Dirk Biermann & Marko Kirschner
Data: 29/08/2017
Edição: PI Agosto 2017 - Ano - 19 No 228
Compartilhe:O plástico vem ganhando importância cada vez maior em diversos ramos industriar como, por exemplo, nos segmentos automotivo e aeronáutico, bem como no manuseio de materiais, devido às suas características vantajosas para muitas aplicações. Além de seu baixo peso específico, os plásticos possuem temperaturas de fusão muito baixas e podem, portanto, ser processados de maneira substancialmente mais eficiente do ponto de vista energético em comparação com os aços, por exemplo. As propriedades dos plásticos podem ser intencionalmente alteradas durante seu processo de fabricação pela incorporação de aditivos e cargas apropriados.
Ao contrário das resinas termofixas, as termoplásticas, por conta das ligações lineares e ramificadas de suas macromoléculas, e de sua temperatura de degradação estar acima da de fusão, possuem a vantagem de apresentar a possibilidade de reversibilidade e reaproveitamento. A fabricação de muitos produtos feitos com resinas termoplásticas como, por exemplo, elementos mecânicos ou dispositivos para fixação, ocorre por meio de processos de moldagem(1,2). Contudo, quando há requisitos elevados em termos da qualidade superficial, bem como tolerâncias severas de dimensões e de formato, a fabricação por usinagem frequentemente é a melhor escolha, devido à evolução não homogênea da distorção decorrente dos outros processos de manufatura. Além disso, os processos de fabricação por usinagem são mais flexíveis e econômicos nas aplicações em que os componentes são produzidos em pequenos lotes.
No passado a usinagem das resinas termoplásticas era pouco considerada em termos científicos; por esse motivo, hoje ela oferece um grande potencial para otimização, particularmente no caso de processos de furação e de fresamento. Atualmente estão sendo desenvolvidos projetos de pesquisa sobre a furação profunda de resinas termoplásticas no Instituto para Fabricação por Usinagem da Universidade Técnica de Dortmund (Institut für Spanende Fertigung ISF der TU Dortmund), na Alemanha, os quais estão sendo financiados pela Associação Alemã para Pesquisa (Deutsche Forchungsgemeinschaft, DFG).
Um exemplo clássico da aplicação industrial da furação profunda de resinas termoplásticas são as roscas sem fim para alimentação, dosagem e transporte usadas no deslocamento de cargas durante seu armazenamento. As roscas de plástico estão assentadas sobre um furo central e oferecem vantagens claras em comparação com as feitas de metal. Entre elas se encontram operação silenciosa, peso consideravelmente menor, vida útil mais longa e as características excepcionais de deslizamento devido à sua alta qualidade superficial, as quais protegem as cargas que estão sendo transportadas(3).
No procedimento experimental deste projeto foram utilizadas muitas resinas termoplásticas semicristalinas – polietileno de ultraalto peso molecular (PEUAPM) polimerizado sob baixa pressão, copolímero de poliacetal (POM-C) e poli(éter-éter-cetona) (PEEK), bem como o poli(tereftalato de etileno) (PET) amorfo (tabela 1).
O processo de furação profunda deve atender a requisitos específicos em função das baixas temperaturas de fusão, da tendência à absorção de água e do valor eventualmente muito alto do alongamento total das resinas.
Este estudo sobre a furação profunda com broca-canhão tomou como exemplo uma broca com diâmetro ‘d’ igual a 12,0 mm e razão comprimento/diâmetro (L/D) igual a 30. Foi usado um centro de furação profunda e fresamento, modelo TLF1004 (fabricado pela Ixion GmbH + Co KG, de Hamburgo, Alemanha). O processo ocorreu por meio do emprego de uma bucha para pré-furação com ferramenta rotativa, mantendo a peça sob processamento fixa. A ferramenta usada no ensaio, com cabeçote de furação brasado, apresentava ponta padronizada (KIS igual a 110°, KAS igual a 60°) e seu comprimento total IWzg foi igual a 700 mm.
A ferramenta foi apoiada através de uma luneta para neutralizar a flexão decorrente de seu longo comprimento. O espectro de solicitações térmicas atuantes sobre a peça sob usinagem foi registrado bilateralmente, nas três posições axiais do corpo de prova, a uma distância ‘s’ igual a 0,2 mm em relação à parede do furo, usando termopares (figura 1). Para garantir uma curta permanência do espectro de solicitações térmicas sobre a peça sob usinagem e uma remoção segura dos cavacos, foi providenciado um suprimento contínuo de óleo para furação profunda com viscosidade ν igual a 10 mm2/s, o qual foi mantido sob pressão pKSS igual a 60 bar.
O ensaio incluiu, numa primeira etapa, uma análise do efeito dos parâmetros de corte com o objetivo de verificar como a velocidade de corte (vcigual a 20, ..., 100 m/ cmin) e avanço (‘f ’ igual a 0,01, ..., 0,1 mm) influenciava o espectro de solicitações térmicas, a formação de cavacos e a qualidade do furo. Um gráfico mostra as máximas temperaturas medidas sobre a parede do furo durante a execução do processo para as diferentes resinas termoplásticas aqui estudadas (POMC, PET, PEUAPM e PEEK) em função dos parâmetros de corte aplicados (figura 2).
As temperaturas máximas da peça sob furação mostraram-se independentes do grau de cristalinidade e dos parâmetros de corte aplicados, com TB,maxque sempre menor 40 °C – ou seja, significativamente abaixo das temperaturas críticas de fusão. Não foram constatadas diferenças claras entre os valores medidos de temperatura máxima para as várias resinas termoplásticas aqui testadas. Do ponto de vista da influência dos parâmetros de corte sobre o espectro de solicitações térmicas foi constatada a mesma tendência para as quatro diferentes resinas termoplásticas: maiores valores de avanço da furação, ‘f ’ igual a 0,1 mm, estiveram associados a temperaturas mais baixas, em função dos menores tempos de contato locais. Além disso, uma elevação da velocidade de corte levou a um aumento dos valores medidos de temperatura s máximas sobre a parede do furo.
Complementando esses resultados, foram coletadas amostras dos cavacos gerados pelos ensaios, os quais foram detalhadamente caracterizados. Uma análise dos formatos de cavaco gerados sob os parâmetros de corte v igual a 100 m/ cmin e ‘f ’ igual a 0,1 mm durante a furação usando broca-canhão de POM-C, PET, PEUAPM e PEEK permitiu determinar influências uniformes dos parâmetros de corte para todas as resinas termoplásticas submetidas à furação profunda (figura 3). Uma elevação da velocidade de corte e/ou do avanço favoreceu o surgimento de cavacos mais curtos, enquanto maiores avanços também elevaram a espessura dos cavacos.
A morfologia do formato do cavaco está associada com o valor do alongamento total da resina termoplástica usinada. O valor extremamente alto do alongamento total do PEUAPM leva a um cavaco com formato irregular, similar a um filme. Por sua vez, na furação profunda do PET, que apresenta valor mínimo de alongamento total, o cavaco assume formato espiral.
Para efetuar uma análise mais detalhada sobre a formação dos cavacos, é necessário considerar, ao contrário da teoria convencional da usinagem de aço, que o cavaco surge ao longo de todo o comprimento de corte(4,5). O perfil de corte, incluindo o trajeto da ponta de corte sobre o lado superior do cavaco, é particularmente bem caracterizado no caso da furação profunda do PET. A largura do cavaco na região do corte interno e externo corresponde a aproximadamente um quarto do diâmetro da ferramenta empregada. Na furação com broca-canhão de resinas termoplásticas, ao empregar uma ponta de broca padronizada com lubrificação por inundação e os parâmetros de corte aqui selecionados, não ocorreu divisão do cavaco na região da ponta de corte.
Pesquisas adicionais tiveram como tema a influência das resinas termoplásticas sobre a qualidade do furo. Aqui foram medidas as tolerâncias dimensionais e de formato, bem como a qualidade superficial medida de forma tátil em função das diferentes resinas termoplásticas aqui selecionadas, para uma velocidade de corte vc igual a 100 m/min e avanço ‘f ’ de 0,1 mm (figura 4).
De forma geral, as resinas plásticas requerem maiores tolerâncias dimensionais e de formato na manufatura por usinagem do que os materiais metálicos(6). Esta previsão foi confirmada aqui quando se compararam os valores de referência para tolerâncias alcançáveis para furos confeccionados com broca-canhão, conforme a instrução VDI 3208, com os desvios medidos neste trabalho(7).
Do ponto de vista da precisão desejada para o diâmetro e circularidade, bem como para a qualidade superficial, o PEUAPM, resina termoplástica semicristalina, apresentou os piores valores característicos. Isso decorre de seus altos valores de alongamento total e de ductilidade, que se traduzem em piores características de fratura dos cavacos.
Além disso, a baixa resistência mecânica e dureza do PEUAPM restringiram o apoio da broca-canhão aos elementos atuantes sobre a periferia da ferramenta. As forças normais resultantes da força de corte e passiva no fluxo interno de força foram transferidas ao longo das guias laterais sobre a parede do furo e favoreceram a estabilização do cabeçote de furação, bem como o alisamento dos picos de rugosidade e defeitos superficiais. O comportamento limitado da estabilidade durante a furação profunda do PEUAPM explica a baixa qualidade dos furos.
As solicitações térmicas sobre a peça sob usinagem durante a furação com broca-canhão de plásticos de engenharia podem ser mantidas significativamente abaixo das temperaturas críticas de degradação e de fusão. O emprego da lubrificação por inundação com suprimento de óleo para furação profunda sob alta pressão diminui a temperatura na região da parede do furo. Os parâmetros de corte não exercem nenhuma influência significativa sobre o espectro de solicitações térmicas.
Durante a usinagem com óleo para furação profunda não pôde ser observada nenhuma tendência ao inchamento que diversas resinas apresentam quando usinadas sob uso de emulsão, em função de sua tendência à absorção de água.
O formato do cavaco apresentou forte relação com as propriedades dos termoplásticos selecionados. Não ocorreu divisão dos cavacos na região da ponta de corte ao utilizar a ponta padronizada convencional da ferramenta, mas os cavacos produzidos puderam ser removidos de forma consistente.
Do ponto de vista da qualidade resultante do furo, verificouse para todas as resinas termoplásticas que ocorreram elevados desvios do eixo real do furo em relação ao ideal. Portanto, o foco dos próximos trabalhos se manterá na análise da influência da configuração da ferramenta sobre os resultados da usinagem. Serão variados os formatos do perímetro e as pontas de corte nos ensaios a serem executados. Além disso, a influência dos conceitos de refrigeração e lubrificação será considerada com maior detalhamento, devendo ser testado o emprego de mínima quantidade de lubrificante na furação com brocacanhão de resinas termoplásticas.
Os autores agradecem à Associação Alemã para Pesquisa (Deutsche Forchungsgemeinschaft, DFG) pelo seu apoio ao projeto “Pesquisas Básicas para a Otimização da Qualidade dos Furos Confeccionados com BrocaCanhão em Polímeros Termoplásticos por meio da Adequação da Configuração da Ferramenta” (código BI 498/53).
As referências bibliográficas deste artigo podem ser encontradas no seguinte endereço da internet: www.kunststoffe.de/1229746.