Um exemplo atual de aplicação na área médica é a incorporação de agentes medicamentosos como antibióticos ou prata à matriz do material de equipamentos ou, alternativamente, à camada externa de cateteres de longa permanência, visando inibir a formação de biofilmes durante sua utilização e evitar a ocorrência de infecções (1,2). Os cateteres também são revestidos com agentes anticoagulantes como heparinas para que não ocorra trombose, por exemplo.
Gotas de água sobre silicone. À esquerda: sem estruturação (hidrofóbico); à direita: com estruturação superficial periódica (super-repelente) (TITK)
No entanto, infecções e, frequentemente, tromboses associadas ao biofilme ocorrem de forma recorrente nessas aplicações. Uma solução para superar este problema poderia estar na estruturação específica das superfícies do material de itens desse tipo (3).
O instituto alemão Turingiano para Pesquisa em Produtos Têxtis e Plásticos (TITK) testou uma tecnologia no âmbito de um projeto de pesquisa e desenvolvimento financiado pelo Ministério Federal Alemão de Economia e Energia (Bundesministerium für Wirtschaft und Energie – BMWi), a qual possibilitou a confecção de diferentes estruturas superficiais periódicas durante a moldagem por injeção de silicones líquidos bicomponentes. Esta classe de polímeros frequentemente desempenha papel importante nas aplicações e implantes médicos.
Fig. 1 – Estruturas superficiais periódicas testadas e parâmetros característicos das ferramentas utilizadas para confeccioná-las. AR = Razão de aspecto (TIKT; gráfico: Hanser)
Estruturas colunares periódicas
Neste estudo foram utilizadas chapas metálicas estruturadas (calços) ou insertos para moldagem por injeção feitos de níquel. Eles, com estrutura negativa a ser reproduzida posteriormente sobre a superfície do polímero, foram confeccionados pela Temicon GmbH (Alemanha). Essas ferramentas, micro a nanoestruturadas, foram produzidas por gravura a plasma e/ou processos litográficos. Foram sistematicamente testadas estruturas colunares cada vez menores para modificar a superfície (figura 1).
Todos os ensaios de moldagem foram realizados usando controle isotérmico de temperatura (resina a 25 °C na unidade de injeção e molde a 140-160 °C) em uma injetora totalmente elétrica (modelo Eco Power 180/350, fabricada pela Wittmann Battenfeld GmbH, situada na Alemanha), a qual era equipada com uma prensa de tambor para borracha líquida de silicone para a fabricação de “pailkits” – kit contendo recipiente de silicone e outro com seu catalisador – de 20 kg, com grau SilcoStar 902E, fabricado pela 2 Komponenten Maschinenbau GmbH (Alemanha).
No ferramental com borda de mergulho, previamente submetido a vácuo (aproximadamente 500 mbar), a correspondente ferramenta para estruturação ficava posicionada perpendicularmente à direção da injeção (bocal de injeção em forma de filme). Os componentes foram desmoldados manualmente após um período de cinco minutos de vulcanização no molde.
A análise feita ao microscópio óptico tridimensional digital e usando imagens obtidas por microscopia eletrônica de varredura confirmou que as topografias superficiais refinadas das ferramentas de estruturação foram impressas sobre a superfície do polímero até um diâmetro de furo igual a 0,7 μm (correspondente ao diâmetro D das pontas das colunas Spresentes na superfície do silicone) (figura 2). Essa estrutura, com um passo P entre as colunas aproximadamente igual a 1,5 μm, foi obtida de forma ampla, com alta precisão e efeito de profundidade pronunciado (efetivamente reproduzido e mantendo razão de aspecto de cerca de 2,5).
Quando a qualidade da estruturação diminui
Foi observada tendência de modificação da qualidade de impressão sob razão de aspecto de 2,5, tanto com redução do tamanho das estruturas colunares (estrutura 4-N: diâmetro do furo DS igual a 0,33 e P igual a 0,55 μm) quanto com a redução da dureza do silicone, com todas as outras condições constantes (tabela 1).
As minúsculas cavidades dos moldes não são preenchidas pelo material ou as colunas “se colam” após a desmoldagem, obtendo-se
Fig. 2 – Os exemplos selecionados de micrografias obtidas por microscopia eletrônica de varredura sobre as superfícies de polímeros mostram estruturas periódicas, sendo “a” e “b”: estrutura colunar (2-M); e “c”: estrutura inversa (5-N-i). (TIKT; gráfico: Hanser)
Fig. 3 – Efeito de surgimento de cores sobre a superfície polimérica estruturada, em comparação com o observado em uma amostra sem estruturação superficial feita com o mesmo material (TITK)
estruturas incompletas e/ou defeituosas. Também foi testada uma estrutura inversa (estrutura 5-N-i) para efetuar uma comparação. Ela poderia ser reproduzida com grande precisão, apesar da sua alta razão de aspecto, igual a 2,7 (figura 2).
Foi testada ainda outra estrutura em escala nanométrica, a assim chamada estrutura de “olho-de-traça” (estrutura 6-AR) (figura 1).
Ela apresentou razão de aspecto menor em relação às outras estruturas e também pôde ser reproduzida com alta precisão na superfície do material. Este tipo de estrutura tem se mostrado útil em aplicações ópticas, entre outras, para aumentar a transmitância de luz dentro da região do espectro da luz visível (4).
Características das superfícies estruturadas
A estruturação refinada em escala micro ou nanométrica das superfícies de silicone assim modificadas não é visível a olho nu.
Somente o surgimento de cores na luz refletida sugere a presença de estruturação (figura 3). Uma primeira avaliação quantitativa bem-sucedida da funcionalidade das estruturas reproduzidas foi feita ao ser observado o comportamento de molhamento da superfície (analisador de formato de gota, modelo DAS 100, fabricado pela Krüss GmbH, na Alemanha) (tabela 2).
Dessa forma foi mostrado, entre outras coisas, que o comportamento de molhamento das superfícies funcionais confeccionadas mudou significativamente em comparação com a superfície lisa do mesmo material.
Dessa forma, sobretudo as interações dispersas (σdispers) diminuíram significativamente devido
Fig. 4 – Teste para verificar a presença de biofilme com Staphylococcus aureus sobre borracha de silicone líquido LSR 346 após coloração vital com MTT e adição de i-propanol (TITK)
Legenda: ++ (muito bom); + (bom, mas com falhas isoladas); o (ainda insatisfatório, com falhas sistemáticas); – (insatisfatório). Não foi possível examinar usando microscopia eletrônica de varredura devido à presença de filme de óleo. A análise por microscopia óptica não permitiu uma avaliação clara.
à presença das estruturas colunares com alta razão de aspecto, razão pela qual o molhamento geral diminui ou o ângulo de contato com a água aumenta acentuadamente. As superfícies assim estruturadas (estruturas 1-M a 3-M) exibiram um comportamento super-repelente ao apresentar ângulo de contato com a água de até 150 °.
Entretanto, ao comparar todas as estruturas confeccionadas, pôde-se observar que o ângulo de contato, tanto da estrutura inversa (estrutura 5-N-i), igual a 117 ° ±2 °, como da estrutura em forma de olho-de-traça (estrutura 6-AR), com 108 ° ±3 °, era novamente muito semelhante ao da superfície do material não-estruturado (112 ° ±1 °). Portanto, essas superfícies apresentam comportamento hidrorrepelente inferior, que, no entanto, ainda é semelhante ao do teflon, ao menos fisicamente (tabela 2).
O teflon apresenta um dos maiores ângulos de contato entre a água e uma superfície lisa (5).
Foi percebido que os materiais de silicone estruturados são, de maneira geral, relativamente robustos, enquanto superfícies feitas de polipropileno e apresentando estruturação comparável (6), ou estruturas super hidrofóbicas obtidas pela aplicação de nanopartículas sobre superfícies (7), reagem de forma altamente sensível às cargas mecânicas. Essa é uma vantagem essencial para a aplicação.
Ensaio padronizável para os biofilmes
Há numerosas publicações científicas sobre investigações com biofilmes, mas não há testes normatizados ou procedimentos padronizados nessa área, de modo que os resultados geralmente não são comparáveis. Assim, o TITK desenvolveu um método simples, robusto e padronizável para testar a formação de biofilme em superfícies plásticas.
Fig. 5 – Efeito de repelência a biofilme verificado em graus selecionados de silicone (amostra 1 = estrutura 3-M; amostra 2 = estrutura 5-N-i) sob condições de incubação estáticas e dinâmicas, com teflon sendo usado como controle negativo (NK) e um polímero especial antibacteriano contendo prata como controle positivo (PK) (TITK; gráfico: Hanser)
Isso permite que a supressão da adesão de bactérias às superfícies plásticas seja avaliada e comparada de forma quase quantitativa para diferentes plásticos. A identificação dos germes a serem empregados em aplicações desse tipo, concentrações de meios e condições de incubação adequados, e também a definição dos controles adequados (positivos e negativos) para validar o teste, são um grande desafio Como nenhum dos materiais testados e comercialmente disponíveis mostrou-se adequado como material de controle positivo (PK), foi necessário desenvolver um material de controle próprio.
Uma combinação de materiais, constituída de uma poliamida especial e um aditivo antibacteriano especialmente desenvolvido pelo TITK (8), finalmente tornou possível definir um material adequado para uso como controle positivo, o qual apresenta nenhuma ou somente uma formação extremamente baixa de biofilmes sob condições de ensaio. Foi usado o corante azul de tiazolila (conhecido pela abreviação MTT – brometo de 3-(4,5-dimetiltiazolila)-2,5-difeniltetrazólio) –, cuja cor é alterada de amarelo para azul roxo por células vivas, para detectar o biofilme (figura 4).
Uma vez definido o ensaio dessa forma, todas as amostras de material com superfície estruturada foram testadas. Foi demonstrado que, usando o exemplo da borracha de silicone líquido LSR 2060 (fabricada pela Momentive Performance Materials Inc.), quanto mais refinadas as estruturas superficiais, mais difícil se tornou o estabelecimento de um biofilme.
No caso da estrutura inversa que também foi testada (estrutura 4-N-i), foi observado um efeito com aproximadamente a mesma intensidade ao usar a estrutura colunar com o maior grau possível
Legenda: σ = tensão superficial; σdispers = fração dispersa de σ; σ polar = fração polarizada de σ.
de refino que podia ser reproduzido (estrutura 3-M) (figura 5). A estrutura de olhos-de-traça (estrutura colunar com razão de aspecto inferior), a qual também foi testada neste estudo, não levou por si só a uma redução pronunciada da formação do biofilme. Por outro lado, em combinação com o silicone autolubrificante grau LSR 4655SL (Momentive), foi demonstrada a ocorrência de um efeito de repelência igualmente intenso ao biofilme. De forma geral, o efeito da estruturação é mais pronunciado sob condições dinâmicas do que estáticas.
Conclusão
Os resultados obtidos neste estudo mostraram que é possível estruturar a superfície de silicone usando ferramentas apropriadas, com precisão de aproximadamente 0,5 μm, no processo de moldagem por injeção, podendo ser obtidas nesse processo propriedades superficiais desde repelentes a super-repelentes. Em relação ao objetivo de evitar a formação de biofilme, consegue-se melhor efeito ao aumentar o grau de refino das estruturas. Entretanto, a combinação de estruturas com o maior grau de refino possível e um grau de silicone autolubrificante e biocompatível também se mostrou uma abordagem particularmente promissora. As estruturas aplicadas às superfícies dos materiais são adequadas, entre outras coisas, para sistemas ópticos e microfluídicos, mas também para alterar as propriedades interfaciais de peças plásticas com relação à sua bioaderência. O método de teste microbiológico estabelecido para a avaliação de bioaderência em superfícies plásticas também pode ser usado para a avaliação e comparação de superfícies feitas de diferentes materiais em futuros estudos.
Agradecimentos
Os autores agradecem ao Ministério Federal Alemão de Economia e Energia (Bundesministerium für Wirtschaft und Energie – BMWi) pelo patrocínio deste projeto, que recebeu o número de registro MF 150188.
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS
As referências bibliográficas relativas a este artigo podem ser encontradas no seguinte endereço da Internet: www.kunststoffe.de/2020-04
Mais Artigos PI
Para aumentar a utilização atualmente limitada de bioplásticos e biocompósitos em produtos de longa duração, é necessário gerar informações suficientes sobre a sua durabilidade a longo prazo. A Universidade de Kassel, dentro do âmbito do projeto BeBio2, está criando uma base de dados sobre esse tema, em conjunto com vários institutos e mais de cinquenta parceiros industriais. O trabalho emprega análises das propriedades para produtos de consumo e industriais e tem por objetivo garantir transparência e aumentar a aceitação dos biopolímeros por parte da indústria de transformação.
24/10/2024
Os aditivos são essenciais para o processamento do poli(cloreto de vinila) e outras resinas. Eles tornam os processos mais eficientes e evitam danos aos polímeros. Um bom exemplo são os agentes deslizantes ou lubrificantes. Contudo, a seleção do aditivo apropriado deve ser precisamente compatível com o polímero. O parâmetro de solubilidade de Hildebrand já provou ser útil para esse fim. Agora, pela primeira vez, seus valores estão disponíveis para muitos agentes deslizantes comuns. Este artigo dá continuidade à análise publicada na edição de fevereiro/março 2024, que tratou da compatibilidade dos aditivos plastificantes.
24/10/2024
Dentre as alternativas sustentáveis aos plásticos fósseis convencionais destacam-se os bioplásticos biodegradáveis, tais como o amido termoplástico (TPS) que, em blendas com o poli(butileno adipato co-tereftalato) (PBAT), pode ter suas propriedades melhoradas. O objetivo deste trabalho é avaliar a estabilidade térmica e o comportamento reológico do TPS, PBAT (ecoflex®) e de suas blendas LC50 (50%TPS+50%PBAT) e LC30 (30%TPS+70%PBAT) por meio de análises de TGA e DSC, pelo comportamento reológico durante o processamento em um misturador e pelo índice de fluidez (IF) no estado fundido. A incorporação do TPS ao PBAT nas duas blendas proporcionou melhor estabilidade térmica do PBAT, uma vez que sua decomposição teve início em um ponto 10oC acima. A blenda LC50 apresentou IF compatível com outros materiais utilizados em aplicações flexíveis. O TPS se mostra benéfico para formulações com o PBAT, já que promove redução de custos, aumento do teor de carbono renovável e melhoria da estabilidade térmica.
26/09/2024