Apesar dos investimentos em grandes obras de infraestrutura, questões básicas como falta de saneamento e acesso à água tratada nos locais onde elas são construídas ainda persistem. É o que mostra o estudo Redefinindo prioridades dos planos de infraestrutura no estado do Pará, do Climate Policy Initiative/Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (CPI/PUC-Rio), lançado no dia 6 de maio. O levantamento revelou que, no estado, há um descompasso entre a real demanda de infraestrutura, que diz respeito à qualidade de vida das pessoas, e os investimentos planejados para acontecer.

Utilizando a metodologia de acesso ao mercado, os pesquisadores mapearam a área de influência de quatro projetos de infraestrutura planejados para serem implementados no estado mais populoso da Amazônia brasileira ao longo da próxima década (construção da Ferrogrão, pavimentação da BR-230 e melhorias na BR-163 e na BR-155/158). Um total de 1,92 milhão de pessoas mora na área de influência desses quatro projetos.

O levantamento permitiu comparar a situação nessas localidades com as demais regiões do estado e concluir que, apesar de residirem mais próximos de estradas que o habitante típico do estado do Pará, os habitantes da área de influência desses grandes projetos têm pior acesso a saneamento básico, telefonia e Internet móvel, escolas e centros de saúde que no restante do estado.

Conforme o estudo, os problemas no acesso à infraestrutura de qualidade de vida são particularmente grandes na área de influência da BR-230. Mais de 90% da população residente dessa região não coleta esgoto adequadamente, cerca de 20 pontos percentuais a mais que no estado como um todo. Além disso, mais de metade da população dessa área de influência reside a mais de dez quilômetros de antenas 4G, escolas e centros de saúde. Esses números caem para 20% no estado como um todo, de acordo com o CPI. 

A análise dos dados por tamanhos de município e regiões demonstra ainda mais claramente as desigualdades de acesso à infraestrutura de qualidade de vida existentes na região. Isso porque menos de 2% dos habitantes metropolitanos de Belém vivem a menos de 10 quilômetros de antenas 4G, escolas e centros de saúde. “Isso contrasta com o restante do estado, onde 13% da população de municípios com mais de 50 mil habitantes e 20% da população dos municípios com menos de 50 mil habitantes reside a mais de 10 quilômetros tanto de antenas 4G, escolas e centros de saúde”, diz trecho do levantamento. Regionalmente, mais de um quinto da população mora a mais de dez quilômetros de antenas, escolas e centros de saúde em três das seis regiões do estado. Em conjunto, os resultados mostram o tamanho dos desafios para que seja promovida infraestrutura de qualidade de vida no estado.

Para o coordenador de Avaliação de Política Pública, Agricultura Sustentável e Infraestrutura do CPI/PUC-Rio, Arthur Bragança, a priorização de grandes obras como rodovias, usinas hidroelétricas, linhas de transmissão, hidrovias e portos relegou diferentes tipos de infraestrutura local como tratamento de água, coleta de esgoto, conectividade, escolas e centros de saúde a um papel secundário no investimento. Esse cenário, segundo o pesquisador, indica a importância de redefinir as prioridades dos planos de infraestrutura desenhados para a Amazônia brasileira de forma a incrementar o montante de recursos investidos em projetos locais que beneficiam diretamente a população do Pará.

Mobilizar recursos para investir em infraestrutura de qualidade de vida é um desafio central para permitir que governos redefinam as prioridades dos planos de infraestrutura desenhados para a região. De acordo com a análise do CPI, pequenos projetos de infraestrutura focados em melhorar a conectividade ou o saneamento básico da população local dificilmente atraem capital privado da mesma forma que infraestrutura de grande escala focada em prover serviços para exportadores. Consequentemente, aumentar investimentos em infraestrutura para qualidade de vida requer aumento de impostos e/ou realocação de recursos de outras áreas.

Uma possibilidade para lidar com esse cenário, de acordo com o indicado no estudo do CPI, é usar as compensações pagas por grandes projetos para financiar melhorias de infraestrutura de qualidade de vida, tais como os serviços básicos para a população do estado do Pará.



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