por Fábio Bello *


 

O gás natural possui um papel importante na indústria química, seja por sua utilização como energético ou como matéria-prima na produção de fertilizantes nitrogenados, metanol e eteno. Quando utilizado como energia, o gás natural pode alcançar até 20% dos custos de produção na indústria em geral. Trata-se de um produto de grande relevância para o segmento químico, com alto potencial para o desenvolvimento da indústria, incluindo a de transformação de plásticos.


 

Em maio de 2023, a Firjan divulgou o estudo “Petroquímica: Atração de Investimentos para o Rio de Janeiro”, onde apresenta o uso do gás que atualmente é reinjetado nos campos do pré-sal como alternativa para alavancar investimentos e reduzir o déficit da balança comercial de produtos químicos.

 

Por falta de competitividade, a indústria química brasileira tem operado com uma taxa de ocupação média de 70%, muito abaixo do patamar ideal, acima de 85%, em termos de eficiência e rentabilidade. O déficit da balança comercial de produtos químicos tem aumentado nos últimos anos, saindo de US$ 7 bilhões em 2000 para US$ 63 bilhões em 2022.


 

De acordo com o estudo realizado pelo BNDES, “Gás para Desenvolvimento”, a indústria química possui um dos maiores potenciais de crescimento da demanda de gás natural, saindo dos atuais 10 MMm3/d (25% da demanda industrial) para 38 MMm3/d até 2030. A maior parte deste crescimento, no entanto, estaria atrelada à sua utilização como matéria-prima, que passaria dos atuais 3 MMm3/d para 22 MMm3/d ao final da projeção.


 

O Rio de Janeiro possui um papel importante na produção de gás, concentrando 41% da capacidade de processamento nacional e sendo responsável por 38% da produção nacional de gás especificado. Além disso, o Estado produziu 100% do etano (618 mil m3/d), 99% do propano (3 mil m3/d), 37% do GLP (7 mil m3/d) e 45% do C5+ (3 mil m3/d) consumidos no Brasil.


 

Entretanto, de acordo com as estimativas do estudo da Firjan, foram reinjetados o equivalente a 49 MM m3/d de gás bruto nos campos de produção de óleo & gás no Rio em 2022. Caso ocorresse o processamento deste gás em uma unidade de processamento de gás natural (UPGN), seria possível obter por ano: 1,3 milhões de toneladas de etano, 1,8 milhões de tonelada de propano, 0,8 milhões de toneladas de butano e 0,4 milhões de toneladas de C5+. Utilizando apenas o etano, seria possível produzir 1 milhão de toneladas de polietilenos, quantidade equivalente ao que foi importado em 2022.


 

Os produtores de petróleo solicitaram à Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis (ANP) uma revisão da especificação do gás natural, retirando os limites existentes de metano (mínimo de 85%) e de etano (máximo de 12%), pois teriam dificuldade em especificar o gás do pré-sal processado na UPGN em Caraguatatuba, que recebe o gás através da Rota 1. A unidade projetada inicialmente para o gás do Campo de Mexilhão (que possuía teores de etano abaixo de 6%) utiliza uma tecnologia (Joule-Tompson) que não permite extrair o etano. Já o Terminal de Cabiúnas (TECAB) que também recebe o gás do pré-sal através do Rota 2, utiliza o processo de turbo expansão capaz de recuperar etano, que então é enviado para a Braskem em Duque de Caxias.


 

As Unidades no GasLub (antigo COMPERJ) também possuem tecnologia para retirar o etano, mas ainda não existe uma previsão clara para consumo na petroquímica. A unidade receberá o gás natural exportado pela Rota 3, com previsão de entrada em operação em 2024.


 

Os consumidores de gás natural, incluindo a indústria química e petroquímica, manifestaram-se contrários a essa mudança, pois a flexibilização dos limites poderia gerar uma série de impactos como o aumento de emissões, problemas em equipamentos e, principalmente, redução na oferta de etano ao mercado brasileiro.

 

O gás natural do pré-sal é uma matéria-prima associada à produção de petróleo. Por restrições de processamento das plataformas, caso ocorra instabilidade no escoamento, os operadores são obrigados a injetar mais gás no reservatório e nos casos em que isso não é possível, podem chegar a reduzir a produção de óleo. Por essa razão, não há como avaliar uma alternativa de destinação do gás sem uma demanda firme. Como a maioria dos campos está longe da costa, os elevados investimentos em gasodutos submarinos e UPGNs tornam-se um grande obstáculo quanto à viabilidade técnica e econômica para o desenvolvimento da indústria.


 

Mesmo que ultrapassada a questão da demanda firme, considerando, por exemplo, projetos mais integrados como a produção de fertilizantes ou de produtos petroquímicos, outro gargalo será a precificação deste gás. O Brasil tem apresentado baixa competividade no custo do gás como matéria-prima quando comparado com players internacionais deste segmento. Por exemplo, os Estados Unidos praticam preços cerca de 10 vezes menores que os do mercado brasileiro.

 

 

Sem dúvida, não existirá uma solução fácil que consiga alinhar todos os interesses dos envolvidos. O crescimento da indústria química passa por uma atuação mais enfática do governo, criando as condições favoráveis para o desenvolvimento da cadeia do gás natural no País.


 

Foto: Shutterstock

 


 

*Fábio de Oliveira Bello é consultor parceiro da OHXIDE Consultoria (Rio de Janeiro, RJ e Paulínia, SP) – ohxide@ohxide.com.br


 

 



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