A manufatura aditiva por extrusão (MEX, do inglês material extrusion additive manufacturing) caracteriza-se pela deposição seletiva de materiais semissólidos para a produção de objetos tridimensionais camada por camada, a partir de arquivos digitais. Tipicamente, as impressoras 3D baseadas em extrusão possuem cabeçote com um êmbolo ou rosca para pressurizar o material através do bocal de deposição. Após a extrusão os fios ou fibras de material devem solidificar rapidamente e aderir uns aos outros(1-3). Apesar de ser possível utilizar reações químicas ou processos de evaporação de solventes para curar ou secar as camadas de material recém-depositadas, a maioria dos sistemas de impressão 3D baseados em extrusão utiliza os efeitos da variação de temperatura para controlar a fluidez de termoplásticos(4-10).
O mercado de impressoras 3D por extrusão é atualmente dominado pela tecnologia de fabricação por filamento fundido (FFF, do inglês fused filament fabrication), similar à tecnologia de modelagem por deposição de fundido (FDM, do inglês fused deposition modeling) originalmente patenteada pela Stratasys(1). Nestes, o cabeçote de deposição consiste em uma câmara aquecida que é alimentada por um filamento de material termoplástico. A porção sólida do filamento atua como êmbolo, empurrando o material fundido da câmara aquecida para o bocal de deposição. O cabeçote geralmente se movimenta em duas direções durante a deposição sobre a superfície de construção. Após completar a primeira camada, a superfície desloca-se para baixo para que uma nova camada seja depositada e assim sucessivamente(4-10).
Entre os termoplásticos fornecidos como filamentos para impressão 3D, o poli(ácido lático) (PLA) pode ser considerado o de mais fácil utilização. Ele pode ser impresso sob temperaturas inferiores, apresenta menor tendência ao empenamento, melhores propriedades mecânicas e baixa toxicidade em relação aos filamentos de acrilonitrila-butadienoestireno (ABS)(10-17).
O PLA pode ser obtido via fermentação bacteriana ou por rotas químicas. Seu monômero apresenta duas formas opticamente ativas: De L-ácido lático. Os processos de fermentação são responsáveis por produzir quase exclusivamente L- ácido lático, enquanto os métodos petroquímicos produzem misturas dos dois enantiômeros. Sua polimerização pode ser realizada por policondensação direta, desidratação azeotrópica ou reação de abertura de anel. Comercialmente, o método de abertura de anel é o mais explorado para produzir copolímeros de poli(ácido L-lático) (PLLA) e poli(ácido D,L-lático) (PDLLA) de alta massa molar. A massa molar é crucial para as propriedades das resinas de PLA. A resistência mecânica, a temperatura de transição vítrea (Tg) e a de fusão (Tm) aumenta com a massa molar, assim como a viscosidade(18, 19).
Este último é um fator importante para a aplicação bem-sucedida dos termoplásticos em processos de impressão 3D(10). Devido à sua atividade óptica, as propriedades do PLA também dependem do enantiômero predominante e da pureza óptica. Em maior proporção, o L- ácido lático favorece a cristalização e aumenta a Tg e Tm. Por sua vez, resinas de PLA com mais D-ácido lático tendem a ser amorfas e apresentam baixa Tg e Tm. A presença de mesolactídeos (unidades de D,L-ácido lático) reduz a Tm e aumenta o meio tempo de cristalização, o que geralmente resulta em menor cristalinidade(18, 19).
Filamentos de PLA em várias cores, com ou sem adição de partículas, estão disponíveis para impressão 3D(20). Entretanto, com exceção da temperatura de deposição, os fornecedores disponibilizam poucas informações sobre as propriedades dos materiais. A falta de padronização das matérias-primas e as instruções de uso pouco específicas sobre os filamentos frequentemente causam problemas em impressão 3D, tais como fluxo inconsistente de material, obstrução do bocal de deposição ou erosão do filamento por parte do mecanismo de alimentação(21).
Existem diversas investigações sobre a influência dos parâmetros de processo (temperatura do cabeçote, ângulo de varredura, velocidade de deposição) nas propriedades mecânicas e qualidade superficial de peças de PLA fabricadas por impressão 3D(13-15, 22-26). A caracterização do material antes do processo de impressão é geralmente ignorada pela comunidade de impressão 3D. Investigações sobre as temperaturas necessárias para extrudar algumas cores de PLA, bem como sua influência na cristalinidade percentual e resistência à tração das impressões 3D, constam da literatura(12). Mais recentemente, estudos abordaram correlações entre propriedades reológicas do PLA transparente e qualidade de impressão(27).
Além dos efeitos causados por pigmentos e aditivos, o ambiente termomecânico imposto durante o processo de pigmentação necessário para a fabricação dos filamentos coloridos de PLA pode afetar suas propriedades finais(18, 19). Esse estudo aborda a caracterização que pode determinar propriedades importantes dos filamentos antes do processo de impressão 3D. Os experimentos foram conduzidos com filamentos de PLA de diferentes cores, para investigar a variação de suas propriedades e sugerir alternativas para contornar problemas mais comuns. Os métodos de caracterização podem ser usados para estabelecer fichas de informações técnicas a respeito de matériasprimas processadas por meio de tecnologia FFF de impressão 3D.
Procedimento experimental
Filamentos de PLA de 1,75 mm de diâmetro com cor natural, branca, preta, vermelha, amarela e azul foram fornecidos em formato de bobinas, acondicionadas em embalagens fechadas a vácuo com 1 kg de material. Apenas uma faixa geral para a temperatura de impressão, entre 190 e 220 ºC, estava indicada nas embalagens. Um protocolo de caracterização foi proposto para investigar a composição química, as propriedades em fluxo, propriedades térmicas e mecânicas de amostras dos filamentos antes da impressão 3D (figura 1).
Fig. 1 – Protocolo de caracterização com as técnicas empregadas.
A quantidade de aditivos inorgânicos e/ou pigmentos foi investigada de acordo com o procedimento B descrito na norma ISO/ASTM D5630, por meio da queima de amostras de 10 g de cada filamento em mufla a 600 ºC por quatro horas. O resíduo resultante foi pesado em balança de precisão e sua composição química foi analisada em microscópio eletrônico de varredura Zeiss, modelo LEO 440, equipado com sensores para espectroscopia de raiosX por dispersão de energia (Isis System Series 300).
O comportamento em fluxo foi inicialmente caracterizado por meio de testes de fluidez, de acordo com o procedimento A descrito na norma ISO/ASTM D1238. Um plastômetro manual, aquecido a 190 ºC, equipado com matriz de 2,095 mm de diâmetro e pistão com massa de 2,16 kg foi usado. Cinco medições foram realizadas para cada cor de filamento, com corte do extrudado a cada 60 segundos. A viscosidade em regime permanente em baixas taxas de cisalhamento também foi determinada usando um reômetro com controle de deformação da TA Instruments, modelo ARES G2, equipado com placas paralelas de 25 mm de diâmetro afastadas 1 mm entre si. As taxas de cisalhamento impostas variaram entre 0,01 s-1 a 100 s-1 a 190 ºC, com purga de N2.
Os ensaios termoanalíticos foram feitos em um calorímetro da TA Instruments, modelo Q100 DSC. A fim de destruir o histórico térmico dos filamentos,amostras com cerca de 7 mg de cada material foram submetidas a um primeiro ciclo de aquecimento, de 25 a 220 ºC a uma taxa de 10 ºC/min, mantidas a 220 ºC por cinco minutos, e então resfriadas até 25 a 10 ºC/min. O segundo ciclo de aquecimento também foi realizado com taxa de 10 ºC/min até que a temperatura de 220 ºC fosse obtida. O percentual de cristalinidade (Xc (%)) foi calculado de acordo com a equação 1, usando os valores da entalpia de cristalização a frio (ΔHcc) e da entalpia de fusão (ΔHm) disponíveis nos termogramas de cada amostra, e considerando o valor da entalpia de fusão do PLA 100% cristalino (ΔH0 m) como 93,0 J/g(15).
Amostras dos filamentos foram testadas em tração utilizando uma máquina de ensaios universal da Instron, modelo UTM-5569, equipada com garras pneumáticas para filmes e célula de carga de 500 N. As garras foram afastadas em 100 mm e as amostras foram ensaiadas a 25 mm/min. Os experimentos foram realizados sob temperatura ambiente (25 ºC) em sala com umidade controlada.
Fig. 2 – Curvas reológicas dos filamentos de PLA a 190 ºC.
Resultados e discussão
Composição química
Além dos pigmentos, muitos compostos podem ser adicionados à resina-base durante o processamento do polímero para conferir propriedades variadas, tais como retardantes de chama, aditivos para aumentar a resistência à radiação UV e enchimentos ou cargas para tornar o produto mais barato. A tabela 1 mostra o teor de compostos inorgânicos obtido após a queima das amostras de PLA colorido.
Tab. 1 – Teor de compostos inorgânicos nos filamentos.
Os filamentos com cor branca e amarela exibiram a maior quantidade de inorgânicos, seguidos pelo preto, azul e vermelho. Como esperado, o teor de material inorgânico presente no filamento natural é pouco significante. A quantidade de compostos inorgânicos difere significativamente em relação a outros estudos(9), em que foram constatados 10% em filamentos de PLA branco e preto. A diferença é esperada, tendo em vista a origem distinta dos filamentos.
A tabela 2 mostra a porcentagem média dos elementos químicos presentes em duas regiões de amostras dos resíduos pós-queima. Apesar de os valores não representarem necessariamente a composição total dos filamentos, é possível inferir que a maioria dos materiais continha compostos à base de cálcio, titânio, magnésio, zinco e alumínio. De acordo com a literatura, o carbonato de cálcio (CaCO3 ) é geralmente utilizado para melhorar a fluidez de pellets coloridos concentrados em sistemas poliméricos. O dióxido de titânio (TiO2) é um dos pigmentos brancos mais utilizados, sendo também empregado para preparar o material para outros pigmentos. O talco (Mg6 (Si8 O20)(OH)4) é usado para facilitar o processamento, enquanto o óxido de zinco (ZnO) é geralmente adicionado por conferir proteção contra a radiação UV(28, 29). Dos compostos mencionados, apenas o talco foi previamente identificado em filamentos de PLA por meio de microscopia eletrônica de varredura e espectroscopia no infravermelho por transformada de Fourier (FTIR) nas análises(9).
Tab. 2 – Quantificação dos elementos encontrados nos resíduos pósqueima dos filamentos de PLA.
Com relação aos pigmentos inorgânicos comumente usados para tingir os polímeros, pode-se correlacionar apenas a cor do filamento branco à adição de dióxido de titânio. O filamento preto provavelmente continha carvão pulverizado, que é o pigmento mais usado para obter tonalidades de preto. Para os filamentos com cor vermelha, amarela e azul, os elementos químicos identificados não puderam ser correlacionados com nenhum pigmento inorgânico citado na literatura(28). Provavelmente, compostos orgânicos foram usados nesses casos, os quais teriam se perdido durante o processo de queima. A presença dos elementos cloro e enxofre nos filamentos amarelo e vermelho poderia indicar que corantes orgânicos do tipo azo foram utilizados, como o amarelo 97 e vermelho 5. No caso do filamento azul, a presença do elemento cobre no resíduo de queima poderia indicar a utilização de corante orgânico à base de ftalocianina, como o azul 15:2(28).
Propriedades em fluxo
A tabela 3 mostra os índices de fluidez (IF) obtidos a 190 ºC, de acordo com a cor do filamento de PLA testado. Os resultados mostraram que os filamentos com cor azul, branca e preta são os que fluem com mais facilidade nas condições testadas, seguidos pelos com cor amarela, vermelha e natural. Notase que entre os filamentos com cor natural, azul ou branco a diferença de fluidez chega a uma ordem de grandeza, indicando que a temperatura de impressão 3D deve ser ajustada de uma cor para outra.
Tab. 3 – Índice de fluidez (IF) de acordo com a cor do filamento testado.
Apesar das diferenças apontadas pelo índice de fluidez, deve-se lembrar que esse tipo de ensaio representa uma medida isolada e indireta da viscosidade do polímero, a qual varia em função da taxa de cisalhamento do processo. Além disso, a taxa de cisalhamento imposta no ensaio de fluidez pode não ser baixa o suficiente para evidenciar diferenças estruturais dos polímeros (massa molar média, distribuição de massa molar), refletindo-se no comportamento em fluxo. Assim, foram realizados os ensaios de reometria rotacional em placas paralelas. A figura 2 mostra as curvas de viscosidade em função da taxa de cisalhamento obtidas para cada cor de filamento.
Os filamentos com cor vermelha e natural apresentaram viscosidade em baixa taxa de cisalhamento praticamente iguais (cerca de 2.900 e 2.700 Pa.s, respectivamente), seguidos pelo PLA amarelo (~1.300 Pa.s). O PLA branco apresentou viscosidade em baixa taxa de cisalhamento em torno de 800 Pa.s, seguido pelo PLA preto (~600 Pa.s) e azul, com menor viscosidade (~100 Pa.s). Os resultados se correlacionam bem com os índices de fluidez, mesmo considerando os filamentos com cor branca e preta, tendo em vista que as curvas são praticamente sobrepostas nas taxas mais baixas de cisalhamento.
A região de viscosidade constante (platô Newtoniano) se estende mais para os materiais com menor viscosidade. No caso do PLA com cor natural e vermelha, a viscosidade é constante até taxas de cisalhamento de aproximadamente 3 s-1, em contraste com o PLA azul, por exemplo, cujo platô Newtoniano chega a taxas de cisalhamento de 30 s-1. Os platôs Newtonianos mais estreitos podem ser correlacionados à presença de moléculas de tamanhos variados, com moléculas curtas agindo como lubrificante para moléculas mais longas, e favorecendo a orientação molecular em fluxo, o que antecipa a região de comportamento pseudoplástico. Platôs mais longos podem indicar moléculas de tamanho mais uniforme.
Uma vez que a degradação termomecânica frequentemente está associada à diminuição do tamanho das moléculas (redução da massa molar média e estreitamento da distribuição de massa molar do polímero), os valores gerais de viscosidade e a extensão dos platôs Newtonianos podem indicar menor degradação dos filamentos de PLA com cor natural e vermelha, e maior degradação do filamento azul.
Fig. 3 – Termogramas das amostras de PLA para o ciclo de resfriamento.
Propriedades térmicas
A tabela 4 mostra as propriedades térmicas e a cristalinidade dos filamentos de PLA para o primeiro ciclo de aquecimento. A transição vítrea ocorreu entre 58 e 60 ºC, exceto no caso dos filamentos preto (62,4 ºC) e azul (57,1 ºC). A maioria das amostras exibiu dois eventos de cristalização a frio, exceto o PLA com cor natural e preta. A temperatura de fusão ficou próxima a 150 ºC para todos os materiais, com exceção do PLA amarelo (176,2 ºC). As propriedades refletem o histórico térmico dos filamentos como recebidos do fornecedor. A figura 3 mostra os termogramas das amostras de filamentos em resfriamento após o primeiro ciclo de aquecimento. Considerado um material de cristalização lenta, o PLA puro geralmente não apresenta cristalização significativa em resfriamento a 10 ºC/min(30, 31). Entretanto, picos exotérmicos podem ser observados para os filamentos amarelo e azul, em torno de 105 ºC e 110 ºC, respectivamente. A partir dos valores das entalpias de cristalização, e usando a equação 1, a cristalinidade percentual resultante do ciclo de resfriamento das amostras de PLA com cor amarela e azul foi de 32,1% e 30,1%, respectivamente.
Tab. 4 – Propriedades térmicas e cristalinidade dos filamentos de PLA após primeiro ciclo térmico.
A figura 4 mostra os termogramas para o segundo ciclo de aquecimento, separados por fenômeno térmico para facilitar a comparação: (a) transição vítrea, (b) cristalização a frio e (c) fusão. A transição vítrea manteve-se em torno de 60 ºC para a maioria das cores de filamento, como observado em outros estudos(30, 32). A exceção foi o PLA amarelo, com Tg próxima a 65 ºC. Vale ressaltar que o PLA azul não exibiu cristalização a frio durante o aquecimento, indicando que toda a sua capacidade de cristalização se exauriu durante o resfriamento. A tabela 5 mostra as propriedades térmicas e o percentual de cristalinidade das amostras de PLA colorido para o segundo ciclo de aquecimento. O PLA com cor natural e o preto exibiram alguma cristalização a frio com pico em torno de 130 ºC. A cristalização foi mais pronunciada no filamento branco e vermelho, com pico em 125,7 ºC e 112 ºC, respectivamente. Além de o PLA amarelo ter exibido cristalização acentuada no resfriamento, um pequeno pico exotérmico também pôde ser observado durante o segundo ciclo de aquecimento, próximo ao pico de fusão.
Fig. 4 – Termogramas dos filamentos de PLA, mostrando: (a) transição vítrea; (b) cristalização a frio; e (c) fusão para o segundo ciclo de aquecimento.
Tab. 5 – Propriedades térmicas e cristalinidade dos filamentos de PLA após o segundo ciclo térmico.
A temperatura de pico de fusão ficou em torno de 150 ºC para a maioria das amostras, exceto para o filamento amarelo (177 ºC). Além disso, as entalpias de cristalização a frio e fusão foram parecidas para os filamentos com cor natural, branca, preta e vermelha, resultando em cristalinidade insignificante. Corroborando os resultados obtidos durante o ciclo de resfriamento, o PLA amarelo e o azul exibiram índice de cristalinidade de cerca de 30%. Sabendo que a massa molar do PLA azul é provavelmente a mais baixa, como foi indicado pelos ensaios reológicos, sua cristalização pode ser atribuída à maior mobilidade molecular, que reduz a energia necessária para o processo de organização das cadeias poliméricas(31). No caso do PLA amarelo, as altas temperaturas de transição vítrea, cristalização a frio e fusão, bem como a expressiva cristalinidade, podem estar relacionadas à predominância de ácido L-lático e à maior pureza óptica. De fato, o valor das propriedades térmicas e o nível de cristalinidade do PLA amarelo são similares aos valores descritos para o PLA com teor de ácido L-lático maior que 90%(11, 32-34).
Propriedades mecânicas
A figura 5 apresenta a tensão de escoamento obtida para os filamentos de PLA. O filamento amarelo apresentou maior tensão de escoamento (57,4 ± 3,4 MPa), seguido pelo vermelho (54,3 ± 3,2 MPa), azul (52,2 ± 2,4 MPa), preto (50,3 ± 1,6 MPa), branco (48 ± 2,7 MPa) e com cor natural (47,7 ± 1,7 MPa). Os resultados refletem a complexa contribuição da massa molar dos polímeros, proporção dos enantiômeros e pureza óptica nas propriedades mecânicas dos filamentos. No caso do PLA amarelo, a maior tensão de escoamento pode ser correlacionada à maior cristalinidade, provavelmente devido à presença majoritária de L-ácido lático e de sua pureza óptica. Para o filamento com cor vermelha, a resistência ao escoamento pode ser atribuída à elevada massa molar. Já para o PLA azul, a despeito de possivelmente apresentar a menor massa molar média, o efeito da cristalinidade pode ter sido dominante. A tensão de escoamento dos filamentos com cor preta, branca e natural parece estar mais relacionada à massa molar, uma vez que sua tendência à cristalização é muito baixa.
Conclusão
Com exceção do PLA com cor natural, as análises químicas revelaram que os filamentos contêm até 1,5% em massa de aditivos inorgânicos, os quais devem incluir carbonato de cálcio, dióxido de titânio e talco. Os componentes inorgânicos citados, excluindo o dióxido de titânio, não necessariamente se relacionam com a cor dos filamentos. Presume-se que pigmentos orgânicos tenham sido usados para conferir cor aos filamentos, portanto, sua determinação exata é de difícil realização. As propriedades em fluxo variam de acordo com a cor dos filamentos, como indicado pelos testes de fluidez e ensaios reológicos. As curvas de viscosidade em baixa taxa de cisalhamento podem ser relacionadas à estrutura das moléculas dos filamentos, o que reflete as características das resinas-base usadas, bem como uma possível degradação resultante dos processos de pigmentação das matérias-primas. Apesar das recomendações dos fornecedores, deve-se utilizar temperaturas mais altas apenas no caso dos filamentos de maior viscosidade, facilitando sua extrusão. A utilização de temperaturas muito altas em filamentos de baixa viscosidade pode levar à deposição excessiva de material ou à fusão prematura do material e consequente congestionamento do cabeçote.
As análises térmicas também demonstraram diferenças nos fenômenos de fusão e cristalização dos filamentos de PLA de acordo com sua coloração. Para as propriedades térmicas e a cristalinidade do PLA amarelo, os fatores mais importantes parecem ser a proporção de enantiômeros e pureza óptica. No caso do azul, o nível de degradação de suas moléculas pode ser responsável pela baixa Tg e maior propensão à cristalização. As propriedades mecânicas investigadas por meio da tensão de escoamento refletem a influência dos diversos fatores mencionados anteriormente. Embora não afetem diretamente o processo de deposição 3D, a qualidade das peças impressas é afetada pelas características das matérias-primas usadas. A partir dos resultados dos ensaios mecânicos, pode-se esperar que objetos fabricados com o filamento de PLA amarelo sejam mais resistentes. Entretanto, a contribuição da impressão 3D, com sua própria dinâmica de aquecimento e resfriamento das sucessivas camadas, além dos vazios inerentes ao processo, pode alterar a tendência observada para os filamentos.
Experimentos simples como testes de fluidez, ensaios termoanalíticos e ensaios mecânicos podem ser utilizados por fornecedores de filamentos, tanto para controle da qualidade de seus produtos quanto para permitir o ajuste dos parâmetros de impressão 3D por parte dos consumidores, evitando assim problemas durante o processo e contribuindo para ampliar a aplicabilidade dessa tecnologia.
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Os aditivos são essenciais para o processamento do poli(cloreto de vinila) e outras resinas. Eles tornam os processos mais eficientes e evitam danos aos polímeros. Um bom exemplo são os agentes deslizantes ou lubrificantes. Contudo, a seleção do aditivo apropriado deve ser precisamente compatível com o polímero. O parâmetro de solubilidade de Hildebrand já provou ser útil para esse fim. Agora, pela primeira vez, seus valores estão disponíveis para muitos agentes deslizantes comuns. Este artigo dá continuidade à análise publicada na edição de fevereiro/março 2024, que tratou da compatibilidade dos aditivos plastificantes.
24/10/2024
Dentre as alternativas sustentáveis aos plásticos fósseis convencionais destacam-se os bioplásticos biodegradáveis, tais como o amido termoplástico (TPS) que, em blendas com o poli(butileno adipato co-tereftalato) (PBAT), pode ter suas propriedades melhoradas. O objetivo deste trabalho é avaliar a estabilidade térmica e o comportamento reológico do TPS, PBAT (ecoflex®) e de suas blendas LC50 (50%TPS+50%PBAT) e LC30 (30%TPS+70%PBAT) por meio de análises de TGA e DSC, pelo comportamento reológico durante o processamento em um misturador e pelo índice de fluidez (IF) no estado fundido. A incorporação do TPS ao PBAT nas duas blendas proporcionou melhor estabilidade térmica do PBAT, uma vez que sua decomposição teve início em um ponto 10oC acima. A blenda LC50 apresentou IF compatível com outros materiais utilizados em aplicações flexíveis. O TPS se mostra benéfico para formulações com o PBAT, já que promove redução de custos, aumento do teor de carbono renovável e melhoria da estabilidade térmica.
26/09/2024