Determinação do potencial de captação de água pluvial per capita


Cintia Loturco Pinheiro Leão, mestre em engenharia civil e ambiental, e Rodrigo Braga Moruzzi, prof. da Unesp


Estudo revela que a distribuição dos volumes anuais per capita por área de telhado (m³/m².hab.ano) para a cidade de Bauru, SP, pode exceder 56 m³/m².hab.ano em cerca de 40% dos casos e em 90% a disponibilidade é superior a 43 m³/m².hab.ano. Os resultados podem ser utilizados para estimativas preliminares do potencial de captação e aproveitamento de água pluvial.

Data: 20/08/2016

Edição: Hydro Agosto 2016 - Ano XI - No 118

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A água tem se tornado um fator limitante para o desenvolvimento agrícola, urbano e industrial, à medida que diminui sua disponibilidade per capita, devido ao aumento gradativo da demanda para usos diversificados e à contínua poluição dos mananciais ainda disponíveis.

Cerca de 30% a 40% do total de água consumida em uma residência é destinado para usos não potáveis. Se essa porcentagem fosse substituída por fontes alternativas, como o aproveitamento da água pluvial e o reúso de águas servidas, por exemplo, haveria diminuição da demanda por água potável.

Todavia, a adoção de políticas públicas demanda estimativas seguras no que tange ao potencial de aproveitamento de água pluvial por habitante. Tais estimativas devem ser realizadas com base no regime pluviométrico local e suas probabilidades associadas, bem como na disponibilidade de área de captação, representada pela área de telhado por lote.

Assim, o presente estudo tem por objetivo apresentar metodologia visando determinar o potencial de captação de água pluvial per capita. Como estudo de caso foram utilizados dados da cidade de Bauru, SP.

Metodologia

A metodologia utilizada permitiu estimar o potencial de captação de água pluvial para fins de aproveitamento. Os volumes anuais captados foram parametrizados pela área média per capita do telhado.

Para a aplicação da metodologia, os dados da cidade de Bauru quanto à área territorial e populacional foram retirados do IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (2014); os dados pluviométricos de 2013 foram fornecidos pelo IPMet – Instituto de Pesquisas Meteorológicas; e os dados de coletas, como número de lotes em 2014, as áreas de telhado de cada lote, bem como a divisões setoriais da cidade, foram enviados pela prefeitura local. O consumo médio estimado de água tratada no município em 2015 é de 200 L.hab-1.dia-1, segundo o DAE – Departamento de Água e Esgoto.

A determinação da área total de telhado e por habitante para o município, bem como a área de telhado para apartamentos e para residências seguiram a adaptação da metodologia de Ghisi, Montibeller e Schmidt [1] e os valores foram extraídos do estudo realizado por Ghisi [2].

A área média de telhado por lote, referente à habitação, foi calculada através do método estatístico de amostragem, para tal necessitou-se de definição do elemento morfológico, a realização de um estudo piloto e a amostragem definitiva. Para a estimativa da amostragem, o município foi subdividido em seis setores, obedecendo à divisão do mapa da cidade.

Para a aplicação da metodologia de Ghisi et al. [1], definiu-se o lote como sendo elemento morfológico, pelo fato de estar presente em toda a área de estudo. A variável principal adotada para determinar o tamanho da amostra foi a área de telhado de cada lote, pois está relacionada com as demais variáveis de interesse, como área construída.

Cálculo das áreas de telhado

O estudo piloto foi realizado de forma a determinar a variância da variável principal, o qual foi baseado em uma breve amostragem no cálculo da determinação do tamanho da amostra total. Foram utilizados os seis mapas dos setores de Bauru, incluindo seis lotes dos setores 1 e 2; seis do setor 2; seis do setor 3; sete lotes do setor 4; e cinco lotes do setor 5, perfazendo um total de 30 lotes. Esses dados foram coletados através do levantamento das quadras e do BIC – Boletim Informativo Cadastral de cada lote que fizeram parte dessa amostragem.

O cálculo do tamanho da amostra aleatória foi determinado a partir da metodologia de Fontes e Barbassa [3], baseado em um estudo estatístico por amostragem estratificada aleatória e proporcional. O número de lotes da amostra foi definido pela equação:

A fim de garantir a distribuição e proporcionalidade entre as coletas das amostras, foi considerada a divisão do município em setores, e o número de domicílios particulares permanentes urbanos. Por esse motivo, a amostragem está baseada na proporção entre o número de domicílios particulares urbanos em cada setor e o número total de domicílios particulares urbanos da cidade. O cálculo será definido conforme a equação:

De maneira aleatória foi definida uma quadrícula em cada setor no mapa de zoneamento da cidade, a qual garantiu a imparcialidade na escolha dos lotes, uma vez que o mapa traz apenas as identificações das quadras e divisão dos setores.

Após a escolha das quadrículas, os lotes foram identificados e o levantamento da área do telhado foi efetuado.

Conforme a metodologia de Ghisi, a área de telhado utilizada foi de 15 m² por unidade de apartamento. A área de telhado por habitante em apartamentos no município estudado foi determinada através da equação:

Foi determinado o número de habitantes por domicílio, conforme a equação:

O número de domicílios abastecidos com água potável foi fornecido através de um levantamento realizado pela PMB em agosto de 2014. Os dados utilizados fazem referência ao número de domicílios particulares permanentes urbanos abastecidos com água potável pelo DAE.

A média ponderada para cálculo da área de telhado por domicílio (casas e apartamentos) foi determinada através da equação:

onde:

A área total de telhado para o município foi calculada conforme a equação:

Determinou-se a área de telhado por habitante com base na área total de telhado e no número de habitantes urba nos do município conforme a equação:

Volume de água pluvial

O volume mensal de água pluvial que poderia ser armazenado foi determinado considerando os dados das precipitações médias mensais, a área total de telhados e um coeficiente de escoamento de 0,8. Assim, o volume de água pluvial que poderia ser captado foi determinado com base na equação:

Resultados

O estudo preliminar possibilitou a estimativa da variância das áreas de telhado para habitações (σ2 = (72,00)2). O número de amostras para o estudo piloto foi de 30, considerou-se essa variância para os 135.736 domicílios particulares permanentes, com erro máximo de 5% e na confiabilidade de 95% na estimativa da média, obtendo-se um total de 658 amostras (eq. 1). Baseada nas 658 amostras totais, fez-se a amostragem aleatória proporcional (eq. 2). O número de amostras por setor pode ser observada na tabela I, juntamente com suas respectivas populações, número de domicílios e médias de áreas de telhado.

A partir da amostragem aleatória proporcional, pode-se calcular a média das áreas de telhado para casas, obtendo-se o valor de 139,91 ± 3,12 m².

Calculou-se a área de telhado para apartamentos, obtendo-se o valor de 5,58 m²/hab.

Dispondo dos dados do censo 2014 do IBGE, pode-se estimar o número de habitantes por domicílio (eq. 4), que para uma população de 364 562 habitantes e 135 736 domicílios, resultou em 2,69 habitantes por domicílio.

Baseando-se no percentual de casas (93,81%) e apartamentos (6,19%), foi determinada a média de telhado para os domicílios de Bauru (eq. 5), resultando em 132,18 m² por domicílio. A média ponderada de área de telhado para os domicílios variou em função da média das áreas de telhado para casas (139,91 ± 3,12), apresentando os valores de 129,25 e 135,11m² por domicilio para os limites mínimo e máximo, respectivamente. Obteve-se uma área total de telhado para o município de, aproximadamente, 17,94 milhões de m² (eq. 6). Sendo a área total de telhado resultante da área de telhado por domicílio, esta também sofreu uma variação, resultando em 17,54 milhões de m² para o limite inferior e 18,33 milhões de m² para superior.

Pela equação 7, pôde-se determinar a área média de telhado por habitante, que resultou em 49,21 m²/hab. Assim como a área total, a área per capita também variou, apresentando 48,12 m²/hab e 50,30 m²/ hab para os limites inferior e superior, respectivamente.

Na figura 1 verifica-se a distribuição dos volumes anuais per capita por área de telhado (m³/m 2.hab. ano) para a cidade de Bauru. Nota-se que a possibilidade do volume exceder 56 m³/m².hab.ano é de cerca de 40% e que em 90% dos casos a disponibilidade excede o valor de 43 m³/m².hab.ano. Os resultados podem ser utilizados para estimativas preliminares do potencial de captação de água pluvial para finalidade de aproveitamento. Evidentemente, nessa estimativa preliminar o reservatório do sistema de aproveitamento não foi considerado limitante.

Fig. 1 – Distribuição dos volumes anuais per capita por área de telhado em Bauru

Conclusões

A metodologia apresentada permitiu estimar o potencial de captação de água pluvial para fins de aproveitamento. Os volumes anuais captados foram parametrizados pela área média per capita do telhado.

A área global média per capita de telhado para a cidade de Bauru resultou em 49,21 m²/hab.

O potencial de água pluvial captada apresentou valores superiores a 55,6 m³/m².hab.ano para 50% e superiores a 42,7 m³/m².hab.ano para 90%.


Referências

  1. Ghisi, E. et al.: Potential for potable water savings by using rainwater and greywater in a multi-storey residential building in southern brazil. Building and environment,. v. 42, n. 7, p. 2512-2522, 2006.
  2. Ghisi, E.: Potential for potable water saving by using rainwater in the residential sector of Brazil. Building and Environment, West Lafayette, v. 41, n. 11, p. 1544-1550, 2006.
  3. Fonte, A.R.M.; Barbassa, A.P. Diagnóstico da ocupação e da impermeabilização urbanas. Revista Brasileira de Recursos Hídricos. v. 8. n.2. p. 137-147, 2003.