Muitas vezes os bens de consumo precisam apresentar uma superfície branca radiante, que se destina a transmitir pureza e limpeza. Para obter este efeito, geralmente se usa dióxido de titânio (TiO2) como pigmento branco. Ele é usado em muitas indústrias, atribuindo coloração branca opaca e brilhante a embalagens plásticas, revestimentos e tintas, e também a alimentos(1,2). No entanto, devido à elevação dos custos das matérias-primas, extração que requer mão de obra intensiva e o balanço desfavorável de dióxido de carbono, bem como o dispendioso descarte dos subprodutos resultantes, às vezes nocivos, surgiu uma demanda crescente na indústria no sentido de substituir o TiO2 . Nos últimos anos também houve aumento do temor de que esse pigmento pudesse ser prejudicial às pessoas e ao meio ambiente.

 

O besouro Cyphochilus insulanus é quase que totalmente coberto por escamas brancas. Nesses casos, a luz é espalhada por estruturas porosas e não por pigmentos (© Markus Breig, KIT)

 

Particularmente as partículas com granulometria na faixa nanométrica são objeto de fortes críticas(3). Tais preocupações já levaram à proibição do TiO2 como aditivo alimentar na França(4). Além disso, no futuro, pode ocorrer com o TiO2 um problema semelhante ao que já ocorre com os microplásticos, uma vez que, a longo prazo, as partículas quimicamente inertes do pigmento podem se desprender do meio onde se encontram incorporadas e se acumular no meio ambiente.

Naturalmente existem muitas boas razões para se usar o TiO2 como pigmento branco(2). Alguns autores e engenheiros até consideram que ele constitui a única alternativa nesse sentido. Ele espalha a luz de maneira particularmente eficaz devido ao seu alto índice de refração óptica, pois se consegue alto contraste entre as densidades ópticas das partículas de TiO2 e a da matriz (polímero, aglutinante etc.). Isso possibilita uma dispersão muito eficaz de todos os comprimentos de onda da luz visível na interface entre o meio e as partículas de TiO2 , resultando numa impressão de cor branca e boa opacidade.

No entanto, a natureza mostra que a abordagem clássica de se usar pequenas partículas com alta densidade óptica como centros de dispersão não é a única maneira de espalhar a luz de forma eficaz. Existem alguns exemplos de materiais brancos onde atua um mecanismo de dispersão diferente. Em pigmentos como TiO2 a luz é espalhada nas partículas de pigmento. Contudo, nanobolhas de ar ou estruturas porosas também podem servir como centros de dispersão.

O exemplo mais conhecido desse princípio em biofotônica é o besouro Cyphochilus insulanus (ver foto no início do artigo), proveniente do sudeste da Ásia(6,7). Sua cor branca provavelmente serve como camuflagem, pois ele vive em um cogumelo com cor semelhante em ambiente sombreado(8). A parte superior de seu corpo é quase totalmente coberta por escamas brancas com aproximadamente 60 µm de largura e 200 µm de comprimento. As escamas são porosas em seu interior e constituídas por uma rede de estruturas fibrosas (figura 1). Apesar de sua pequena espessura, inferior a 10 µm, as escamas espalham a luz de todos os comprimentos de onda de forma quase perfeita. Este efeito tem sido intensamente investigado por vários grupos nos últimos anos e serviu de modelo para o desenvolvimento de materiais para dispersão de luz(9-12).

 

Fig. 1 – A imagem obtida por microscopia eletrônica de varredura mostra o interior de uma escama do besouro Cyphochilus insulanus. A estrutura porosa espalha a luz tão bem que uma camada com apenas 10 µm de espessura é suficiente para fazê-la parecer branca (© Julia Syurik, KIT)

 

O exemplo do besouro Cyphochilus ilustra muito bem a diferença entre estruturas que ocorrem naturalmente e aquelas feitas pelo homem. Enquanto os engenheiros costumam desenvolver soluções usando materiais constituídos por muitos elementos químicos diferentes, as abordagens naturais são limitadas a um único material-base, que geralmente exibe propriedades mecânicas, ópticas ou físicoquímicas intrigantes graças a uma forma tridimensional complexa. A biônica, que lida com a compreensão, abstração e imitação dos fenômenos da natureza para torná-los tecnicamente utilizáveis, muitas vezes leva a novas abordagens promissoras – que nunca poderiam ser encontradas de outra maneira.

O efeito descrito para as escamas do besouro Cyphochilus também pode ser produzido pela introdução de cavidades muito pequenas e cheias de ar no material, semelhante ao que se observa na espuma de sabão. A luz é espalhada na interface entre o poro e o meio circundante, que, no caso aqui estudado, é um polímero. O alto contraste entre as densidades ópticas resulta da baixa densidade óptica do ar em comparação com o material circundante. O truque fundamental consiste em fazer essas bolhas tão pequenas de forma a poderem ser usadas como revestimento. Quando o tamanho dos poros é reduzido a algumas centenas de nanômetros, todos os comprimentos de onda da luz visível são efetivamente dispersos e até mesmo camadas finas do material poroso assumem cor branca.

Pesquisadores do Instituto de Tecnologia de Karlsruhe (Karlsruher Institut für Technologie, KIT) desenvolveram um processo para produzir esses revestimentos. Ele requer que os polímeros sejam expandidos usando-se dióxido de carbono em estado supercrítico (CO2 ) (figura 3), ou seja, num estado de agregação que se encontra entre o líquido e o gasoso. Uma vez que se trata de um gás atóxico, inerte e não inflamável, o CO2 supercrítico agora assumiu grande importância, tanto para a formação de espuma quanto para várias outras aplicações como, por exemplo, no campo da modificação e mistura de polímeros, ou produção de partículas(14). Isso ocorre principalmente porque esse gás atua como plastificante no caso de polímeros em que o CO2 apresenta boa solubilidade. O uso desse gás faz com que a temperatura de transição vítrea (Tv) desses polímeros caia significativamente sob a influência do CO2 (15). Devido às boas propriedades de difusão a ele associadas, esse gás é frequentemente usado no estado supercrítico, que é quando se encontra sob pressão superior a 73,75 bar e temperaturas maiores que 31°C.

 

Fig. 3 – O gráfico à esquerda mostra a reflexão em função do comprimento de onda. A imagem obtida por microscopia eletrônica de varredura mostra a estrutura de um filme expandido de PMMA com 10 µm de espessura. O gráfico à direita compara os filmes expandidos de PMMA com outros materiais brancos (Fonte: Julia Syurik, KIT; Gráfico: © Hanser)

 

Obtenção da cor branca usando expansão

No processo desenvolvido pelo KIT (figura 2), o polímero é primeiramente saturado com CO2 sob condições constantes de temperatura e pressão, normalmente até que a concentração de gás na amostra atinja o limite de solubilidade. À medida que o CO2 se difunde no polímero, sua temperatura de transição vítrea diminui. Sob determinadas condições, ela fica abaixo da temperatura ambiente(16). O polímero incha e torna-se viscoso quando sua temperatura se encontra acima da temperatura de transição vítrea efetiva.

 

Fig. 2 – A formação de espuma usando CO2 supercrítico possibilita a criação de nanoporos muito pequenos em polímeros como o PMMA. Como resultado disso, o material a princípio transparente torna-se branco apenas pela ação de sua estrutura, sem requerer a adição de pigmentos (Fonte: Luisa Borgmann, KIT; Gráfico: © Hanser)

 

Na etapa seguinte ocorre uma queda repentina de pressão que induz instabilidade termodinâmica. Isso leva à supersaturação do polímero, pois agora a solubilidade do CO2 nele é significativamente menor. A nucleação de bolhas ocorre como resultado da supersaturação. Os núcleos devem atingir um determinado tamanho crítico para que ocorra seu crescimento posterior. Agora o crescimento dos poros pode ocorrer através da difusão de moléculas de gás desde a matriz polimérica até os núcleos recém-formados.

Enquanto o gás da matriz polimérica se difunde para dentro dos poros em crescimento e, parcialmente, para fora do material, a temperatura de transição vítrea aumenta novamente. A estrutura dos poros se solidifica quando a temperatura de transição vítrea crescente do polímero alcança a temperatura real da amostra(17-19). O polímero então assume cor branca devido à estrutura dos poros. O tamanho e a densidade dos poros podem ser controlados tanto por meio dos parâmetros do processo como por outras modificações feitas nele. Por exemplo, temperaturas mais elevadas promovem crescimento prolongado dos poros, os quais, portanto, assumem maior tamanho; já a redução da pressão diminui a densidade dos poros.

Os espectros ópticos incluídos na figura 3 mostram a eficiência com que a luz é espalhada nos nanoporos. Nestes exemplos, filmes finos de (poli)metacrilato de metila (PMMA), com espessuras de camada diferentes e precisamente definidas, foram aplicados a um substrato de vidro e expandidos sob parâmetros otimizados usando-se CO2 supercrítico. A seguir os filmes foram submetidos à análise óptica. A reflexão desses filmes na faixa de luz visível é quase constante e aumenta com a espessura da espuma de PMMA. Mesmo camadas com espessura efetiva de 9 µm são suficientes para se atingir um grau de reflexão de aproximadamente 60%. O efeito se intensifica com o aumento da espessura da camada e, para uma espessura de 79 µm, mais de 90% da luz incidente é refletida. A imagem inserida no gráfico da figura 3, registrada por microscopia eletrônica de varredura (MEV), mostra a estrutura interna do filme com camada efetiva de 9 µm. Os poros apresentam diâmetro de algumas centenas de nanômetros e são distribuídos irregularmente no PMMA.

O gráfico à direita na figura 3 compara a dispersão dos filmes de PMMA com outros materiais, como papel, o chamado “vidro fotônico”, e o besouro Cyphochilus. Aqui o grau de transmissão da luz foi plotado em função do inverso da espessura domaterial. Esta assim chamada “lei de Ohm óptica” fornece uma indicação do caminho livre médio da luz e, dessa forma, permite uma comparação simples entre diferentes materiais(7, 11). Neste gráfico, a curva do papel branco apresentou a inclinação mais acentuada, enquanto a curva do vidro fotônico é muito mais plana. As escamas do besouro branco apresentaram o melhor desempenho em termos da eficiência de dispersão e sua curva correspondente é muito plana, pois o caminho livre médio da dispersão da luz foi de apenas 1,47 µm. Neste gráfico os filmes expandidos de PMMA apresentaram desempenho um pouco pior do que o do vidro fotônico, mas significativamente melhor do que o do papel branco. Para o olho humano, um filme com apenas 10 µm de espessura assume coloração branca.

 

Técnica adequada para PMMA, TPU e PLA

O uso de pigmentos potencialmente nocivos ao meio ambiente e à saúde pode ser evitado usando-se o processo aqui apresentado, adotando-se a criação de estruturas poliméricas porosas que produzem um nível de espalhamento de luz comparativamente alto. Assim como ocorre com as bolhas de espuma de banho, essas estruturas também promovem o espalhamento da luz, fazendo com que o material pareça branco. A tecnologia possui baixo custo e, além do PMMA, também é adequada para várias resinas termoplásticas como, por exemplo, poliuretano termoplástico (TPU) e polilactídeos biodegradáveis (PLA).

Os filmes finos de polímero são muito flexíveis e leves. Embora a nanoestruturação altere as propriedades elásticas do material, os filmes são tão estáveis mecanicamente(20) que podem ser termoformados e aplicados como revestimento em diferentes superfícies(11).

A expansão de polímeros usando CO2 supercrítico não deixa resíduos de solventes, pois a estrutura dos poros é criada de forma puramente física. Portanto, existe um grande potencial para esta abordagem em aplicações nas quais deve-se evitar a presença de resíduos de solventes e onde se procura alternativas ao uso de TiO2 como, por exemplo, em embalagens de alimentos e cosméticos. A crescente demanda pela reciclagem eficiente de produtos é outra vantagem adicional, pois a incorporação de poros é muito mais fácil de ser desfeita do que a incorporação de partículas. Se o polímero for adequadamente aquecido, as nanobolhas desaparecem sem deixar nenhum resíduo. Essa eliminação das nanobolhas também é possível de ser feita localmente, permitindo que os filmes fiquem novamente transparentes em apenas alguns determinados pontos.

Uma vez que muitos bens de consumo, desde embalagens até superfícies de móveis, são feitos com polímeros ou são revestidos com filmes de polímeros cuja coloração branca se baseia na adição de TiO2 , há uma ampla gama de aplicações para os filmes expandidos. Além disso, a motivação para substituir as partículas de TiO2 é crescente. Isso é o que os usuários finais desejam, e há a expectativa de que, no futuro, surjam outros requisitos legais relativos ao uso de TiO2 .

No entanto, o material expandido não constitui um substituto 1:1 para o TiO2 ou outros pigmentos brancos. A aplicação do polímero expandido na forma de filme requer novas abordagens. Em vez de se usar revestimentos ou filmes totalmente poliméricos, as partículas de espuma podem ser incorporadas a uma matriz de plástico. A figura 4 mostra que tais partículas também podem ser expandidas. Uma partícula transparente de PMMA assume cor branca após a expansão. Esta técnica também pode ser usada para atribuir cor branca a materiais que não podem ser diretamente expandidos.

 

Fig. 4 – O processo também é adequado para expandir partículas de PMMA. No futuro elas deverão ser testadas quanto à sua aplicabilidade como pigmentos (Fonte: Luisa Borgmann, KIT; Gráfico: © Hanser)

 

Agradecimentos

Os autores agradecem à Gabriele Wiegand e Siegbert Johnsen, do KIT, pelo seu apoio ativo e atencioso a este projeto.

 

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

 

As referências bibliográficas relativas a este artigo podem ser encontradas no seguinte endereço eletrônico: www.kunststoffe.de/2020-07.


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