia tem um potencial considerável para a minimização do peso dos componentes, por meio da redução da espessura da chapa e do número de componentes que se fazem necessários. A tecnologia de estampagem a quente pode ser usada para reforços em colunas “A” e “B”, trilhos para tetos, membros de paredes laterais e barras para estruturas de proteção contra colisões (3).

 

Em comparação com as peças conformadas a frio, as estampadas a quente apresentam melhor conformabilidade sob altas temperaturas e ausência de efeito mola (springback) na peça final.

 

 

 Estampagem a quente de aço ao boro é assunto da segunda parte de artigo técnico

Fig. 2 – Durante o aquecimento o revestimento protetivo é transformado em uma camada de liga ferro-alumínio-silício, que é altamente aderente ao substrato e apresenta boas propriedades de resistência à corrosão.

 

 

 

Fundamentos metalúrgicos

 

A metalurgia da estampagem a quente se inicia com a austenitização de blanques ou pré-formas de chapas em um forno alimentado continuamente, um processo que dura cerca de 5 a 10 minutos sob temperaturas entre 900 °C e 950 °C.

 

Esse procedimento cria uma microestrutura austenítica homogênea. Em seguida, os blanques são rapidamente transferidos para uma matriz de estampagem refrigerada, como uso de um sistema automático de alimentação. Essa transferência geralmente leva menos de três segundos.

 

Sob altas temperaturas, entre 650 °C e 850 °C, o material apresenta excelente conformabilidade e pode ser estampado em formatos complexos em um único golpe. A têmpera ocorre simultaneamente ou imediatamente após a conformação. Durante a têmpera, a microestrutura austenítica se transforma em martensítica devido ao rápido resfriamento (taxas entre 50 °C/s e 100 °C/s).

 

Como resultado dessa alteração microestrutural, é possível fabricar componentes com limites de resistência superiores a 1.500 MPa (1-5). O efeito mola é minimizado, uma vez que a peça permanece na matriz durante o estágio de resfriamento. A figura 1 mostra um esquema da sequência do processo de estampagem a quente.

 

 

 

Revestimentos para aços ligados ao boro

 

Caso o blanque não seja revestido, seu aquecimento precisa ser feito sob atmosfera protetiva para evitar oxidação (formação de carepa) e descarbonetação superficiais. Ainda assim, quando o aço ao boro não-revestido é transferido do forno para a prensa, forma-se uma camada de óxido de ferro irregular e abrasiva sobre a superfície do blanque.

 

A oxidação ocorre devido a esse contato direto com o oxigênio atmosférico. Nesse caso é impossível evitar alguma descarbonetação superficial (até 60 mícrons), o que é prejudicial para as propriedades finais da peça (1).

 

Uma vez que a carepa é caracterizada por extrema dureza, o movimento entre a matriz e o blanque de aço com resistência mecânica ultra-alta durante a estampagem a quente pode resultar em severo desgaste da matriz. Além disso, posteriormente essas peças precisam passar pelo jateamento com granalha ou areia para remover a camada de carepa.

 

O jateamento com granalha é caro e pode ser prejudicial às tolerâncias geométricas das peças finas. Essa oxidação durante a estampagem a quente pode ser evitada com o uso de um revestimento superficial à base de alumínio-silício. Por exemplo, o Usibor 1500P, um aço-liga com grão fino desenvolvido pela ArcelorMittal, possui microestrutura ferríticoperlítica homogeneamente distribuída.

 

Esse aço ao boro pré-revestido possui uma camada à base de alumínio-silício com espessura entre 23 e 32 mícrons (1, 2). Durante o aquecimento, esse revestimento protetivo é transformado em uma camada de liga de ferro-alumínio-silício que é altamente aderente ao substrato e apresenta boas propriedades de resistência à corrosão (figura 2).

 

As peças de Usibor 1500P estampadas a quente estão prontas para serem pintadas, sem a necessidade de jateamento de granalha, pois não apresentam óxido superficial. Elas apresentam excelentes tolerâncias geo­métricas e não mostram qualquer descarbonetação devido ao efeito protetor do revestimento no forno (1).

 

O material proporciona vantagens técnicas e econômicas para o desenvolvimento de produtos estampados a quente. O aço Usibor 1500P é usado na fabricação de colunas e soleiras para modelos como o Passat, da Volkswagen, e o Classe S, da Mercedes-Benz, assim como de colunas “A” para veículos da Land Rover e de barras de pára-choques no Ford Mustang (1). O aço 22MnB5 ligado ao boro pré-revestido para estampagem a quente tem sido usado de forma crescente nos novos modelos de carros europeus e norte-americanos.

 

Este artigo é a segunda parte de uma série de três publicações que versam sobre a estampagem a quente de aços ao boro. A primeira parte tratou dos métodos e usos desse processo. A terceira parte abordará a aplicação da simulação por elementos finitos ao processo de estampagem a quente.

 

 

Referências

 

1)  Hein, P.; Keffer Stein, R.; Dahan, Y.: Hot Stamping of USIBOR 1500P: Part and Process Analysis Based on Numerical Simulation. In: International Conference “New Development in Sheet Metal Forming Technology”. Proceedings. Stuttgart, 2006, p. 163-175.

 

2) Merklein, M.; Lechner, J.; Geiger, M.: Characterisation of the Flow Properties of the Quenchenable Ultra High Strength Steel 22MnB5. In: Annals of the CIRP, v. 55. Kobe (Japão), 2006.

 

3) Kolleck, R. et al.: Hot Forming and Cold Forming – Two Complementary Processes for Lightweight Auto Bodies. In: International Conference “New Development in Sheet Metal Forming Technology”. Proceedings. Stuttgart, 2004, p. 235-244.

 

4) Engels, H.; Schalmin, O.; Müller Bollenhagen, C.: Controlling and Monitoring of the Hot-Stamping Process of Boron-Alloyed HeatTreated Steels. In: International Conference “New Development in Sheet Metal Forming Technology”. Proceedings. Stuttgart, 2006, p. 135-150.

 

5) Neugebauer, R.; Altan, T.; Geiger, M.; Kleiner, M.; Sterzing, A.: Sheet Metal Forming at Elevated Temperatures. In: Annals of the CIRP, v. 55. Kobe (Japão), 2006.

 

 

*Este estudo foi preparado pela equipe do Centro para Conformação de Precisão (Center for Precision Forming, CPF), anteriormente denominado Centro de Pesquisa em Engenharia para Manufatura Próxima do Formato Final (Engineering Research Center for Net Shape Manufacturing, ERC/NSM), associado à Ohio State University (Columbus, Estados Unidos). Taylan Altan (www.ercnsm.org) é professor e diretor do instituto. Este artigo foi publicado originalmente na seção “R&D Updates” do periódico norte-americano Stamping Journal e na edição de setembro de 2010 da revista Corte e Conformação de Metais. Tradução e adaptação de Antonio Augusto Gorni. Reprodução autorizada.

 



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