Software prevê falhas em matrizes para fundição sob pressão


Este artigo descreve o aperfeiçoamento de um módulo do software Flow-3D, capaz de prever danificações em matrizes de fundição sob pressão, em especial trincas de fadiga térmica e erosões. Para comprovar a sua eficácia, foram comparadas matrizes de validação e seriadas.


Ruben Heid, Helge Pries e Klaus Dilger são do Instituto para Técnica de União e Soldagem da Universidade Técnica de Braunschweig; Christopher Thoma e Harald Eibisch são da AUDI AG; todos da Alemanha. O artigo Optimierung von Druckgiesswerkzeugen – Softwaremodul zur Vorhersage von Schädigungen in Dauerformen für Aluminiumdruckgiessen – Hybrid-Fatigue-Test foi originalmente publicado na revista alemã Giesserei no 6, de 2014, págs. 32-41. Reprodução autorizada pelo e ditor. Tradução de Themistocles Rodrigues Júnior.

Data: 30/06/2017

Edição: FS Maio 2017 - Ano - 27 No 293

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Fig. 1 - A) Lado da alimentação do componente de validação; b) Detalhe da evolução da transição do fluxo para a cavidade do componente e integral temporal do fluxo do banho durante o enchimento da matriz (Gráfico: Audi AG)

O processo de de fundição sob pressão para a fabricação de componentes estruturais com paredes finas requer um processo de injeção com ligas das classes AlSi10MnMg ou AlSi9Mn, a velocidades maiores do que 40 m/s na região da peça adjacente ao canal de ataque.
A integração de funções cada vez maior nos fundidos resulta, por conseguinte, no aumento das suas dimensões. É o caso da peça de ligação entre a soleira e a longarina, que chega a ter 1.510 mm de comprimento.
Para a fabricação destes componentes, é necessário utilizar matrizes de fundição sob maiores, que requerem forças de fechamento mais altas.
A escolha de ligas com baixos teores de ferro (< 0,15 %, porcentagem em peso), e velocidades relativamente altas na região da peça adjacente ao canal de ataque exercem um efeito negativo sobre a vida útil da matriz.
Na fundição de peças estruturais, podem ocorrer trincas de fadiga térmica na matriz nas regiões planas do componente e nas áreas de junção, assim como erosões na região próxima ao canal de ataque, em virtude das altas velocidades locais.
Estes tipos de desgaste exercem um efeito negativo sobre a qualidade do fundido, pois eles provocam uma impressão negativa em sua superfície.
Os fenômenos de desgaste da matriz, que causam elevações na superfície da peça, são especialmente críticas nas zonas de junção, também chamadas de superfícies funcionais, nas quais o componente estrutural é unido com outros por meio de uma junta soldada, uma linha de colagem ou rebitamento.
Para reduzir a rejeição dos fundidos, minimizar o retrabalho manual e economizar os custos dispendidos no reparo da matriz, é necessário aumentar a sua vida útil, evitando eventuais danificações.
Neste caso, insertos parciais em áreas altamente solicitadas, que podem ser substituídos a partir de um determinado grau de desgaste, podem ser uma solução econômica.
O reparo da matriz e o retrabalho manual nos componentes fundidos se torna necessário a partir de uma rugosidade superficial (sPz25) de 300 mm.
Este parâmetro está relacionado à área, sendo determinado a partir de um campo de medição que consiste em 5 x 5 áreas de medição individuais.
A evolução das danificações do material da matriz (F) mostra que as soldagens de reparo influenciam diferentemente os tempos de vida útil, até ser alcançado o mesmo nível de danificação de sPz25 = 300 mm.

Previsão de danificações da matriz via simulação

O entendimento das danificações em forma de trincas de fadiga térmica e erosões, que são formadas durante o tempo de vida da matriz, é importante para limitar as imponderabilidades no cálculo do preço dos componentes.

Fig. 2 – A) Vista de corte do componente de validação (superfície de corte lilás); b) detalhe da evolução da transição do fluxo para a cavidade do componente, e integral temporal da taxa de cisalhamento (Gráfico: Audi AG)

É necessário identificar e considerar eventuais danificações com antecedência, o que pode ser feito por meio do leiaute da ferramenta, via simulação.
Nas ferramentas de simulação típicas para a fundição sob pressão, já existem princípios para avaliar as danificações da matriz. Porém, eles são limitados às danificações induzidas por tensões, a exemplo de trincas de tensão ou redes de trincas de fadiga térmica.
Até então, a descrição da erosão via simulação não era possível, o que levou à necessidade de aperfeiçoar os sistemas de simulação existentes, para a previsão destas danificações típicas da fundição de peças estruturais.
Nesse sentido, a Audi AG e a Flow Science Deutschland GmbH, ambas da Alemanha, desenvolveram em conjunto um módulo para o software Flow-3D.
Trata-se do denominado HFT (hybridfatigue-test ou teste híbrido de fadiga), que permite a previsão de áreas sujeitas a erosões e trincas de fadiga térmica.
O seu procedimento básico consiste na identificação de relações físicas simples durante o enchimento da matriz e na correlação subsequente com a superfície submetida às danificações.
Na maioria das vezes, as trincas de fadiga térmica e erosões podem ser explicadas pelos fenômenos que ocorrem durante o enchimento da matriz, ao contrário das trincas de tensão.
Para garantir cálculos rápidos e a geração de um modelo simples de simulação, as características mecânicas do material da matriz e a descrição por meio de modelos mecânicos não são utilizadas.
No modelo em questão, o quadro de danificação das trincas de fadiga térmica é baseado no coeficiente de transmissão de calor local, o qual é fortemente aumentado em comparação com o valor padrão de 8.000 W/m-2 K-1.
Este aumento pode ser baseado na perda da camada protetora do agente de separação durante o enchimento da matriz, assim como na introdução de energia local variável na superfície da matriz, por meio do fluxo do banho fundido (figura 1).
A superfície da matriz é fortemente aquecida localmente e submetida às tensões que são claramente maiores, induzidas pela temperatura durante o enchimento e pela aplicação do agente de resfriamento e separação.
Na simulação da fundição, normalmente é utilizado um coeficiente de transmissão de calor que independente dos fenômenos de fluxo.
No modelo apresentado, o quadro de danificações da erosão é baseado na alta vazão do banho, que é direcionado no sentido da superfície da matriz. Desta forma, são originadas tensões e taxas de cisalhamento elevadas nessa região (figura 2).
A camada protetora do agente de separação é removida pela corrente do banho fundido, que por sua vez pode interagir de forma erosiva com o material da matriz, do mesmo modo que a corrosão pelo metal líquido.
Em determinadas regiões da matriz, também ocorre a sobreposição dos mecanismos de danificação. Muitas vezes ocorre uma solicitação acentuada em uma determinada região da peça fundida, a qual é adjacente ao canal de ataque.
Assim, é originado um quadro de danificação em que a rede de trincas de fadiga térmica é sobreposta pela erosão.
No entanto, na área de erosão não pode ocorrer a formação de uma rede de trincas de fadiga térmica, pois as trincas superficiais finas são removidas pela ação corrosiva do banho.
Ao lado das áreas danificadas pela erosão, pode ocorrer ainda a formação desimpedida de uma rede de trincas de fadiga térmica.

Parâmetros de saída implementados na simulação

Fig. 3 - Componentes de validação com propriedades estruturais típicas. Perfil U as placas dispostas lateralmente e espessura parede de 3 mm. Também estão representados os dois lados dos extratores da meia matriz e o lado da alimentação, com as furações para resfriamento. (Gráfico: Audi AG)

Para reproduzir os potenciais de danificação relativos à formação de erosões e trincas de fadiga térmica na simulação, é necessário simular o enchimento da matriz.
A estratégia de interligação do Flow-3D, em combinação com a representação de superfícies livres na simulação, possibilita uma reprodução detalhada e realística do campo de velocidade e da pressão do banho fundido durante o enchimento da matriz.
A partir das grandezas físicas estabelecidas, a exemplo da temperatura do banho, é possível deduzir e implementar os parâmetros de saída adicionais.
No software Flow-3D versão 10.1, o comprimento do fluxo (St) no canal de talimentação não pode ser igual a zero.
Quando também se considera a câmara de injeção no modelo de simulação, como no caso em questão, o comprimento do fluxo é indicado a partir do ponto inicial do cálculo.
Com a adaptação do software, é possível reajustar o comprimento do fluxo do banho fundido para o valor zero em um ponto arbitrário, como no canal de ataque, por meio da utilização de defletores.
A vazão do banho fundido (Sν) é definida como parâmetro do fluxo volumétrico. Trata-se de um parâmetro de saída, que pode ser entendido como o fluxo local da quantidade de banho durante o enchimento total do componente. Ele é descrito de forma simplificada pela equação 3.
Os processos de cálculo estabelecidos no software são mais complexos, pois é necessário considerar apenas as células de rede submetidas ao fluxo parcial do banho. A equação 3 não considera este fato.

A tensão de cisalhamento (Sτ), determinada para a transição do banho fundido para a superfície da cavidade da matriz, descreve a alteração da velocidade do fluxo (Δu) do banho, em função da distância (Δy) da superfície da cavidade da matriz.
A tensão de cisalhamento é influenciada pela viscosidade dinâmica (μ) do metal. Esta correlação pode ser descrita com base na equação 4.
Os processos de cálculo estabelecidos no software Flow-3D são mais complexos, pois é necessário considerar a resolução da malha e das células de rede submetidas ao fluxo parcial do banho.

A viscosidade dinâmica normalmente é calculada automaticamente no software.

Para a rugosidade superficial, a qual pode influenciar significativamente a tensão de cisalhamento, foi escolhido um modelo simplificado de uma superfície lisa.
Como fator de ponderação, é possível utilizar uma combinação da vazão do banho e da tensão de cisalhamento, com o comprimento do fluxo.
Neste caso, essas duas grandezas são combinadas em uma dependência inversa (ver equações 5 e 6).
Dessa maneira, é possível considerar uma danificação mais acentuada nas regiões da peça fundida adjacentes ao canal de ataque, com curtos comprimentos do fluxo, por exemplo, por meio da temperatura mais alta do metal, que não precisa ser calculada na simulação do enchimento.
O potencial para trincas de fadiga térmica, como vazão do banho fundido, é dado por:

Já o potencial para erosões, como tensão de cisalhamento, ponderada é definido por:

Confrontação real com um componente de validação

A implementação de soluções em software para a descrição de potenciais danificações em matrizes de fundição sob pressão requer uma confrontação real, que acompanha o avanço da simulação, além de contribuir para um refinamento e adaptação da validade da simulação.

Fig. 5 - Parâmetro avaliado (Sτg), resultado da simulação para o potencial de erosão e estado real da superfície. As imagens foram feitas com o auxílio de um interferômetro de luz branca após aproximadamente 60 mil injeções. (Gráfico: Audi AG)

Fig. 4 - Componente de validação com danificação após 70 mil injeções. Vistas do lado do extrator (a) e do enchimento (b). (Gráfico: TU Braunschweig)

Um quadro típico de erosão pode ser originado após alguns milhares de ciclos de injeção. As trincas de fadiga térmica são formadas dentro do intervalo de 10 mil a 20 mil ciclos.
Para uma confrontação real dos parâmetros de saída da simulação, foi escolhido um componente de validação típico para a fundição de componentes estruturais.
Trata-se de um perfil U e duas placas dispostas lateralmente (figura3). Os componentes têm espessura de parede da ordem de 3 mm, sendo produzidos nas ligas AlSi9Mn e AlSi10MnMg.
Para o componente de validação, existe uma documentação completa das danificações ocorridas até a injeção de aproximadamente 70 mil peças.
A erosão na região da peça adjacente ao canal de ataque do perfil U, assim como a rede de trincas de fadiga térmica nele e nas placas laterais, foram consideradas.
Os parâmetros de processo mais importantes estão reunidos na tabela.
A figura 4 mostra uma representação esquemática de todas as danificações reconhecíveis após 70 mil ciclos.
As danificações de cavitação e erosão são reconhecíveis do lado do extrator do componente, enquanto as trincas de fadiga térmica se encontram principalmente no lado do enchimento.
Nos raios estreitos das cavidades de transbordamento e no canal de distribuição, é possível reconhecer trincas de tensão.
No primeiro passo da simulação, o enchimento do componente é calculado.

Fig. 6 - Parâmetro avaliado (Svg), resultado da simulação para o potencial de formação de trincas de fadiga térmica e estado real da superfície. As imagens foram feitas com o auxílio de um interferômetro de luz branca, após aproximadamente 70 mil injeções. (Gráfico: Audi AG)

Os valores ajustados para os parâmetros de injeção eram idênticos aos do processo real.
Além dos parâmetros padrão de saída implementados, como a velocidade, ar arrastado e defeitos superficiais que descrevem inclusões de ar e a formação de cascas de óxido, também foram avaliados os novos parâmetros.
As simulações realizadas apresentaram boa significância para os potenciais de danificação de erosão e trincas de fadiga térmica.
A figura 5 ilustra o potencial de danificação simulado para as erosões e as danificações reais existentes no componente.
A topografia superficial do componente na região das danificações foi registrada com a ajuda de um interferômetro de luz branca.
Duas regiões da peça adjacentes ao canal de ataque foram observadas em particular: a região que apresenta um alto potencial para erosões e a outra, com baixo potencial para o mesmo defeito.
A topografia superficial registrada no componente real mostra uma boa concordância com a danificação identificada na simulação.
Na figura 5, a flecha do lado esquerdo da simulação retrata o efeito da interligação em rede, sobre a representação dos parâmetros de saída.
Os resultados de cálculo registrados não mostraram qualquer alteração brusca dos valores.
O software Flow-3D utiliza o método de interligação Favor, contrário à interligação convencional do método das diferenças finitas (FDM) e dos volumes finitos (FVM) com elementos hexaédricos.
Assim, é possível obter um retrato da superfície de forma livre próximo do contorno, com um pequeno número de células de rede.
Porém, a resolução da malha utilizada (1 mm) com a espessura de parede do componente de 3 mm ainda não era suficiente para compensar todas as omissões de células. Este fenômeno pode ser evitado com a escolha de uma resolução de malha mais fina, mas os tempos de cálculo aumentam significativamente.
A figura 6 apresenta o potencial de danificação para as trincas de fadiga térmica determinado na simulação, e as danificações reais no componente.
A topografia superficial do fundido na região das danificações também foi registrada com um interferômetro de luz branca.
Na região das placas do lado esquerdo e direito do perfil U, é possível reconhecer um alto potencial de danificação para as trincas de fadiga térmica na simulação, nas regiões adjacentes aos canais de ataque. Este alto potencial é fortemente reduzido no sentido da cavidade de transbordamento, aumentando nela própria.

Fig. 7 - Parâmetro avaliado (Sτg), para a parte superior do cárter de óleo. Resultado da simulação para o potencial de erosões, o que reduziria a resistência do componente. (Gráfico: Audi AG)

A avaliação da topografia da superfície do componente real também revelou uma boa concordância com os resultados simulados para o potencial de trincas de fadiga térmica.
Na região do fundido adjacente ao canal de ataque, é possível reconhecer uma rede de trincas de fadiga térmica bastante acentuada. Ela desaparece completamente na região seguinte do componente, mas volta a se manifestar de forma fraca na área da cavidade de transbordamento.
Ao avaliar a simulação do perfil U, também é possível reconhecer diferenças distintas na manifestação dos potenciais de danificação.
Na região do canto, após o primeiro desvio a partir do canal de alimentação, há um forte potencial de trincas de fadiga térmica.
Por outro lado, é possível observar um potencial de danificação especialmente fraco na região central do componente, um pouco antes do segundo desvio.
Também neste caso, a avaliação da topografia superficial com o auxílio do interferômetro de luz branca mostra uma boa concordância com os resultados simulados.
Na região do canto, depois do primeiro desvio, é possível reconhecer claramente uma rede de trincas de fadiga térmica local limitada, não sendo observadas trincas de fadiga térmica na região central do componente, um pouco antes do segundo desvio.

Confrontação real com o componente seriado

Fig. 8 - Parâmetro avaliado (Svg), para a parte superior do cárter de óleo. Resultado da simulação para o potencial de formação de trincas de fadiga térmica e para as condições reais da superfície. (Gráfico: Audi AG)

Para comprovar a significância real do módulo HFT também para os componentes seriados, foi realizada outra comparação, no caso da parte superior de um cárter de óleo.
A figura 7 apresenta o componente com o potencial para erosões determinado via simulação.
O perigo de uma erosão durante o tempo de vida da matriz pode ser avaliado como pequeno. Isso é indicado pela coloração azul e turquesa.
As regiões de cor vermelha indicam um alto risco de erosões.
Esse resultado de simulação apresenta uma excelente concordância com as danificações realmente existentes na matriz.
Após 50 mil fundidos, ainda não é possível reconhecer as danificações por erosão, mesmo nas regiões da peça próximas do canal de ataque.
Em comparação com as erosões, é possível reconhecer um potencial distinto para danificações causadas por trincas de fadiga térmica na simulação.
Particularmente nas regiões adjacentes ao canal de ataque, assim como nos dois canais que abastecem a região superior do componente, é possível reconhecer um elevado potencial para danificações (figura 8).
Algumas regiões do componente apresentaram coloração vermelha, o que indica um risco elevado para a formação de trincas de fadiga térmica.
Para fins comparativos, a figura 8 também ilustra as danificações existentes no componente real, depois de um número de ciclos de aproximadamente 50 mil peças.
O estado da superfície do componente é representado pela imagem da topografia superficial, que foi realizada com um interferômetro de luz branca.
O resultado da simulação para a formação de trincas de fadiga térmica também revelou uma boa concordância com as danificações realmente existentes na matriz.
Após 50 mil ciclos, é possível perceber danificações distintas na matriz, devido à formação da rede de trincas de fadiga térmica.

Conclusões

Em resumo, foi possível constatar que as ferramentas de simulação para a configuração apropriada do componente e do sistema do canal de entrada encontram aplicação crescente em componentes estruturais fundidos.
Os estudos aqui apresentados mostraram alguns princípios de solução e a sua validação em componentes de teste e seriados, considerando-se os potenciais para erosão e trinca de fadiga térmica.
Futuramente, será possível associar estes eventuais problemas com a expectativa de vida em relação ao número de ciclos esperado, por meio da documentação de diversas matrizes que acompanha a produção.
Adicionalmente, existe a possibilidade de se utilizar as regiões identificadas pela simulação, que podem causar danificação por trincas de fadiga térmica nas matrizes, como parâmetros de entrada para o leiaute do processo de pulverização.