Hans-Josef Endres, Finn Jürgens, Christoph Habermann, Sebastian Spierling, Hannah Behnsen e' Christian Schulz
Data: 26/03/2017
Edição: PI Fevereiro 2017 - Ano 19 - No 222
Compartilhe:Para conduzir a discussão sobre os bioplásticos, em primeiro lugar é necessário dispor de informações comprováveis e robustas para uma clara aplicação da terminologia. Plásticos com origem biológica não são um novo tipo de material, mas somente novos tipos de materiais poliméricos dentro da antiga classe dos materiais sintéticos. Antes da disseminação dos plásticos sintetizados a partir do petróleo, por conta da industrialização e da farta disponibilidade de matérias-primas petroquímicas, já existiam os primeiros plásticos com origem biológica. Eles são obtidos a partir de materiais naturais, como a celulose (celulose regenerada ou derivados de celulose), proteína (caseína), óleos vegetais (linóleo) ou borracha. Desde meados do último século esses plásticos de origem natural foram quase totalmente substituídos pelos materiais sintéticos de origem petroquímica. Atualmente apenas alguns poucos plásticos naturais da assim chamada “Velha Economia” ainda se encontram no mercado como, por exemplo, o acetato de celulose.
Nesse meio tempo, os plásticos à base de biomassa experimentaram uma renascença, particularmente em razão das demandas ecológicas tendo em vista a limitação dos recursos petroquímicos, bem como eventuais novos tipos de perfis de propriedades. Esse retorno está associado a uma crescente conscientização por parte da opinião pública, da classe política, da indústria e também do setor de pesquisa e desenvolvimento. Os assim chamados plásticos à base de biomassa da “Nova Economia”, desenvolvidos ao longo das últimas décadas, podem ser subdivididos em dois grupos principais básicos: os que apresentam novas estruturas químicas, ou seja, polímeros que até poucos anos atrás não eram conhecidos do ponto de vista químico, e dos assim chamados “penetras”, plásticos com origem parcial ou totalmente biológica que apresentam estrutura química similar à de resinas já conhecidas há muito tempo e que possuem características de utilização e processamento similares (por exemplo, PET ou polietileno com origem natural) (figura 1).
A melhor definição geral atual para o conceito de bioplástico afirma que se trata de material polimérico, o qual apresenta pelo menos uma de duas características, como ter origem natural e/ou apresentar degradabilidade biológica (figura 2).
Portanto, há os seguintes grupos básicos de bioplásticos ou biopolímeros:
A degradabilidade depende exclusivamente da microestrutura química e física, e não é influenciada pela origem das matérias-primas utilizadas ou do processo de síntese do polímero. A partir daí também é possível que matérias-primas tanto biológicas como petroquímicas deem origem a polímeros biologicamente degradáveis. Portanto, para se evitar confusões com os bioplásticos, é importante se referir precisamente a materiais poliméricos degradáveis ou com origem biológica. Por degradabilidade se entende uma característica (descarte) do final do ciclo de vida, independentemente da fonte da matéria-prima, enquanto a designação “com origem biológica” se refere exclusivamente à matéria-prima ou insumo usado na síntese do polímero e que não permite qualquer afirmação sobre sua degradabilidade.
O volume global do mercado atual de todos os bioplásticos em todo o mundo, ou seja, considerando conjuntamente a “Nova” e a “Velha Economia”, é da ordem de 18,3 milhões de toneladas por ano (figura 3, lado esquerdo). Ou seja, considerando que todo o mercado global de plásticos é de quase 300 milhões de toneladas por ano, a fração correspondente aos bioplásticos é de apenas cerca de 6%. Se forem acrescentadas as fibras naturais vegetais (por exemplo, algodão, juta, linho, kenaf e sisal) e animais (lã e seda) à capacidade de produção dos bioplásticos (uma vez que na quantidade total foram incluídos tanto os plásticos convencionais como as fibras poliméricas sintéticas), obtém-se que a quantidade de bioplásticos usados na “Velha” e na “Nova Economia”, incluindo as fibras naturais, é um pouco maior do que 50 milhões de toneladas por ano (figura 3, lado direito). De forma semelhante ao que ocorre nos plásticos convencionais, também no caso dos bioplásticos há uma relação básica inversamente proporcional entre a quantidade produzida e o preço. A figura 4 mostra os bioplásticos da “Nova Economia” disponíveis no mercado em 2013, subdivididos conforme a capacidade produtiva e a amplitude da faixa de preços, de acordo com a classe de polímero.
Também é possível definir um grupo adicional de biomateriais: os biomateriais compósitos(1,2).
A atual preocupação com as mudanças climáticas fez com que a avaliação ecológica dos bioplásticos e biomateriais compósitos se tornasse vital, particularmente em termos de seu potencial para a geração dos gases que promovem o efeito estufa ou para a redução da quantidade de gás carbônico presente na atmosfera. Contudo, para permitir uma análise global dos efeitos dos materiais sobre o meio ambiente, além da avaliação do potencial relativo aos gases geradores do efeito estufa, também é necessário levar em consideração o consumo de recursos abióticos e o potencial de acidificação e eutrofização.
Deve-se considerar que, de forma global, a disponibilidade geral de dados sobre parâmetros ecológicos relativos aos bioplásticos e compósitos bioplásticos ainda é muito escassa. O número de publicações relativas a esse tema tem crescido significativamente nos últimos anos, o que permite afirmar que, no futuro, a comparação com os plásticos já consagrados será feita usando dados com maior fundamentação.
A figura 5 proporciona uma visão geral dos efeitos sobre o meio ambiente de diversos materiais compósitos convencionais e biomateriais compósitos com matriz constituída de polipropileno (PP) baseado em petróleo, em comparação com o PP puro. Foram examinados como agentes de reforço, além da fibra de vidro e talco, fibras naturais de cânhamo e de madeira. Os resultados apresentados representam o capítulo do ciclo de vida “Do Berço até a Porta da Fábrica” (fase de fabricação) e se referem a um quilo de material. As diferentes propriedades dos vários materiais não foram consideradas nesta análise.
Do ponto de vista do balanço dos gases que promovem o efeito estufa, a absorção de gás carbônico biogênico durante a fotossíntese associada aos biomateriais compósitos é considerada como um sorvedouro de gás carbônico na fase do surgimento. Conforme já foi discutido em outras referências bibliográficas (3) , no conceito de “do berço ao portão” o gás carbônico fixado deve ser inicialmente considerado como sorvido, uma vez que, ao final do ciclo de vida do material, ele será novamente liberado. Portanto, ele foi incorporado ao balanço. Em comparação com o PP puro, os biomateriais compósitos apresentam vantagens, particularmente em termos do potencial para geração de gases causadores de efeito estufa e do consumo de recursos abióticos. Por outro lado, conforme o tipo de fibra natural, ocorrem desvantagens em outras categorias de efeitos como, por exemplo, no potencial de eutrofização, de acidificação ou de degradação do ozônio. A principal razão para isso está associada ao cultivo agrícola das matérias-primas renováveis em comparação direta com as matérias-primas fósseis. Ainda assim, em comparação com outros materiais compósitos convencionais como, por exemplo, plásticos reforçados com fibras de vidro, os biomateriais compósitos apresentam vantagens ecológicas, tomando como base um quilo de material.
Ao passo que o biomaterial compósito na forma de produto intermediário (um quilograma de material) apresenta as vantagens e desvantagens mencionadas acima, no plano do produto seu veredito pode ser tanto no sentido positivo como no negativo. Uma vez que a análise para um produto deve ser feita ao longo de todo o ciclo de vida (“do berço até o túmulo”), devese incluir, além da fase de fabricação, também as fases de utilização e de descarte. Por exemplo, na área de embalagens geralmente os efeitos ecológicos das fases de produção e de descarte dominam o ciclo de vida, enquanto os da fase de utilização apresentam pouca relevância (com exceção das embalagens retornáveis); por outro lado, Fig.na área automotiva se observa exatamente o contrário. Aqui a fase de utilização constitui o fator dominante, representando, por exemplo, 80% do potencial para geração de gases que promovem o efeito estufa durante seu ciclo de vida(4).
A seguir serão consideradas as diferentes propriedades dos materiais no plano dos produtos. Por exemplo, o emprego de biomateriais compósitos por conta de suas propriedades mecânicas mais elevadas permite a fabricação de componentes com paredes mais finas e mais leves que atendem ao mesmo objetivo original.
Nos exemplos já citados foi usado um plástico convencional como PP para constituir a matriz. Além disso, também é possível o uso de um bioplástico como matriz. Também aqui surge a questão: até que ponto o uso do bioplástico como substituto para uma matriz constituída por um plástico obtido a partir do petróleo é ecologicamente mais vantajoso?
Para conseguir uma avaliação básica sobre a magnitude da influência da produção dos biomateriais sobre o aproveitamento das áreas superficiais de terra podese determinar, por exemplo, com base no método de Carbono 14, a fração de carbono proveniente de biomassa que um material contém e, por conta de sua produção, percorrer as trilhas de conversão química (taxa média de transformação do rendimento por hectare das respectivas matérias-primas empregadas) e determinar o fator de aproveitamento da área superficial de terra para cada material isolado. A partir desse fator e da capacidade de produção conhecida do fabricante de bioplásticos temse o valor correspondente de área superficial de terra necessária para a fabricação de um quilo de bioplástico. A figura 6 mostra, como exemplo, as taxas de produção e trilhas de conversão do PLA e PHA a partir do milho (amido) até o bioplástico.
Para iniciar as discussões e oferecer uma base de dados adequada para alcançar esse objetivo, rotas de processo adicionais para quase todos os bioplásticos foram disponibilizadas no site http:// downloads.ifbb-hannover.de. A partir dessas reflexões e cálculos transparentes foi demonstrado que, no ano de 2013, foi necessária uma superfície de aproximadamente 600.000 hectares em todo o mundo para que fosse plenamente ocupada toda a capacidade dos equipamentos existentes para a produção de bioplásticos. No ano de 2018 essa superfície teria de crescer até cerca de 1,3 milhão de hectares, desde que fossem cumpridos os anúncios dos fabricantes sobre a expansão de sua produção (figura 7).
Em termos da capacidade produtiva, particularmente o BioPET e o PLA, bem como misturas de amido, possuem um papel significativo. Com relação ao aproveitamento da área superficial de terra, é necessário mencionar o caso da poliamida sintetizada à base de biomassa, uma vez que, em função de seu baixo grau de aproveitamento da área, é necessária uma superfície relativamente ampla para a produção da quantidade requerida de matéria-prima (que, atualmente, se compõe principalmente de óleo de rícino). Em contraposição aos óleos vegetais, o açúcar ou amido, por exemplo, apresentam rendimento de matéria-prima significativamente maior.
Em comparação com a superfície atual de cinco bilhões de hectares que se faz necessária para o cultivo de alimentos e forragem, a superfície requerida para a produção dos novos tipos de bioplásticos é muitas vezes menor e atualmente representa apenas em torno de 0,01% da superfície de terra utilizada na agricultura (figura 8).
Pode-se concluir, de forma geral, que os materiais poliméricos à base de biomassa, conforme seu campo de aplicação, podem contribuir positivamente contra as alterações climáticas. Contudo, para avaliar se o uso de bioplásticos é significativo do ponto de vista ecológico, caso a caso, é frequentemente necessário considerar um produto específico, e da forma mais abrangente possível ao longo de todo o curso de sua vida. Os axiomas que estabelecem que os bioplásticos, por si só, são amigáveis ecologicamente, ou os que pregam o contrário, considerando os bioplásticos ainda piores do ponto de vista ecológico do que os plásticos convencionais, não podem ser aceitos incondicionalmente.
A lista das referências bibliográficas deste trabalho pode ser encontrada no seguinte endereço da internet: www.kunststoffe.de/1040115.