O painel Avanços e Oportunidades no Compartilhamento de Postes, realizado no dia 7 de agosto, durante o Netcom, em São Paulo, trouxe uma acalorada discussão entre os especialistas do setor e foi acompanhado por uma plateia lotada. “Diríamos que quase voltamos à estaca zero”, disse Helcio Binelli, sócio-diretor na PGB Security, mediador do painel, referindo-se à recente decisão da Aneel de extinguir e reiniciar o processo sobre as novas regras, após a Anatel ter aprovado o modelo em outubro de 2023, ratificando um modelo amplamente debatido e aprovado desde 2021. O III Workshop Compartilhamento de Postes teve a coordenação de Marcius Vitale, engenheiro especialista em infraestrutura de telecomunicações, CEO da Vitale Consultoria e presidente da Adinatel - Associação dos Diplomados do Inatel.

Representantes dos setores de telecom e de energia participantes do painel concordaram que é necessário um consenso definitivo com base no modelo e trazer a responsabilidade para todos. “Esse jogo de empurra-empurra tem que mudar e o que foi decidido tem que avançar”, argumentou Luiz Henrique Barbosa, presidente da Telcomp, entidade que representa mais de 70 empresas de telecomunicações.

Para Ana Carolina Silva, consultora de regulação da ABRADEE - Associação Brasileira de Distribuidores de Energia Elétrica, um dos maiores problemas no processo de compartilhamento de infraestrutura entre os setores de distribuição e telecomunicações é a regularização dos acessos à revelia e clandestinos nos postes. “Muitas empresas possuem contratos com as distribuidoras para um determinado tipo de acesso, mas acabam utilizando mais pontos do que o acordado. Além disso, há empresas que operam sem qualquer contrato, utilizando os postes de forma clandestina. Esse problema se intensificou desde as privatizações das telecomunicações. Embora tenha sido benéfico para os consumidores, aumentando o acesso aos serviços, a infraestrutura não estava preparada para a multiplicação de operadoras”, afirmou. A ocupação desordenada limita o acesso das próprias concessionárias elétricas aos postes, prejudicando a manutenção e a qualidade do serviço prestado. “A vida útil dos postes pode ser reduzida e qualquer investimento adicional acaba impactando as tarifas pagas pelos consumidores do setor elétrico”, disse.

Outro ponto importante defendido pela Abradee é a punição para os agentes irregulares. “Atualmente, não há uma ação efetiva do segmento de telecomunicações para coibir essas práticas. Sem punições, é difícil resolver o problema, mesmo sabendo que existem empresas sérias no setor”, disse Ana Carolina.

Para a advogada Kátia Pedroso, sócia e diretora da Telconsultoria, as agências reguladoras enfrentam dificuldades para chegar a um consenso devido aos interesses econômicos divergentes que atuam nesses dois setores. “A frustração é grande, especialmente com a decisão do regulador do setor elétrico, que optou por não decidir. Em 2024, ainda estamos discutindo a revisão da Resolução Conjunta 4, de 2014, desde 2018, sem uma decisão concreta”, afirmou.

 

Posteiro

Para a consultora da Abradee, a questão do posteiro é um dos pontos que a entidade não concorda e não deve ser obrigatória para a distribuidora. “Em regiões metropolitanas, onde o acesso aos postes é mais disputado, pode fazer sentido uma regulamentação mais rígida. No entanto, em áreas remotas, onde há menos provedores e a distribuidora já presta o serviço, essa regulamentação pode não ser necessária. É preciso estudar e adaptar o modelo conforme a realidade de cada região”, disse.

Para Katia, a figura do posteiro, como agente econômico e atividade de gestão da infraestrutura disciplinada, poderia resolver a questão da modicidade tarifária das empresas de energia, mudando a natureza jurídica desse componente de receita acessória para ressarcimento ao custo. “Embora a modicidade tarifária beneficie o consumidor na ponta, é melhor priorizar o ordenamento dos postes, pois o consumidor do sistema elétrico que passa na rua pode sofrer acidentes”, disse.

Ela lembra que a lei assegura o uso pelas empresas de telecomunicações. Essa infraestrutura é essencial e não pode ser facilmente duplicada, tornando-se indispensável encontrar uma solução viável. “A proposta é que, após a aprovação da regra, seja realizado um chamamento público para selecionar uma empresa com capacidade de gestão e infraestrutura, estabelecendo requisitos claros para a escolha do melhor posteiro. Esse explorador não estará livre de obrigações; ele terá um contrato com a distribuidora e será supervisionado por dois reguladores, garantindo uma oferta pública aprovada”, disse.

Apesar das discussões e de opiniões contrárias por parte do setor de energia, a advogada defende que o modelo seja testado na prática, pois atualmente ninguém resolve o problema. “Existem interesses que preferem manter o status atual, com contratos históricos e condições não regularizadas. Hoje o acesso aos postes ainda é discriminatório, e o preço não é justo para todas as prestadoras de telecomunicações. O modelo aprovado pela Anatel e submetido ao Conselho deve ser mantido”, disse.

Para Sidney Simonaggio, sócio-proprietário da Simonaggio Soluções Empresariais e head da área de energia do escritório Carpena Advogados Associados, com mais de 40 anos de experiência na área de distribuição, organizar a instalação de fibras é inviável com 64 distribuidoras e 20 mil operadores. “A única forma de trazer ordenamento, equilíbrio e modicidade tarifária é por meio de um operador neutro, único, que instalaria os cabos a serem utilizados por todos com uma tarifa regulada, evitando arbitrariedades nos preços”, afirmou.

Segundo Luiz Henrique Barbosa, presidente da Telcomp, a escolha do modelo do posteiro para organizar os 10 milhões de postes no país ainda gera desconforto e incertezas, especialmente sobre o financiamento e a execução do reordenamento. Cada poste custa cerca de R$ 2 mil para ser reorganizado, totalizando um investimento de R$ 20 bilhões. “Na nossa visão, um operador de rede neutra seria a melhor solução. Mas no modelo de posteiro, sugerimos a implementação de um projeto piloto para entender melhor as restrições e desafios”. A Telcomp destaca a complexidade administrativa e o impacto das ações judiciais em andamento, reforçando a necessidade de avanços concretos.

Segundo Katia, diariamente, prestadores regionais a consultam sobre como proceder sem uma solução das duas agências. “A falta de uma postura resolutiva gera frustração, mas acredito que há possibilidades de avanço. As agências precisam chegar a um novo consenso. A Aneel rompeu com o modelo da Anatel, mas há uma chance de retomarem as conversas. Espero que retornem ao modelo aprovado pela Anatel”, disse.

A Telcomp identificou movimentos em diversos municípios para cortar cabos e buscar soluções, evidenciando o desespero das autoridades locais diante das reclamações dos munícipes. No estado de São Paulo, por exemplo, de 645 municípios, mais de 100 têm movimentos de Procon, Ministério Público, vereadores e prefeitos buscando resolver o problema. Situações semelhantes ocorrem em outros estados, como Rio Grande do Sul e Minas Gerais.

Na opinião de Simonagio, as distribuidoras deveriam abrir mão do compartilhamento de infraestrutura. “É um fardo. A remuneração recebida pelas distribuidoras, com 60% destinada à modicidade tarifária e os outros 40% representando uma parcela mínima das receitas, não compensa os encargos envolvidos. Muitas distribuidoras desejam se livrar dessa obrigação, pois o retorno financeiro é insignificante comparado aos compromissos que elas têm”, afirmou.

Segundo ele, a responsabilidade pelos cabos de telecomunicações não deveria recair sobre as distribuidoras, que não podem negar o uso dos postes e não têm a liberdade de escolha sobre quem utiliza a infraestrutura. “A realidade é que o compartilhamento de postes não é um serviço que vale a pena para as distribuidoras de energia elétrica”, diz.

 

Business plan para o posteiro

Montar um plano de negócios para o modelo do posteiro envolve considerar a estrutura de custos e receitas associadas aos postes. Cada poste, que dura 30 anos, tem um custo de R$ 2000 (poste + instalação). A receita será gerada pelo uso dos pontos de fixação, com um custo de R$ 1,03 por ponto. Com 6 pontos a R$ 1, o custo total é de R$ 6, enquanto a receita pode chegar a R$ 24 com 6 pontos a R$ 4 cada. Em um leilão reverso, o posteiro que oferecer menos pode ganhar, por exemplo, oferecendo R$ 3 por ponto, resultando em uma receita de R$ 18 por poste.

A responsabilidade do posteiro pode abranger até 500 mil postes, gerando uma receita mensal de R$ 6 milhões. Esse valor deve cobrir os custos de fiscalização, zeladoria e uso de ferramentas de inteligência artificial. A densidade dos postes, conforme localização geográfica dos postes, também deve ser considerada. O posteiro terá a tarefa de coordenar sua atuação com diversas entidades, incluindo municipalidades, empresas de iluminação pública e departamentos de trânsito. “Mas há que considerar oportunidades adicionais, como o uso dos postes para carregamento de carros elétricos e instalação de  elementos de street level solution para redes móveis 5G. Um poste é um posto de gasolina em potencial”, disse Barbosa.

“Obviamente que deve ter gente avaliando, fazendo conta, entendendo quais são as interfaces que ele vai ter que cuidar, como ele vai lidar com distribuidores de um lado, prestadores de telecom, prefeitos. Vamos dar uma oportunidade dele aparecer. Porque o modelo está avançando para isso e deve ter gente vendo isso como uma oportunidade. É um negócio de longo prazo. Agora, o que a gente precisa ter é o cuidado, estabelecer as regras de forma transparente e objetiva para que esse posteiro conheça, faça suas contas e entre no negócio sabendo que ele vai precisar encarar. Então, essa fase é necessária. E precisa acontecer de forma absolutamente aberta e respeitadas as regras. O modelo do explorador é realmente a possibilidade que temos que avançar. Eu acredito no modelo do posteiro com todos esses cuidados, com toda essa transparência que precisa ainda da atuação dos reguladores”, disse Katia.

 

Preço regulado

O preço regulado é visto como algo positivo por todos os representantes e pode reduzir conflitos para acesso aos postes, em lugar do atual preço de referência. Mas provedores regionais também defendem que haja um teto para o valor cobrado por poste, tema que será foco de uma consulta pública específica. “Hoje temos melhor segurança jurídica e o Decreto 12.608/2024, que regulamenta a licitação e a prorrogação das concessões de distribuição de energia elétrica no Brasil.

O preço regulado pode ajudar a reduzir os conflitos do preço de referência. Os provedores quando não concordam com o preço que a distribuidora cobra, entram na câmara de conflito e pede o preço de referência.

“Um preço regulado traz previsibilidade, tanto para as distribuidoras quanto para as empresas de telecom. Mas, certamente, precisa refletir os verdadeiros custos, ou seja, os custos de operação, investimento, fiscalização, que hoje muitas distribuidoras não conseguem aplicar porque isso não está refletido”, disse Ana Carolina.

Na foto, da esquerda para a direita, Sidney Simonaggio, Katia Pedroso, Luiz Henrique Barbosa, Ana Carolina Silva e Helcio Binelli (mediador do painel)



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