A manufatura de peças complexas na técnica de microssistemas requer a aplicação flexível de diferentes processos de manufatura[8], incluindo aqui o microfresamento e a microfuração. Esta última, em especial, oferece grande potencial para a manufatura precisa e eficiente de furos na faixa abaixo do milímetro. As áreas de aplicação dos microfuros incluem as tecnologias de precisão de sistemas de fluidos, medicina e até mecanismos de relojoaria[5]. Em comparação com processos eletroquímicos, a exemplo da eletroerosão (EDM), as grandes vantagens da microfuração são o tempo substancialmente mais curto de usinagem com elevada qualidade de furação e os menores custos de ferramentas e máquinas[2].
Para a microfuração de materiais de corte difícil, existem atualmente no mercado diversos tipos de ferramentas. O conceito mais adotado é o da broca helicoidal, que pode ser construída em aço rápido (HSS) ou em metal duro inteiriço (VHM) com ou sem revestimento.
A importância da refrigeração
A refrigeração tem importância primordial para a segurança do processo de furação e para a eficiência nas áreas micro e macro. A aplicação de fluido refrigerante a alta pressão interna ou externa está relacionada com investimentos muito elevados, e é uma alternativa à refrigeração de mínima quantidade[3,4,9], cuja adequação foi comprovada em pesquisas anteriores[1,6,7] para a usinagem de microfuros profundos e com alimentação interna a alta pressão.
Um fator que pesa nos custos para a aplicação de sistemas de mínima quantidade de lubrificação (MQL) é principalmente a aquisição dos sistemas de alimentação. Existe a possibilidade
Figura 1 – Propriedades das ferramentas usadas
de uma alimentação externa de fluido refrigerante com baixa vazão para a usinagem de microfuros até a relação comprimento-diâmetro l/d = 5. Esse tipo de alimentação pode ser modificado, sem grandes custos, apenas com uma bomba e um sistema de alimentação. Além disso, o reservatório e a quantidade de líquido refrigerante podem ser pequenos.
Os resultados apresentados a seguir mostram os potenciais de diferentes conceitos de brocas helicoidais com alimentação externa de fluido refrigerante com vazão V = 1,5 L/min.
Condições dos ensaios
Os ensaios foram realizados no microcentro de usinagem da marca Kern, modelo HSPC 2522, equipado com o eixo -árvore VSC-4084 com rotação de 500 a 50.000 rpm e com um sistema de fixação por pinças de precisão HSK E 25. Como fluido refrigerante, foi usado o Rhenus R-Oil HM7 a uma vazão de 1,5 L/min e pressão de 1 bar.
Os ensaios foram executados com dois tipos de brocas com diâmetro d = 1 mm: de aço rápido com revestimento de nitreto de alumínio-cromo (AlCrN) e de metal duro inteiriço sem revesti- mento. As propriedades mais significativas das ferramentas estão listadas na figura 1. Com ferramentas específicas para o processo, foram executados furos de centro piloto com profundidade de 0,35 x d.
A tarefa de usinagem consistiu da execução de 140 furos passantes com profundidade de 5 mm, o que correspondia a uma trajetória
total L f = 700 mm. Os cursos para retirada de cavacos foram dispensados nessas operações.
Como material de ensaio, foi usado o aço inoxidável austenítico X5CrNi18-10 (1.4301), que tem múltiplas aplicações em micropeças nas indústrias de sistemas de medição e de componentes médicos, por causa da sua resistência ao desgaste e à corrosão e ainda por suas propriedades não magnéticas. Os problemas para o corte desse material são a formação de arestas de corte postiças e a tendência ao endurecimento a frio.
A matriz usada nos testes e os parâmetros de corte aparecem na tabela 1 para ambas as ferramentas. Foi levado em consideração o fato de que com as ferramentas de metal duro inteiriço podem ser utilizados parâmetros de usinagem mais elevados.
Resultados dos ensaios
As ferramentas de aço rápido propiciaram vida útil de trajetória (L f = 700 mm) até a velocidade de corte vc = 10 m/min e avanço f = 0,025 mm/rot. Antes dessa combinação de valores de corte, as ferramentas não apresentaram desgaste na superfície de folga com peque-
Figura 2 – Desgaste nas brocas de aço rápido (embaixo, as aderências de material formadas por causa de parâmetros de corte aumentados)
nas aderências de material da peça (figura 2).
Com o aumento da velocidade de corte e dos avanços, aumentaram significativamente as aderências de material. Isto pode ser explicado pelo crescimento da carga térmica que, por sua vez, amplia a ductilidade e a aderência do material. Por outro lado, aumentam proporcionalmente o nível de força e a pressão mecânica entre a ferramenta e a peça. O material soldado é cisalhado de forma contínua, o que pode ocasionar quebras do material de corte, e a vida útil fica nitidamente reduzida.
Com as ferramentas de metal duro, ao contrário, puderam ser feitos todos os testes até alcançar a trajetória de furação Lf = 700 mm. Na faixa de parâmetros de corte testada, todas as ferramentas apresentaram desgaste na superfície de folga com valores máximos Vbmax = 100 μm, velocidade de corte vc = 8 m/min e avanço f = 0,02 mm/ rot. Com a redução dos tempos de contato das ferramentas e o aumento dos avanços, esse desgaste ficou reduzido a valores de Vbmax = 60 μm (vc = 14 m/min e f = 0,02 mm/rot).
Após as 140 furações, todas as ferramentas mantinham estado de uso. Por isso, sob as condições de teste descritas, foi determinada a sua vida útil com os parâmetros vc = 12 m/ min e f = 0,03 mm/rot, e ainda vc = 14 m/min e f = 0,025 mm/rot. Até a falha das ferramentas, foi possível usinar 305 furos. Em relação à vida útil, isso significa que os va
Figura 3 – Cavacos em fita levemente helicoidais gerados pelas brocas de aço rápido e na forma helicoidais quebrada produzidos por ferramentas de metal duro inteiriço
lores de corte realizáveis com segurança do processo são bem menores para as ferramentas de aço rápido com revestimento do que nas ferramentas de metal duro inteiriço sem revestimento[4]. O uso de lubrificação periférica em abundância com menor fluxo abre um largo espectro de parâmetros de usinagem.
O transporte seguro dos cavacos equivale a um importante fator para minimizar as falhas das ferramentas na usinagem de furos. Esse efeito fica ainda mais acentuado na microusinagem, por causa da baixa estabilidade da ferramenta e dos canais para
Figura 4 – Em comparação com as ferramentas de aço rápido, as brocas de metal duro inteiriço oferecem melhor qualidade de furo
saída de cavacos de pequenas dimensões. É necessário analisar os cavacos para avaliar a segurança do processo.
Na figura 3 (pág. 48), foram representados os cavacos originados pelos dois tipos de ferramentas. Independentemente dos parâmetros de corte e usando ferramentas de aço rápido, formam-se cavacos em forma de fitas, ligeiramente helicoidais. No entanto, na área da fixação das ferramentas, eles formam ninhos.
Essas formas inconvenientes de cavacos foram observadas após pequena trajetória de contato, independentemente do desgaste das ferramentas, com todas as combinações de parâmetros de corte. Elas podem ser atribuídas a um raio de aresta de corte rβHSS ≈ 6 μm, bem maior do que nas ferramentas de metal duro inteiriço sem revestimento. Nessa condição, a separação de material é pior do que com o uso de ferramentas de aço rápido revestidas.
Quando a ductilidade do material da peça aumenta em decorrência de maiores velocidades de corte, que geram mais calor, fica favorecida a formação de cavacos longos. O aumento do avanço leva a uma diminuição da capacidade de deformação dos cavacos, e consequentemente a cavacos mais quebrados e mais curtos, que apresentam maior estabilidade, mas são mais difíceis de retirar do furo.
Com as ferramentas de metal duro inteiriço sem revestimento, as formas dos cavacos resultaram melhores, em especial, cavacos helicoidais quebrados. Não foram observadas a influência da trajetória de furação sobre a forma dos cavacos nem a formação de ninhos de cavacos. Por causa do menor raio de aresta de corte (rβHSS ≈ 3 μm), a separação do material é melhor. Esse resultado tem influência direta sobre a formação dos cavacos e faz com que os avanços maiores afetem pouco a formação dos cavacos, apesar da reduzida ductilidade do material.
A análise da qualidade do furo apoia os fenômenos descritos. A figura 4 mostra exemplos da qualidade do furo para três valores de corte, calculados na trajetória de furação. Na média, apresenta-se a clara influência do tamanho do canal da ferramenta de aço rápido sobre a formação dos cavacos. Por isso, esta ferramenta é mais sujeita a deformação.
Com o desvio de diâmetro ΔD, podem ser obtidas precisões dentro da faixa de tolerância ISO IT7. Não foi totalmente comprovada a influência de um parâmetro de corte específico, o que também vale para o desvio de circularidade TK. Com relação ao desgaste das ferramentas, em especial das brocas de metal duro inteiriço, pode-se determinar que não foi observada uma influência significativa sobre a qualidade do furo. Em princípio, as ferramentas de metal duro inteiriço apresentam vantagens quanto à qualidade alcançada.
Resumo
Este trabalho apresenta resultados da usinagem de microfuros com brocas helicoidais com diâmetro d = 1 mm. Foram usinados furos passantes com o comprimento de 5 mm em aço inoxidável austenítico X5CrNi18-10, com variação da velocidade de corte e do avanço. A alimentação de fluido refrigerante foi feita na forma de lubrificação externa por abundância com vazão de 1,5 L/min. As ferramentas usadas foram brocas de aço rápido com revestimento de AlCrN e brocas de metal duro inteiriço sem revestimento.
Os resultados mostraram que os parâmetros de corte com segurança do processo das brocas de aço rápido são bem menores do que os das brocas de metal duro inteiriço sem revestimento. A causa principal reside nos grandes acúmulos de material nas arestas de corte principal e trans- versal, que favorecem o desgaste da ferramenta por causa da adesão.
Por outro lado, o raio maior da aresta de corte das ferramentas revestidas prejudica a formação de cavacos e, consequentemente, a segurança do processo. A utilização de brocas de metal duro inteiriço sem revestimento oferece grande potencial para a usinagem de microfuros de alta qualidade, até a relação comprimento-diâmetro l/d = 5. Com a utilização da alimentação externa de fluido refrigerante e baixa vazão, a faixa de segurança do processo dos parâmetros de usinagem pode ser ampliada em comparação com o conceito de mínima quantidade de lubrificação.
Referências
1] Biermann, D. et al.: Minimalmengenschmierung beim Tiefbohren mit kleinen Durchmessern – Ein Verfahren wird trockengelegt. WB Werkstatt + Betrieb 144, 10, p. 68-71, 2011.
2] Fleischer, J. et al.: Mikroformeinsätze in gehär- teten Stählen – Ein Vergleich der Verfahren Mikrofräsen, Mikrofunkenerosion und Mikrola- serablation. wt Werkstattstechnik online 95, 11- 12, p. 887-891, 2005.
3] Heisel, U.; Schaal, M.; Wolf, G.: Burr formation in milling with minimum quantity lubrication. Production Engineering – Research and Development. 3, 1, p. 23-30, 2009.
4] Heisel, U.; Schaal, M.: Burr formation in short hole drilling with minimum quantity lubrication. Production Engineering – Research and Development 3, 2, p. 157-163, 2009.
5] Hesselbach, J. et al.: mikroPRO – Untersuchung zum internationalen Stand der Mikroproduktionstechnik. Instituts für Werkzeugmaschinen und Fertigungstechnik der TU Braunschweig, 2002.
6] Klocke, F. et al.: Bohren kleiner Löcher in austenitischen Stahl. wt Werkstattstechnik, 89, 5, p. 223-227, 1999.
7] Klocke, F. et al.: Bohren kleiner Löcher in den Kaltarbeitsstahl X155CrVMo12-1G. wt Werk- stattstechnik 90, 3, p. 108- 111, 2000.
8] Klocke, F.; von Bodenhausen, J.; Arntz, K.: Prozesssicherheit bei der Mikrofräsbearbeitung. wt Werkstattstechnik online, 95, 11-12, p. 882-886, 2005.
9] Weinert, K. et al.: Dry machining and minimum quantity lubrication. Anais do Cirp, 53, 2, p. 511-537, 2004.
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