C. Kitzberger
Data: 18-04-2019
Edição: PI Março 2019 - Ano 21 - No 247
Compartilhe:Materiais reciclados provenientes de rejeitos industriais já são usados como matéria-prima secundária em diversas linhas de produção. Há muito tempo a reciclagem de garrafas de PET se consolidou no setor de pós-consumo, mesmo em aplicações envolvendo contato direto com alimentos. Esse fato é atribuído aos sistemas de coleta e classificação desses materiais, os quais funcionam de forma eficiente em muitas regiões. Contudo, excluindo-se o caso das garrafas de PET, o potencial dos demais rejeitos pós-consumo ainda está por ser explorado. Isso se deve a diversos fatores, tais como a qualidade do material obtido.
Melhorias contínuas na triagem, lavagem e reciclagem mecânica de polímeros contribuíram para aumentar a qualidade do material reciclado a partir dos rejeitos pós-consumo. Contudo, substâncias que causam odores desagradáveis não podem ser removidas por esses processos e pela atual tecnologia de extrusão. A interação da extrusora Intarema TVEplus com a tecnologia ReFresher, no entanto, permitiu remover uma fração considerável dessas substâncias com forte odor. Enquanto, em princípio, o sistema de extrusão cuida das substâncias altamente voláteis com baixo peso molecular, o processo ReFresher remove as pouco voláteis com alto peso molecular (figura 1).
Um problema típico dos plásticos pós-consumo provenientes de depósitos de lixo é o odor de, por exemplo, alimentos, cosméticos e produtos de limpeza que foram acondicionados pelas embalagens. As substâncias com alto peso molecular que migraram para o plástico possuem odores particularmente persistentes que não podem ser removidos, mesmo que parcialmente, durante a triagem e lavagem. Os geradores de odor podem ser resíduos de madeira, restos de papel (por exemplo, rótulos), tintas de impressão, óleo ou gorduras.
Nos processos convencionais, essas impurezas presentes nos plásticos podem queimar facilmente durante a extrusão, alterando-se quimicamente e, dessa forma, gerando odores que se transferem ao plástico. Isso pode ser evitado pela reciclagem mecânica dos rejeitos e, em particular, pela desgaseificação e filtração. No sistema Itarema TVEplus, desenvolvido pela Erema, o odor é reduzido pelo tempo de permanência do material no interior da unidade de précondicionamento de grande porte, que é de até uma hora. O plástico a ser reciclado é submetido a gradientes de temperatura conforme o tipo de polímero. Graças à ampla superfície ativa, as substâncias altamente voláteis e com baixo peso molecular podem sair do material, sendo removidas pelo fluxo de ar integrado (tecnologia “Airflush”) antes da extrusão.
Após esse pré-tratamento, o material seco, desgaseificado e plenamente aquecido é introduzido numa extrusora conectada de forma direta. É precisamente na área de transição entre a unidade de précondicionamento e a extrusora que a tecnologia de contracorrente mostra quão efetiva ela é. Dentro dessa unidade, o movimento giratório de um rotor em forma de disco equipado com ferramentas forma um redemoinho (fluxo em forma de rosca ao longo da parede do misturador), fazendo com que o material circule durante o processamento. Ao contrário do que ocorre em sistemas convencionais, esse redemoinho de material se move na direção oposta à da extrusora. Isso faz com que a velocidade relativa do material na zona de entrada aumente a tal ponto que a rosca passa a atuar como uma borda afiada que “corta” a massa polimérica. Esse princípio é o contrário do que se observa nos processos convencionais em que o material presente no cortador/compactador se move na direção da extrusora. As forças centrífugas desse processo são usadas para alimentar a extrusora, fazendo com que o material aquecido seja comprimido sobre sua rosca. Entretanto, a configuração tangencial inversa do sistema de contracorrente assegura que a rosca seja preenchida virtualmente, isenta de pressão, com o material pré-aquecido. Ela recebe exatamente a quantidade de material que é requerida, apresentando o nível ideal de preenchimento.
A segunda fase da desgaseificação, denominada “reversa”, ocorre no interior da extrusora, onde – graças a um projeto especial de rosca – quaisquer inclusões de gás presentes na resina fundida são enviadas à unidade de précondicionamento de lá removidas. Isso é seguido por fusão suave até a filtração. O pequeno comprimento da rosca faz com que o material seja submetido apenas a baixas tensões de cisalhamento. O tratamento suave da resina fundida sob baixa temperatura e baixas forças de cisalhamento faz com que impurezas como celulose (papel ou madeira), borracha ou silicone não queimem, o que também evita a geração de odores. As partículas de contaminantes permanecem grandes o bastante para que o filtro laser as remova, assim como pode fazê-lo com polímeros contaminantes, tais como PET, PA ou PP.
Na zona TVEplus a resina fundida é subsequentemente homogeneizada e submetida à temperatura necessária para a sua desgaseificação durante a extrusão, permitindo que quaisquer inclusões de gás remanescentes e substâncias odoríficas saiam da resina fundida na zona final de desgaseificação dupla. Após a extrusão, o odor é removido de tal forma que os grânulos reciclados obtidos já se mostram adequados para muitas aplicações. Os produtos finais são artigos extrudados ou injetados, tais como filmes poliméricos planos ou tubulares, bem como tampas.
Até o momento não era possível eliminar adequadamente os odores criados por substâncias pouco voláteis com alto peso molecular. Podem ser incorporados aditivos à extrusão tanto para amenizar odores como para capturar as moléculas responsáveis por eles. Entretanto, essa abordagem contradiz a economia circular ideal. Quando o plástico modificado for novamente reciclado, o transformador se verá diante da necessidade de usar aditivos suplementares, pois há também contaminantes que influenciarão o perfil de propriedades do plástico e poderão liberar as substâncias odoríficas previamente absorvidas quando um novo processamento for iniciado.
Ao invés disso, a Erema usa um processo termofísico para remover os odores. Nele os grânulos reciclados mornos, os quais ainda se encontram aquecidos em seu interior, passam da extrusora para um silo por meio de um sistema de esteiras, sendo, em seguida, aquecidos até a temperatura desejada para o processo.
Os grânulos são limpos com ar, responsável pela remoção dos odores. O fluxo do processo ReFresher usa o princípio de “o primeiro que entra é o primeiro que sai”. Como resultado disso, o material reciclado apresenta um espectro estreito de tempos de permanência. Após o tempo requerido pelo processo, o material reciclado entra num silo de resfriamento para obter a temperatura de armazenamento.
A abordagem circular foi uma consideração durante o desenvolvimento do projeto do sistema ReFresher. Por exemplo, o calor que é extraído durante o resfriamento final dos grânulos é repassado para o silo de processo para aquecer o material reciclado até a temperatura necessária para o seu processamento. Assim, é necessária apenas uma quantidade mínima de energia proveniente de uma fonte externa. Um exemplo de fonte de calor que pode ser usado é o vapor aquecido proveniente de uma instalação de lavagem. Uma vez que o sistema ReFresher consiste em poucas peças móveis, sua disponibilidade é alta e seus custos de manutenção são baixos.
O Instituto de Química Analítica e Química dos Alimentos da Universidade de Graz (Institut für Analytische Chemie und Lebensmittelchemie der Technischen Universität Graz), na Áustria, investigou a relação entre os compostos orgânicos voláteis (Volatile Organic Compounds, VOC) determinados pela cromatografia a gás e os compostos odoríficos provenientes de amostras de plástico reciclado. A cromatografia a gás-olfatometria, técnica em que o olfato é usado para detectar compostos odoríficos, possibilita a identificação de frações odoríficas em amostras que apresentam composição complexa. Nesse método, os compostos voláteis são separados por cromatografia gasosa, sendo então submetidos ao olfato humano. Um detector convencional em paralelo também foi usado. Ambos os “traçados gráficos” são dispostos um sobre o outro para marcar as seções odoríferas. Os testes feitos com os compostos mostraram que é possível sentir forte cheiro a despeito dos correspondentes baixos teores medidos de compostos orgânicos voláteis (figura 2a). Portanto, os odores são identificados mesmo quando não se consegue medir o teor das substâncias orgânicas voláteis, ou seja, os teores das substâncias odoríficas encontram-se abaixo do limiar de detecção do aparelho. Foi constatado que baixos teores de substâncias orgânicas voláteis apresentaram correlação com menor sensibilidade ao odor dos testadores humanos (figura 2b).
De acordo com um estudo (1), os seres humanos podem distinguir mais de um trilhão de odores. Os compostos orgânicos voláteis (Volatile Organic Compounds – VOC) representam um grupo significativo de substâncias odoríficas. O método mais comum de análise é a cromatografia gasosa, a qual determina alterações na massa molecular. Devido a seu baixo peso molecular, substâncias altamente voláteis vaporizam mais rapidamente do que as pouco voláteis com alto peso molecular, as quais somente podem ser eliminadas por meio de técnicas especiais. O limoneno, substância que apresenta leve cheiro de limão, frequentemente serve como substância indicadora.
O maior desafio com substâncias odoríficas está no fato de que o odor dos compostos orgânicos voláteis pode ser sentido pelos seres humanos mesmo em concentrações que estão muito abaixo do limiar normal de detecção de 1 ìg/m3 (2). Portanto, análises representativas requerem a combinação dos resultados da cromatografia gasosa e de painéis sensoriais. Esses painéis são constituídos por grupos de pessoas sensíveis a odores especialmente treinadas, as quais julgarão os odores. Os painéis são compostos de diferentes formas devido à diferença na percepção dos odores de acordo com a região e a cultura.
Constatou-se ainda que as amostras apresentaram alta proporção de compostos orgânicos voláteis antes da extrusão, a qual se reduziu ao longo do processamento. O odor das amostras resultou da soma de diversos compostos individuais, alguns dos quais apresentaram alto potencial de odor que pôde ser sentido sem dificuldade pelo nariz humano, apesar de se encontrarem abaixo do nível mínimo de detectabilidade de sensores tradicionais.
A Erema solicitou uma série de testes ao Instituto Fraunhofer para Engenharia de Processos e Embalagem (Fraunhofer Instituts für Verfahrentechnik und Verpackungen – IVV), onde foram analisadas substâncias orgânicas voláteis presentes no PEAD lavado que havia sido regranulado a partir de frascos de xampu – um típico material pós-consumo proveniente de depósitos de lixo. A proporção de compostos orgânicos voláteis (figura 3a) e, em particular, a substância indicadora limoneno foram analisadas por cromatografia gasosa (ver box na página 32).
O teor de limoneno do PEAD regranulado, antes da extrusão, foi igual a 73 ppm. Após permanência de uma hora na unidade de pré-condicionamento, os teores de muitos compostos orgânicos voláteis foram consideravelmente reduzidos (figura 3b). Depois da extrusão, feita pelo equipamento Intarema TVEplus RegrindPro, o valor do teor de limoneno nos grânulos reciclados foi reduzido para 20 ppm, e os teores mensuráveis de compostos orgânicos voláteis geradores de odor caíram de forma similar (figura 3c). O valor do teor de limoneno foi de 0,1 ppm após a permanência de sete horas no sistema ReFresher, enquanto os teores de outros compostos orgânicos voláteis foram ainda mais reduzidos (figura 3d).
Resíduos de madeira, papel, de borracha e silicone geram odor em plásticos reciclados ao serem queimados durante a extrusão feita em equipamentos convencionais. O sistema de extrusão TVEplus pode amenizar essa anomalia por vaporização preliminar de substâncias voláteis com baixo peso molecular na unidade de pré-condicionamento, eliminando-as ao longo do processo. A limpeza do equipamento ReFresher remove os odores provenientes de substâncias pouco voláteis com alto peso molecular, usando ar como gás de purga (figura 4). O equipamento possui versões com capacidade de produção de 600 a 4.000 kg/h, e com tempo de permanência de 7 a 32 horas. O tamanho apropriado depende do material a ser processado e dos requisitos em termos de odor referentes ao produto final.
A integração dos estágios de limpeza abre um novo mercado de vendas de grânulos reciclados a partir de plásticos de origem pós-consumo.