Por Roberta Duarte*
Nos últimos 15 dias, estamos envolvidos em uma nova e provavelmente prolongada guerra, que mudará quase tudo para a indústria petroquímica. Os responsáveis pelos planejamentos estratégicos corporativos devem, portanto, avançar na elaboração de cenários de curto, médio e longo prazo para, em seguida, aplicar esses cenários a táticas e estratégias. Porém, devido ao ritmo com que os eventos estão acontecendo, os cenários terão de ser constantemente revisados. O foco imediato é o efeito e o impacto dos preços mais altos do petróleo na demanda de petroquímicos.
Na melhor das hipóteses, o repasse dos custos extras levará um tempo considerável para ser implementado devido à velocidade do aumento do preço do petróleo, levando à queda de margens para os players da nafta.
Na pior das hipóteses, e na minha opinião, o cenário muito mais provável, a perda de demanda de uso final tornará impossível o repasse de todos os custos extras.
No curto prazo, é claro, os produtores de derivados de eteno dos Estados Unidos, Oriente Médio e Ásia terão margens melhores e o preço da resina vai subir. Porém, o maior problema à medida que essa crise mundial se desenrola é a extensão da demanda perdida e o que isso pode significar para os volumes de vendas em todas as cadeias de valor. Vários segmentos como o automobilístico e eletroeletrônico podem sofrer um grande impacto negativo.
É essencial notar que, embora alguns derivados petroquímicos possam ser feitos a partir do etano, essa é apenas uma pequena parte do bolo. Todos os derivados de aromáticos, muitos dos quais vão para aplicações de uso final duráveis, só podem ser feitos por meio de matérias-primas petroquímicas derivadas de petróleo bruto. As empresas que fabricam os derivados de aromáticos estão, portanto, enfrentando o duplo golpe do aumento dos custos das matérias-primas e da destruição da demanda.
As perspectivas para o principal derivado do eteno, o polietileno (PE), são muito mais sutis. A pandemia causou tantas distorções nos padrões de demanda de PE que é impossível dizer neste momento em que está acontecendo uma guerra sem precedentes e a pandemia ainda não está totalmente controlada, se o consumo diminuirá, aumentará ou permanecerá onde está.
Incerteza no horizonte petroquímico
Para ilustrar as incertezas em relação ao futuro da demanda, produtores de tubos de PE de alta densidade (HDPE) podem estar mais expostos à destruição da demanda em razão de um colapso no setor imobiliário, ao contrário, digamos, do produtor de filmes que utiliza PE linear de baixa densidade (LLDPE) para embalagens de alimentos.
Complicado o suficiente? Receio que, devido ao conflito de proporções mundiais, fique muito mais complexo do que isso. Devemos considerar também:
Até que ponto a produção de petroquímicos pode ser afetada na Hungria, Eslováquia, República Tcheca, Polônia e antiga Alemanha Oriental por quaisquer sanções ocidentais que venham a comprometer o oleoduto de Druzhba, da Rússia.
Neste ano de 2022, 2,79 milhões de toneladas de eteno (11% da capacidade total europeia) e 2,34 milhões de toneladas de propileno (12% da capacidade total europeia) dependem de refinarias localizadas ao longo do oleoduto Druzhba. Embora algumas fontes alternativas de petróleo possam ser acionadas, é improvável que os níveis normais de operações possam ser mantidos.
A produção europeia também pode ser afetada por qualquer interrupção no fornecimento de gás da Rússia, fonte de 40% do gás natural da Europa. A Rússia já havia cortado o fornecimento de gás para a Europa via Ucrânia em dois terços, desde janeiro deste ano.
Analisa-se que “a principal razão para o aumento do preço do petróleo é o risco de a Rússia optar ou ser forçada a reduzir suas exportações de petróleo para a Europa”. Pois a Rússia pode optar por reduzir essas exportações da mesma forma que fez com o gás, para causar dor à Europa, mas o cenário mais provável é o Ocidente aumentar as sanções à Rússia, a exemplo do recente anúncio dos Estados Unidos, quanto a não comprar mais petróleo russo. Outras nações tendem a seguir este caminho. Atualmente, a Rússia exporta cerca de 2,3 milhões de barris/dia para a Europa, mas se as sanções restringirem o acesso da Rússia aos mercados financeiros ocidentais, poderá dificultar a venda de seu petróleo no mercado aberto, já que este é vendido em dólares americanos. Isso pode reduzir as exportações de petróleo da Rússia e os preços poderão ter um aumento sustentado muito além do nível de US$ 100 - US$ 200 /barril.
A decisão da Opep de manter seu plano de 2020 para desfazer os cortes de oferta causados pela pandemia elevou ainda mais o preço do petróleo. E a organização está mantendo seu cronograma pré-invasão, de reduzir em mais 2,6 milhões de barris/dia os cortes de produção até setembro deste ano. A Opep+ e a escalada do conflito na Ucrânia significam que os cenários já elaborados para a perda de demanda resultante do aumento dos preços do petróleo terão de ser revistos.
Sanções e seus desdobramentos
O risco de uma redução nas exportações russas de petróleo é a principal razão por trás do aumento do preço do petróleo nas últimas semanas. A Rússia exporta 4,5-5 milhões de barris por dia de petróleo bruto e qualquer perda de petróleo disponível para o mercado afetará fortemente os preços.
O recente anúncio de corte da importação de petróleo pelos Estados Unidos leva à questão sobre quão eficazes serão as sanções. Se as sanções levarem a um novo aumento substancial dos preços do petróleo, a Rússia poderá ganhar em geral.
A Rússia exporta 2,5 milhões de barris/dia de petróleo para países não europeus – grande parte disso vai para compradores asiáticos, tais como Índia, Coréia do Sul, Japão e China.
As sanções ocidentais às exportações russas de petróleo se aplicam apenas a compradores ocidentais. Sendo assim, a Rússia sentirá alguma dor de curto prazo, mas provavelmente ainda poderá encontrar compradores dispostos na Ásia, já que o mercado de petróleo está especialmente apertado no momento.
No entanto, se as sanções forem apoiadas pelos aliados orientais do Ocidente, tais como Índia, Coreia do Sul e Japão, o impacto geral nas exportações da Rússia será significativo.
Um desses compradores, é claro, será a China, que aceitará com prazer o petróleo russo com um desconto. Mesmo assim, a logística de redirecionar volumes tão significativos de comércio de petróleo causará uma dor temporária para a Rússia.
Além de a Opep+ e dos Estados Unidos aumentarem gradualmente a produção de petróleo nos próximos meses, o único grande alívio para esses altos preços do petróleo é a perspectiva de um acordo nuclear com o Irã nos próximos dias, o que levaria a um adicional de 1,3 milhão de barris/dia de petróleo de volta ao mercado. Deve-se notar que levaria de três a seis meses para o Irã atingir totalmente esse nível de produção, mas apenas a notícia de um acordo nuclear concluído ajudará a reduzir os preços. Se esse acordo não se concretizar, espera-se que os preços do petróleo permaneçam elevados no futuro próximo.
A China em foco
A complexidade da situação atual comporta análises de diferentes ângulos para a questão da cadeia de fornecimento de energia e de matéria-prima. Provavelmente teremos margens mais baixas para o polietileno (PE) à base de nafta, as quais já apresentavam grandes quedas até a semana encerrada em 26 de fevereiro. Isso foi antes de os preços do petróleo atingirem sucessivas altas recordes nos últimos dias.
As margens da Europa e dos Estados Unidos atingiram níveis recordes devido à demanda mais forte durante a pandemia e à redução da oferta, um resultado de todos os problemas de produção de 2020 nos Estados Unidos.
Enquanto isso, a mudança na Política de Prosperidade Comum da China é enorme e não pode ser subestimada. Ela levou a uma queda da demanda por PE na China no ano passado, a primeira queda desde 2000, de acordo com minhas estimativas. As vendas na China caíram 40% em janeiro em relação ao ano anterior.
O maior impulsionador do crescimento da demanda de petroquímicos da China desde 2009 tem sido o setor imobiliário. No longo prazo, porém, a China deve continuar com a desalavancagem do setor imobiliário e com os demais aspectos da Prosperidade Comum, fatos negativos para o crescimento da petroquímica.
Situações adversas atingem a todos e provocam mudanças de rumo. Pensemos aqui na decisão da China de se aproximar muito da autossuficiência petroquímica em 2014 e como estamos agora no ponto em que o imenso país poderá em breve se tornar um importador líquido de PP.
Porém, a mudança de cenário que está na mente de todos é o fato de talvez estarmos no meio da maior ruptura geopolítica desde o início da Guerra Fria, em 1947.
As rotas comerciais foram completamente redesenhadas, pois o investimento em manufatura fluiu em grande parte dentro, mas não entre as zonas de influência dos EUA e da União Soviética. Os padrões de crescimento econômico também divergiram após o final da década de 1960 a partir da década de 1970, enquanto o Bloco Soviético lutava e o Ocidente crescia.
A análise da megatendência geopolítica tornou-se essencial para qualquer gestor na cadeia dos materiais plásticos, pois se ele não entender o seu efeito geopolítico nos fluxos comerciais, não poderá vender seu material.
O ritmo da sustentabilidade também é uma variável fundamental a ser entendida devido às interrupções no fornecimento de energia e petroquímicos causadas pelo conflito entre Rússia e Ucrânia e seus desdobramentos geopolíticos. No curto prazo, o ritmo da adoção de políticas de sustentabilidade, pelas razões detalhadas acima, pode desacelerar. A reciclagem, porém, segue como uma atividade promotora da diversificação das fontes de insumos para o setor, e deverá ser impulsionada.
E, finalmente, é preciso não esquecer o quanto a pandemia continua moldando a demanda, a oferta e os fluxos comerciais.
Estamos a mais de 10 mil quilômetros de distância da zona de guerra entre Ucrânia e Rússia. Porém, este evento deve afetar o preço do plástico no Brasil. O encarecimento das resinas está diretamente ligado ao preço do petróleo no mercado internacional, insumo que registra altas consecutivas desde o início do conflito. Em relação às commodities, a guerra na Ucrânia agrava muito e afeta a economia brasileira devido ao aumento dos custos. O plástico, matéria-prima fundamental na composição de vários produtos, é importante componente da alta da inflação.
Aqueles que ignoram as megatendências estão destinados a cometer erros táticos todos os dias.
Roberta Duarte, head of business na Conecta Resinas
Foto: Canva
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