A usinagem envolve forças ou ações ativas e não ativas. Por isso, não se iguala à composição de propriedades físicas da conformação mecânica. A junção de parâmetros, condições e variáveis faz da usinagem um meio de especular e de tentar explicar os fenômenos. Tais ações se refletem diretamente no desgaste das ferramentas, acabamento e integridade estrutural.

O aço ABNT 52100 tem características de aço endurecido, ou aço-rolamento. O torneamento de material endurecido é amplamente utilizado em aplicações industriais, a exemplo de elementos de transmissão (como engrenagens, eixos, rolamentos e cames), peças forjadas, moldes e matrizes. Esse tipo de usinagem exige tecnologia para remoção de materiais com dureza superior a 45 HRC[1].

Dependendo da ductilidade do material e das condições de usinagem, o cavaco formado pode ser classificado em diferentes tipos e formas. Para os materiais dúcteis, o cavaco originado é denominado contínuo e os materiais frágeis originam o cavaco de ruptura, que se apresenta quebrado em pedaços (descontínuos). A classificação mais comum do tipo de cavaco é citada tanto na literatura alemã e na estadunidense como contínuo, de cisalhamento e de ruptura[2,7,8].

Entretanto, uma classificação mais abrangente inclui os seguintes tipos: cavaco contínuo, cavaco parcialmente contínuo ou de cisalhamento, cavaco descontínuo ou de ruptura e cavaco segmentado[3].

A análise de contornos de grãos é um procedimento muito utilizado no meio metalúrgico para acompanhar os efeitos de tratamentos térmicos e processos de conformação. Quando se observam os contornos e tamanho de grãos podem ser avaliados alguns parâmetros e propriedades, tais como forças, velocidade de deformação e, respectivamente, dureza e resistência à deformação e à propagação de trincas.

Em operação de usinagem, o mecanismo de formação de cavacos sofre os mesmos processos da conformação e, dependendo do caso, tratamento térmico. Sempre lembrando que a diferença está no dinamismo do processo. Assim, analisar os cavacos pode ser um caminho interessante para determinar qual parâmetro seria ideal para melhoria da usinabilidade.

Análises de metalografia quantitativa são utilizadas para medir tamanho de grão e, por meio de ferramentas ou rotinas de software de processamento de imagens, podem ser realizadas tais análises utilizando, por exemplo, linhas de intercepto que dão a razão entre superfície e volume do grão ou fração volumétrica.

Além disso, as imagens podem ser beneficiadas por meio de filtros no domínio dos espaços melhorando os resultados das análises. Na última década, o desenvolvimento de hardware e software para caracterização dos materiais tem aumentado muito. Novas técnicas experimentais têm aparecido, com resultados mais precisos sobre o comportamento mecânico dos materiais[6].

As imagens digitais são eficientemente armazenadas em arquivos de computador, podendo ser processadas e analisadas para fornecer informações quantitativas. Um grande número de informações quantitativas pode ser obtido, tal como forma, posição, tamanho e textura etc. Para ajudar as análises, o processamento de imagens dispõe de filtros que podem ser divididos no domínio espacial e da frequência. As operações podem, ainda, ser feitas nos pixels locais, conforme os seus vizinhos, com possibilidade de diminuir ou atenuar ruídos. Já o processamento no domínio da frequência utiliza a transformada rápida de Fourier para modificação da imagem[4].

 

Materiais e métodos

Para o processo de torneamento desenvolvido neste trabalho, utilizou-se um torno CNC Nardini Logic 175, com potência máxima de eixo de 5,5 kW, rotação máxima de 4.000 rpm; torre com oito posições e torque máximo de 200 Kgf.m. Foram utilizadas também pastilhas de cerâmica mista (Al2O3+TiC) revestidas com nitreto de titânio (TiN), classe GC 6050, com geometria alisadora ISO CNGA 120408 S01525WH, da fabricante Sandvik. O suporte da ferramenta foi o ISO DCLNL 1616H12, com ângulo de posição de 95º, ângulo de saída de 6º, ângulo de inclinação de 6º e ângulo de folga de 7º.

Os corpos de prova de aço ABNT 52100 utilizados nos ensaios apresentavam dimensões de 49 mm de diâmetro e 50 mm de comprimento. A elevada dureza deste aço é alcançada pelo processo de têmpera por indução. O material geralmente é tratado com preaquecimento por 2 horas a uma temperatura de 500°C, e aquecido por 40 min a 830°C, seguido por um resfriamento de 30 min (martêmpera a 180°C). Depois, é resfriado ao ar até 80°C, revenido por 2 horas a 200°C e novamente resfriado ao ar até aproximadamente 30°C.

Nos ensaios realizados, foram adotados dois níveis de variação para cada um dos parâmetros de usinagem estudados. A tabela 1 apresenta os fatores velocidade de corte vc, avanço f e profundidade de usinagem ap com seus respectivos níveis de variação. Os níveis foram especificados em função de dados recomendados pelo catálogo do fabricante das ferramentas.

Para cada parâmetro escolhido foram coletados os cavacos para as análises. Esses cavacos foram embutidos em posição perpendicular para analisar a espessura que, por sua vez, apresenta as regiões de deformações e gera processo inerente do mecanismo de formação do cavaco. Todo procedimento metalográfico foi cuidadoso, pois, dependendo do processo, até o polimento perde- -se a largura final dos cavacos devido à pequena profundidade de usinagem. O ataque químico para revelação dos contornos de grãos foi o reagente nital.

 

Resultados e discussão

A composição que resultou no tratamento térmico é uma microestrutura de martensita com até 5% de austenita retida. A dureza do aço ABNT 52100 atingiu 50 HRC. A composição química deste aço é mostrada na tabela 2.

O material resultante revelou cavacos segmentados caracterizados por grandes deformações continuadas em estreitas bandas de deformação. Conforme a morfologia dos grãos entre os segmentos, os seus interiores apresentaram pouca ou quase nenhuma deformação. Trata-se de um processo muito diferente do cavaco contínuo. Com auxílio da ferramenta em expansão na área tecnológica, os softwares de processamento e análise de imagens podem avaliar melhor as condições da morfologia dos cavacos. Aspectos como linha de deformação, bandas de deslizamento e encruamento dos grãos são específicos na conformação mecânica, mas também ocorrem em processos de usinagem, porém de forma rápida e dinâmica.

A figura 1 apresenta uma micrografia do aço ABNT 52100. Os grãos da direita se apresentam finos e com tendências na forma homogênea quanto ao seu tamanho.

Figura 1 – Micrografi as do aço 52100, ataque nital.

Por meio da figura 2 pode ser observado o cavaco revelado para as análises. As regiões mais lisas são identificadas pela falta de contornos de grãos delineados por regiões com maior concentração de grãos.

Figura 2 – Micrografia do cavaco do aço 52100, ataque nital 2% com aumento de 40X (a) e 100X (b).

O fato revelado deve-se à movimentação dos grãos na hora da usinagem. No processo de recalque, os grãos são aglomerados e encruados, a ponto de sofrer cisalhamento total de seus planos até o rompimento parcial. Outra porção é formada de forma dinâmica e repetitiva. O cavaco rompe-se depois que a tensão de cisalhamento alcança o seu valor máximo.

A figura 3 mostra o processamento das imagens dos cavacos realizado no programa de domínio público ImageJ, para determinar as áreas dos grãos. A rotina criada do processamento passa pela transformação das imagens para 8 bits. Posteriormente, foi utilizado um filtro passa-banda e a imagem foi subtraída da baquelite. Na sequência, foi transformada em binária, para processamento outline.

Figura 3 – Micrografi a do cavaco do aço 52100 processado pelo ImageJ.

Para os cálculos das áreas dos contornos dos grãos, todas as imagens foram calibradas de pixels para mícrons, conforme a ampliação e as barras das imagens em mícrons. Após calibradas as medidas, foram feitas as análises de partículas, que conferem os valores em fração de área e estatística, conforme a segunda figura anterior.

A tabela 3 descreve os valores estatísticos do corpo de prova sem ser usinado, mostrado na figura 1 (lado direito da tabela) e a média geral dos cavacos embutidos dos passes de usinagem. As diferenças são grandes, pois os contornos de grãos dos cavacos não são morfologicamente homogêneos e as regiões foram medidas nas pontas dos cavacos, onde havia mais grãos delineados. Na média, os tamanhos de grãos ficaram maiores, pois isso se deve à deformação instantânea.

 

Conclusão

Os resultados revelaram enorme variação dos tamanhos de grãos de uma região a outra dentro do mesmo cavaco e com o uso dos mesmos parâmetros de usinagem. Isso torna as explicações ainda mais difíceis pelas teorias existente, como descritas por Ferraresi[2].

O método automático de determinação dos tamanhos de grãos pode ser muito mais eficiente do que as normas vigentes. Além disso, por meio desta técnica, pode-se ainda determinar as melhores condições de corte, já que, dependendo das condições dos cavacos, podem ser revelados maiores desgastes das ferramentas e rugosidade elevada.

 

Referências

  1. Campos, P. H. S.; Ferreira, J. R.; Paiva, A. P.; Balestrassi, P. P.: Modelagem da vida da ferramenta e da rugosidade no torneamento ABNT aço endurecido A 52100 com cerâmica mista wiper utilizando metodologia de superfície de resposta . Cibim 10, Porto, Portugal, 2011.
  2. Ferraresi, D.: Fundamentos da usinagem dos metais . Ed. Edgard Blucher Ltda, São Paulo, 1977.
  3. Machado, A. R.; Silva, M. B.: Usinagem dos metais . Universidade Federal de Uberlândia, MG, 8 a ed., 257 p., 2004.
  4. Rafael, G. C.; Woodds, R. E.: Digital image processing. Addison-Wesley, 2a ed., 716 p., 1993.
  5. Russ, J. C.; Dehoff, R. D.: Practical stereology. Ed. Plenum Press, New York, 2 a ed., 306 p.
  6. Sánchez-Arévalo, F. M.; Pulos, G.: Use of digital image correlation to determine the mechanical behavior of materials . Materials Characterization, 59, p. 1.572-1.579, 2008.
  7. Schwerd, F.: Spanend Werkzeugmashinen. Berlim, 1956.
  8. Sibel, E.: Handbusch der Werkstoffprufung . Berlim, 1955.

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