Para a realização deste projeto foi utilizada a liga 356.0 à base de Al-Si-Mg, conforme classificação da Aluminum Association (AA). A escolha foi feita por conta da variedade de componentes nos quais ela pode ser usada e por oferecer vantagens como alta resistência e peso.
As propriedades mecânicas dessa liga podem ser melhoradas por meio de tratamento térmico de solubilização e envelhecimento que, se realizados adequadamente, proporcionam uma distribuição uniforme de precipitados à base de Mg-Si na matriz de alumínio (Al) e aumentam a resistência e a dureza dos componentes [8].
Nos processos de fabricação de peças fundidas de alumínio ocorrem etapas que afetam as propriedades mecânicas dos produtos, com destaque para os tratamentos aplicados ao metal fundido e a própria fundição. Portanto, o objetivo principal deste trabalho experimental foi investigar o efeito do tratamento térmico de solubilização e envelhecimento sobre as propriedades mecânicas e microestruturais da liga de alumínio 356.0.
Os corpos de prova utilizados no estudo foram produzidos em molde
Fig. 1 – Aspecto da superfície de fratura do corpo de prova de tração no estado bruto de fundição, produzido em coquilha
Fig. 2 – Microestrutura da liga 356.0 no estado bruto de fundição, produzida em coquilha; ataque HF 0,5%
permanente por gravidade e, posteriormente, submetidos ao processo de tratamento térmico.
Materiais e métodos
Os corpos de prova aplicados neste trabalho foram obtidos a partir da fusão de 179 kg de alumínio em um forno a gás natural com cadinho de ferro (aço) e da desgaseificação do metal com nitrogênio industrial, o qual foi aplicado com ponta porosa durante 8 min, seguido pela retirada da escória.
Após essas etapas, foram produzidas 45 amostras em coquilha, de acordo com as especificações das
normas ASTM B108 – 82b (1984) e NBR7549 (2001)[2 e 4] . Para isso, a temperatura do metal líquido no forno foi mantida entre 690°C e 710°C, sem que tenham sido aplicadas pastilhas para o refinamento da microestrutura ou modificação do silício (Si) eutético.
A faixa de temperatura de trabalho do molde durante a produção dos corpos de prova foi de 250°C a 350°C; já a análise química foi feita em um espectrômetro de emissão óptica Spectrolab, série 1485/87. Durante a fundição, foram retiradas três amostras e, posteriormente, realizadas análises químicas em mais três corpos de prova de cada processo.
O tratamento térmico de solubilização foi feito na temperatura de 520°C ±10°C, durante 5 h, seguido por resfriamento em água morna com temperatura entre 65°C ± 5°C. O envelhecimento foi feito a 180°C, durante períodos de 6, 10, 14, 16, 20 e 28 h. Para cada tempo de envelhecimento foram usados quatro corpos de prova.
As amostras para a metalografia foram retiradas da extremidade dos corpos de prova após o ensaio de tração, uma vez que a região não é afetada e por representar na metalografia a mesma amostra submetida no teste de tração. A ação química para revelar os microconstituintes foi efetivada em uma solução de água destilada com 0,5% de ácido fluorídrico (HF).
Após o ensaio de tração, realizado na máquina universal U20 da marca Otto Wolpert, com carga de até 4.000 kgf e velocidade de 10 mm/min, foi possível observar a superfície da fratura dos corpos de prova no microscópio eletrônico de varredura J SM T300 da marca Jeol. Foram retiradas amostras da extremidade do corpo de prova para o ensaio de dureza Brinell (HB), que foi feito em um durômetro modelo BK 300a, também
Fig. 3 – Microestrutura da amostra após solubilização a 520°C, durante 5 h; ataque HF 0,5%
da Otto Wolpert, cujo penetrador do tipo esfera de aço possui diâmetro de 10 mm e carga de 500 kgf.
Resultados e discussões
Análise da composição química
As tabelas 1 e 2 mostram, respectivamente, a composição química obtida e a especificação da Aluminum Association[1] para a liga 356.0. O teor de magnésio (Mg) obtido foi de 0,64%, cerca de 0,19% acima do especificado. No entanto, essa diferença não é crítica, pois o limite de solubilização do Mg para atuar como agente endurecedor corresponde, aproximadamente, a 0,6%, segundo Apelian, Shivkumar e Sigworth (1989)[3].
A soma dos percentuais de estanho (Sn), cobalto (Co), níquel (Ni), chumbo (Pb), estrôncio (Sr), antimônio (Sb) e sódio (Na) foi 0,06%, de acordo com a especificação da AA, que admite até 0,15% de elementos residuais [1]. Yi et al. (2004) e Crepeau (1995) [14 e 6] também citam o ferro (Fe) como formador de compostos intermetálicos na liga Al-Si-Mg que, por sua vez, reduzem a resistência ao impacto, à fadiga, ao alongamento e à usinabilidade.
O teor de Fe obtido foi de 0,98% e o de manganês (Mn) foi de 0,53%, sendo que este último se encontra pouco acima da metade do teor do primeiro, conforme foi mostrado na tabela 1. De acordo com a AA, se o teor de Fe for maior que 0,45%, o de Mn não deve ser menor que a metade do primeiro elemento[1].
Tal recomendação também é citada por Bäckerud, Chai e Tamminen (1990)[5] com o propósito de favorecer a formação da fase Al 15 (Mn, Fe) 3 Si 2, a qual possui morfologia compacta e evita a iniciação de trincas no material. A adição de Mn em forma de placas inibe a formação da fase Al FeSi, que pode 5colaborar com a criação de trincas e reduzir as propriedades mecânicas.
Análise das amostras no estado bruto de fundição
Propriedades mecânicas
Os resultados dos limites de resistência, alongamento e dureza no estado bruto de fundição são mostrados na tabela 3. A norma ASTM especifica um limite mínimo de resistência de 145 MPa e um alongamento mínimo de 3% para a liga 356.0 das amostras obtidas em
Fig. 4 – Imagem da superfície da fratura do corpo de prova solubilizado após o ensaio de tração, obtida no microscópio eletrônico de varredura
coquilha[2]. Porém, a ASTM não especifica a dureza no estado bruto de fundição, pois os resultados não alcançaram os requisitos mínimos do alongamento, que, entretanto, foram superiores ao limite de resistência.
Microestruturas
A superfície da fratura na ruptura após o ensaio de tração dos corpos de prova é do tipo clivagem, típico de material frágil (figura 1). A microestrutura (figura 2) mostra a presença das fases alumínio α e Si eutético e os intermetálicos nas formas de escrita chinesa e massiva.
Segundo Bäckerud, Chai e Tamminen [5], os intermetálicos especificados possuem estrutura com a composição Al 15 (Mn, Fe) 3 Si 2. Já a presença da fase Al 5 FeSi (na forma de agulhas) não foi constatada. Portanto, pode-se afirmar que a predominância da formação dos intermetálicos dos tipos escrita chinesa e massivo e a ausência do intermetálico tipo acicular (agulhas Al5 FeSi) ocorreram porque o teor de Mn foi mantido pouco acima da metade do teor de Fe[5].
Para Bäckerud, Chai e Tamminen[5], a fase Al 15(Mn, Fe ) 3 SI 2 em velocidades de resfriamento menores, como em molde de areia, pode se formar como partículas grandes e massivas. Entretanto, em velocidades maiores, como em coquilhas, além do teor de Mn, o resfriamento também favorece a formação da microestrutura do tipo escrita chinesa (tabela 4).
Relação entre propriedades mecânicas e microestruturas
Os corpos de prova obtidos em coquilha no estado bruto de fundição não alcançaram a especificação mínima referente ao alongamento estabelecido pela norma ASTM B 108 de 1984[2]. Isso provavelmente ocorreu devido aos elevados teores de Fe (0,99%) e Mn (0,54%), os quais ficaram acima do recomendado pela AA e pela ASTM, que é de 0,6% e 0,35%, respectivamente[1, 13, 2].
No entanto, as maiores proporções de Fe e Mn favoreceram a formação dos intermetálicos Al 15 (Mn, Fe3) Si2 (figura 2). De acordo com Crepeau [6], quando o teor de Fe é aumentado, mesmo com a neutralização feita pelo manganês, haverá maior quantidade de fases ricas duras e frágeis desse elemento (intermetálicos), de maneira que seus efeitos não possam ser totalmente eliminados.
A ausência do tratamento de modificação da liga com Na ou Sr também pode ter influenciado na obtenção de resultados menores no alongamento, em relação aos especificados pela norma ASTM B 108[2].
Efeitos do tratamento térmico de solubilização
Propriedades mecânicas
Os resultados do limite de resistência, alongamento e dureza após a solubilização são mostrados na tabela 5. Em relação às amostras no estado bruto de fundição, foi encontrado aumento nos limites de resistência e dureza e redução no alongamento.
Rezende e Zingali[11] realizaram testes em corpos de prova produzidos em coquilha com a liga AlSi7Mg e teor de ferro menor que 0,2%. Essas amostras foram submetidas ao tratamento
Fig. 5 – Efeito do tempo de envelhecimento no limite de resistência
de solubilização em temperatura de 540°C, durante 6 h, tendo apresentado resultados em torno de 208 MPa no limite de resistência, 85 HB de dureza e 14% de alongamento. Em comparação às informações desses
autores, pode-se constatar, então, que o limite de resistência e a dureza são inferiores. A norma ASTM B 108[2] não cita nenhuma especificação para amostras somente solubilizadas.
Microestruturas
A figura 3 mostra a microestrutura obtida após o tratamento térmico de solubilização. Ao compará-la com a figura 2 no estado bruto de fundição, percebe-se que ocorreu pouca alteração na morfologia das partículas de Si e que houve somente arredondamentos nas extremidades. Na morfologia dos compostos intermetálicos não foram constatadas modificações. A figura 4 traz a superfície da fratura, a qual apresenta aspecto do tipo clivagem, típico de material frágil. Porém, ao compará-la com as amostras no estado bruto de fundição (figura 1), não são encontradas diferenças.
Relação entre propriedades mecânicas e microestruturas
O aumento do limite de resistência e dureza e a redução do alongamento após a solubilização, em relação às amostras no estado bruto de fundição, podem estar ligados à formação da solução sólida de Mg no alumínio e à alteração na morfologia das partículas de Si e intermetálicos. Todavia, o efeito predominante sobre o arredondamento das partículas de Si, que foram pouco alteradas (figura 3), foi a formação da solução sólida.
Efeitos do tratamento térmico de envelhecimento
Propriedades mecânicas
As figuras 5, 6 e 7 destacam os resultados do efeito do tempo de envelhecimento sobre o limite de
Fig. 6 – Efeito do tempo de envelhecimento na dureza
resistência, dureza e alongamento. Foi revelado um crescimento sobre as amostras solubilizadas. Durante um período de 6 a 10 h de envelhecimento houve uma tendência de elevação no limite de resistência, um pequeno aumento na dureza e a redução do alongamento, o qual teve a maioria das amostras com percentual inferior a 1%.
Os maiores resultados do limite de resistência ficaram entre 290 e 318 MPa, alcançados em corpos de prova envelhecidos durante 10 e 16 h. Enquanto isso, na dureza, os maiores números variaram entre 100 e 102 HB, em amostras envelhecidas entre 6 a 16 h. Os efeitos do limite de resistência e dureza nos corpos de prova envelhecidos entre 6 e 28 h foram suficientes para ultrapassar os valores mínimos especificados pela ASTM B 108[2] (tabela 6). Porém, os resultados do alongamento não atenderam ao requisito mínimo dessas especificações.
Depois de 16 h de envelhecimento, os resultados apontaram reduções no limite de resistência, dureza e alongamento. Segundo Romestch e Schaffer[12] , esse tipo de comportamento sugere o inicio do processo de superenvelhecimento.
Microestruturas
A microestrutura dos corpos de prova produzidos após o envelhecimento é representada na figura 8. Não foram constatadas modificações nos microconstituintes das amostras envelhecidas, em comparação com as adquiridas após a solubilização (figura 3).
Já a figura 9 mostra a imagem feita em um microscópio eletrônico de varredura, da superfície da fratura depois do tratamento térmico de envelhecimento, que neste caso se refere ao processo ocorrido durante 6 h, nas quais foi constatada a formação da superfície do tipo clivagem.
Relação entre propriedades mecânicas e microestruturas
A tendência de crescimento no limite de resistência de um pequeno aumento na dureza e da redução no alongamento nos corpos de prova envelhecidos entre 6 e 10 h provavelmente ocorreu em função da formação de precipitados muito finos no interior da matriz de alumínio-α, os
Fig. 7 – Efeito do tempo de envelhecimento no alongamento
quais não puderam ser observados no microscópio óptico. Esse comportamento está de acordo com Apelian, Shivkumar e Sigwohth[3], para as ligas Al-Si-Mg, ao descreverem que os primeiros precipitados (fases Guinier-Preston, GP) formados no início do tratamento térmico de envelhecimento aumentam a dureza e alcançam o pico com a formação de bastões (fase β).
As causas mais prováveis para os baixos resultados no alongamento das amostras [6, 5, 14] estão relacionadas ao elevado teor de Fe e Mn, o que causou a formação das partículas intermetálicas duras e frágeis e dos precipitados dos tipos zonas de GP e β no envelhecimento[3]. Essa obtenção negativa também pode ser atribuída à ausência do tratamento de modificação do Si eutético com Na ou Sr.
Conforme foi citado anteriormente, os teores de Fe e Mn acima da especificação geram fases intermetálicas que causam redução na nodularidade. Crepeau (1995) e Bäckerud, Chai e Tamminen[6 e 5], afirmam que o aumento do teor de Fe nas ligas de Al reduz drasticamente a nodularidade, graças à formação das fases intermetálicas resistentes e frágeis.
Essa queda também pode ser atribuída aos produtos sedimentares formados em função do envelhecimento.Segundo Porter e Easterling [10], quando os precipitados dos tipos zonas de GP
Fig. 8 – Microestrutura da amostra após o tratamento térmico de envelhecimento a 180°C, durante 28 h; ataque HF 0,5%
e de transição são formados ocorre maior dificuldade para o movimento das discordâncias, por conta de uma matriz mais deformada e com alto nível de tensões no reticulado cristalino. Os resultados apresentados por Apelian, Shivkumar e Sigworth [3] evidenciam que a redução no alongamento acontece em função do aumento do tempo de envelhecimento.
Conclusões
Os resultados dos limites de resistência e dureza após o tratamento térmico de envelhecimento entre 2 e 20 h atenderam aos valores mínimos especificados pela norma ASTM B 108[2]. Isto ocorreu por conta da formação de precipitados e da mínima presença de poros.
O alongamento após o tratamento térmico foi inferior a 1% e com tendência de redução em função do aumento do tempo do processo. Portanto, ele não respondeu aos valores mínimos especificados pela norma ASTM B 108 [2]. O fato se deu, provavelmente, devido ao elevado teor de ferro e manganês e à ausência do tratamento de modificação do Si eutético com sódio ou estrôncio.
Houve tendência de crescimento no limite de resistência dos corpos de prova entre de 6 e 10 h de envelhecimento. Esse efeito pode ter ocorrido graças à formação de precipitados coerentes com a matriz, os quais favoreceram sua distorção e dificultaram a movimentação das discordâncias.
Em processos de envelhecimento com tempo acima de 14 h, foram
Fig. 9 – Superfície da fratura da amostra após 6 h de tratamento térmico de envelhecimento a 180°C
apresentadas tendências de redução no limite de resistência e dureza. Isso pode ter acontecido em função da formação de produtos sedimentares mais grosseiros na matriz de alumínio-α, o que facilitou a movimentação das divergências entre eles.
O tratamento térmico de solubilização causou arredondamentos nas extremidades das partículas de Si. Ele ainda favoreceu o aumento da dureza e do limite de resistência, porém, diminuiu o alongamento. O que pode ter contribuído para isto foi o efeito dos elementos de liga em solução no alumínio-α e em tempe ratura ambiente.
A adição de ferro na liga 356.0 contribuiu para a obtenção de resultados menores do alongamento no estado bruto de fundição e após o tratamento térmico de solubilização e envelhecimento. A adição de manganês favoreceu a formação dos intermetálicos com a morfologia do tipo escrita chinesa e massiva. Dessa maneira, a formação dos intermetálicos na forma acicular foi evitada.
A obtenção das propriedades mecânicas, de acordo com a norma ASTM B108 [2], na liga 356.0 em componentes produzidos em coquilha, requer o uso de lingotes e sucata com baixo teor de Fe, desgaseificação do metal fundido e aplicação do tratamento de modificação do Si eutético.
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