por Flávio Silva*
O poli(cloreto de vinila) (PVC) é muito conhecido por suas aplicações no mercado de tubos, mas quem conhece a sua versatilidade sabe que ele possui uma gama extensa de usos, tais como conexões, filmes, chapas, fios, garrafas, perfis, mangueiras, produtos médicos, entre outros. Esta flexibilidade abre perspectivas de mercado para este material, especialmente em 2024 e no mercado brasileiro, como poderá ser constatado nesta análise que apresenta, de forma introdutória, como o balanço e a oferta mundial de PVC deve se comportar nos próximos anos.
A demanda mundial de PVC atualmente, está na ordem de 48 Mta (milhões de toneladas/ano) e há estimativas de que ela evolua até 2030 na ordem de 3,4% ao ano, chegando perto de 61 Mta. Segundo a S&P Global (SPGI), a capacidade mundial de PVC hoje é de 63 Mta e deve avançar para 70 Mta até 2030. O gráfico abaixo mostra o excesso de capacidade projetado para os próximos anos, o que aliviará as margens dos produtores de PVC em um futuro breve.
Fonte: SPGI e elaboração da Ohxide Consultoria
Observando o gráfico acima, fica claro o aumento da demanda projetada em ritmo maior do que a oferta. O PVC, assim como outras resinas, está estruturalmente passando por um período de excesso de oferta mundial, como se pode comprovar com o nível de ociosidade estimado (24%). Porém, nos próximos anos deve acontecer o contrário, com a demanda crescendo mais do que as novas capacidades de produção. Isso permitirá ao setor recuperar margens, independentemente do nível do preço do petróleo.
Outro dado interessante na análise é o crescimento do volume de PVC reciclado, assim como o de outros plásticos, visto que cada vez aumentam o interesse e os investimentos neste setor. Embora o PVC seja um dos plásticos menos reciclados no mundo, as projeções de crescimento de volume de reciclagem são significativas, e variam entre 8% e 10% ao ano, a depender da fonte consultada.
Um ponto interessante do PVC que traduz sua adequação aos conceitos de circularidade é o fato de a maior parte das suas aplicações estarem relacionadas a produtos de consumo a médio e longo prazo, como mostra a ilustração a seguir. Essa característica explica, inclusive, a menor taxa de reciclagem do PVC.
Fonte: Conselho Europeu de Fabricantes de PVC (ECVM) com elaboração Ohxide Consultoria
Olhando para o cenário interno no Brasil, é importante entender como os principais setores do País irão se comportar em 2024 para que se possa fazer um exercício de projeção da demanda no mercado local.
O primeiro setor que é preciso verificar, sem sombra de dúvidas, é o da construção civil, que consome mais de 60% da produção de PVC no País (número similar ao que se observa no restante do mundo). Segundo dados recém-divulgados, o ano de 2023 foi decepcionante sob o ponto de vista de desempenho, com apenas 1,2% de crescimento. No início do ano passado a expectativa de crescimento era mais que o dobro do resultado obtido.
Especialistas no setor indicam como motivo para este baixo crescimento, entre outras questões, a retração no segmento de pequenas obras. Estes dados são do Sindicato da Construção Civil do Estado de São Paulo (SindusCon-SP). Já a Câmara Brasileira da Indústria de Construção (CBIC) indicou uma retração em 2023 de 0,5%, contra estimativas no início do mesmo ano de 2,5% de crescimento, justificando que as altas taxas de juros foram impeditivas ao bom desempenho do setor.
Para 2024 o SindusCon-SP estima um crescimento de 2,9%, e a CBIC 1,3%. As premissas principais por trás destes números são a redução da taxa Selic e alguns programas de habitação governamentais, tais como o Minha Casa Minha Vida, o Plano de Aceleração do Crescimento (PAC), Casa Paulista e Pode Entrar. Como ponto de atenção negativo para o setor está o fim da desoneração sobre a folha de pagamento, que permanece indefinida, trazendo de volta a velha e famosa insegurança jurídica ao País.
Se for concretizado o fim da desoneração, que parece não ser o cenário mais provável, deve haver acréscimos nos custos de unidades imobiliárias, reduzindo assim a demanda.
Outro setor importante e que está muito relacionado com a demanda do PVC é o de infraestrutura, que consome quase 10% do material no País, segundo o Instituto Brasileiro do PVC (IBPVC). Segundo a Carta da Infraestrutura, divulgada pela consultoria Inter.B, existe uma previsão de crescimento nos investimentos para 2024 em relação a 2023, segmentados em quatro vertentes: Energia Elétrica, Telecomunicações, Saneamento e Transportes (rodovias, hidrovias, ferrovias, portos, aeroportos e mobilidade urbana). O total estimado para investimento em 2024 é de R$ 215,83 bilhões, cerca de 11% acima do verificado em 2023, sendo dois terços deste valor vindos do setor privado.
Outros setores importantes no consumo de PVC são o calçadista e o agropecuário. O setor calçadista, através da Associação Brasileira da Indústria de Calçados (Abicalçados), prevê um crescimento de 2,2% em 2024, ante uma queda em 2023 de 1,1% na produção. Já o setor agropecuário prevê queda na produção em 2024 de 3,4% abaixo de 2023, devido às questões climáticas, de acordo com a Confederação da Agricultura e Pecuária (CNA). Dentre os principais setores que mais demandam PVC, a maior parte está projetando um ano de 2024 melhor que 2023. Isso se reflete nas projeções de mercado para esta resina.
No que se refere à produção de PVC, o País conta hoje com dois grandes produtores dessa resina: a Braskem, com duas unidades, sendo uma em Camaçari (BA) e outra em Maceió (AL), as quais juntas somam uma capacidade de 710 mil toneladas por ano; e a Unipar, com sua unidade em Santo André (SP), com capacidade produtiva de 300 mil toneladas por ano.
O gráfico abaixo mostra a evolução do balanço oferta demanda da resina virgem de PVC no Brasil.
Fonte: Comex Stat, Braskem, Unipar e elaboração de Ohxide Consultoria
Observando o gráfico fica claro que há falta de capacidade local para atendimento da demanda nacional, ainda mais se considerarmos que os produtores locais não estão conseguindo atingir um nível ótimo de volume de produção, principalmente a Braskem. Os dados do quarto trimestre de 2023 ainda são estimados, aguardando confirmação oficial das empresas.
Pode-se perceber que existem períodos em que a demanda de PVC foi bem superior à oferta local, como pode ser visto no gráfico anterior. Em um cenário de economia mais aquecida, a manutenção desses níveis de demanda obrigaria consumidores locais a importar grandes volumes adicionais, mesmo no caso de a produção local estar no máximo.
Porém, a taxa operacional média do período analisado no gráfico foi de 65%, considerada muito baixa para unidades petroquímicas. Existe o impacto do problema ambiental de Alagoas na Braskem mas, mesmo assim, poder-se-ia ter um volume maior de produção. A Unipar também fez manutenções durante este período que prejudicaram o desempenho operacional em termos de valor absoluto de produção. Este baixo volume de produção já está implicando aumento nos volumes de produtos importados, com a perspectiva de se manter esta realidade nos próximos anos.
Com isso, as importações têm cada vez mais ganhado mercado com players regionais atuando mais fortemente no setor. Há ainda o acordo da Braskem com a Mexichem na importação de grades que a empresa não produz localmente. Por sua vez, a Unipar traz resina da sua unidade na Argentina para atender a uma parte do mercado nacional. Entre os players internacionais que mais atuam no Brasil estão: Mexichem, Shintec e Hanwha, entre outras.
O gráfico a seguir mostra a origem do PVC importado para o Brasil para os primeiros meses do ano.
Fonte: ComexStat com ajustes e elaboração de Ohxide Consultoria
A Colômbia aparece em primeiro lugar devido às importações oriundas da Mexichem (que é dona da marca Amanco) e a Orbia. Já os Estados Unidos vêm em segundo, também com importações via Mexichem e consumidores importando diretamente, tais como Fortlev, Krona e Karina, entre outros.
Os dados de importações, principalmente os do último trimestre, sofreram impactos de questões logísticas nos porto locais de Manaus (AM) e Itajaí (SC). Entre outubro e dezembro estes portos tiveram restrições nas suas operações devido a questões climáticas. Com isso, gerou-se um volume de “back log”, ou seja, pedidos em atraso nas entregas que chegaram ao País em janeiro (em sua maior parte) e fevereiro. Tanto que as importações de PVC em janeiro foram de 56 mil toneladas, 58% maiores do que a média mensal em 2023.
Sobre as taxas de reciclagem no Brasil, os volumes para o PVC giram hoje em torno de 23 mil toneladas por ano, segundo o IBPVC. Este mercado sofreu muito em 2023, uma vez que o preço da resina virgem esteve em queda durante boa parte do ano, com impacto no spread (diferencial) de preços entre os materiais virgem e reciclado. E sempre que este diferencial se reduz ele representa um desafio adicional ao negócio dos recicladores. Portanto, para quem está no setor de reciclagem, entender as variações de preços das resinas virgens é um ponto estratégico da gestão do seu negócio. Como exemplo, a Alassia que atua há quase trinta anos no mercado da reciclagem de plásticos e trabalha com reprocessamento de PVC rígido e flexível e polietileno de alta densidade (PEAD), teve um 2023 desafiador, como explica sua diretora comercial, Daniela Silvestrini:
“O ano de 2023 foi bastante desafiador. Os preços das matérias primas virgens caíram muito, o que impactou bastante o mercado de reciclados. Tivemos muita oferta de resíduos e pouca demanda para vendas, o que resultou em estoques altos de produtos e pouco volume de vendas. Por outro lado, tivemos um aumento bastante significativo na procura por beneficiamento de resíduos.
Nós fornecemos nossa matéria prima na forma moída, granulada e micronizada. Também atuamos com o beneficiamento de resíduos, modalidade em que o cliente envia seu próprio resíduo, nós beneficiamos e devolvemos para que ele reutilize em seu processo produtivo, fechando o ciclo da economia circular. Nossos produtos são destinados, em sua maior parte, para a indústria da construção civil, com aplicações como tubos de água, esgoto, mangueiras, eletrodutos, perfis, entre outros.
Nossas expectativas para 2024 são positivas, com o aumento contínuo da demanda impulsionada pela conscientização ambiental e regulamentações mais rígidas. Esperamos também um aquecimento da indústria da construção civil em 2024, impulsionada pelo marco do saneamento. Espera-se ainda que as indústrias invistam mais em tecnologias de reciclagem e inovações sustentáveis, promovendo o crescimento do mercado de resinas plásticas recicladas como um todo.”
Na análise do balanço de mercado, temos o seguinte cenário histórico:
Fonte: ComexStat, Braskem, Unipar com ajustes e elaboração de Ohxide Consultoria. O ano de 2023 ainda tem valores estimados
No gráfico acima ficam claros alguns pontos interessantes para análise, como a confirmação de que o mercado nacional já há alguns anos é um importador estrutural de PVC. Sendo assim, a precificação deste produto acaba se baseando na oportunidade de mercado que é a importação, também chamada de “preço paridade de importação”.
Outro ponto interessante no gráfico é a queda no percentual de utilização da capacidade de produção. Este fato está diretamente ligado ao evento de Maceió da unidade da Braskem, que precisou, em um primeiro momento, paralisar as atividades e depois operar de forma menos intensa. Isso se refletiu tanto no percentual médio de ocupação da capacidade, quanto no percentual de volume importado que entra no País.
Percebe-se que os anos de 2020, 2021 e 2022 tiveram variações bem significativas de um para o outro. Obviamente, isso se deveu à pandemia, que mexeu com as dinâmicas de mercado e gerou demandas novas por um período limitado, como no caso do PVC para itens hospitalares e pequenas construções e reformas.
Com base nos dados apurados, a visão de mercado para o PVC em 2024 está sintetizada no gráfico abaixo.
Fonte: modelos econométricos e análises da Ohxide Consultoria (não pode ser reproduzido sem anuência prévia por escrito).
Considerando o cenário atual, os contextos de crescimento e visões sobre mercados demandantes, entendemos que poderá haver uma faixa de crescimento variando entre 0,65% e 3,40%, segundo nossos modelos econométricos e nossa expertise de mercado. Em qualquer um dos cenários, será o ano de maior demanda nacional dentre os últimos mais recentes, com exceção de 2021, totalmente impactado pela pandemia.
Se quiser conhecer mais sobre este mercado ou de outras resinas e suas aplicações e ainda ter acesso a uma série de outras informações, entre em contato com a Ohxide. Temos também nosso relatório mensal de preços e mercado, uma publicação que cobre sete famílias de produtos (PE, PP, PVC, PET, PS, ABS e SAN) em três regiões (SP, Sul e NE).
*Flávio Silva é sócio-diretor da Ohxide Consultoria (Rio de Janeiro, RJ e Paulínia, SP)
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