Dentre as operações de rosqueamento da indústria metalmecânica, pode-se distinguir duas grandes classes de trabalho com os metais: o processo de usinagem e o de conformação. A usinagem confere à peça a forma, a dimensão e/ou o acabamento, com a remoção de cavaco, enquanto nos processos de conformação há a constância do material que passa por alterações em sua forma mediante deformação plástica. Esse é um processo ainda pouco usado pelas empresas que fabricam componentes roscados e executam essa operação na própria máquina operatriz. A laminação de roscas proporciona grande vantagem em relação a processos similares pelo fato de não produzir cavacos e, por isso, não necessita de processos de reciclagem específicos. Entretanto, a disponibilidade de manuais com informações técnicas sobre esse processo ainda é uma barreira para a sua efetiva aplicação(1, 3). Componentes mecânicos podem ser unidos por meio de fixação permanente, soldagem ou fixação removível, pelo uso de parafusos, rebites, pinos, entre outros(5). Devido à facilidade na substituição e reparo, o uso de parafusos se torna mais comum. Considerando o período do início da revolução industrial até a década de 1980, pode-se dizer que a evolução do processo de rosqueamento dentro da indústria foi modesta. Basicamente, o processo de rosqueamento interno mais usado sempre foi realizado na indústria, com ferramentas denominadas machos. Esse processo promove, assim como no torneamento, fresamento e furação, a geração de cavacos, que são na sua maioria expulsos pelos fluidos de corte durante a usinagem(1).

No processo de rosqueamento interno, cada dente do macho laminador da redução de guia funciona como uma ferramenta trabalhando individualmente assim que entra em contato com a parede do furo a ser rosqueado. Entretanto, no rosqueamento por conformação, o macho laminador gera a deformação do material, que ocorre à frente dos dentes da ferramenta. Assim, o material deformado vai se acumulando entre as faces dos dentes, do lado das estrias do macho laminador. É esse material que vai formando o perfil da rosca à medida que os outros dentes vão deformando mais o material e acumulando-o entre as faces dos dentes, até que o último dente da redução de guia do macho trabalhe o material, e este assuma a forma da crista final do filete(1). A resistência dos filetes de rosca ao cisalhamento aumenta devido à deformação dos grãos do material acompanhar o contorno dos filetes(9). A ruptura por cisalhamento (fratura do material quando submetido a um esforço mecânico) ocorre geralmente de forma intergranular ou transgranular. Com o alongamento dos grãos devido ao processo de conformação é mais difícil ocorrer a fratura transgranular, que passa pelo grão conforme o sentido de aplicação dos esforços, e também, assim, é difícil ocorrer a fratura intergranular, que contorna os grãos, pois esses contornos estarão perpendiculares à aplicação dos esforços(4).

Em se tratando de métodos que envolvem a remoção de cavacos, o rosqueamento é o mais indicado devido à sua versatilidade. Assim, o rosqueamento feito por usinagem se sobrepõe ao realizado por conformação, uma vez que o primeiro é muito mais difundido. Pode-se dizer que, dentre os processos de usinagem, o rosqueamento é um dos mais difíceis de ser executado devido à complicada remoção de cavacos e lubrificação na zona de corte(6), além da necessidade de uma relação inalterável entre a velocidade e o avanço de corte, definida pelo passo da ferramenta(1). Na confecção de roscas internas usando machos o perfil é construído a partir do deslocamento da ferramenta no sentido axial e com um movimento rotativo simultâneo. O macho apresenta um formato cônico na sua parte inicial, o que permite que as arestas de corte removam secções pequenas inicialmente e aumentem de forma progressiva. Além disso, na construção da ferramenta existem arestas de corte radiais que dividem as secções de corte no sentido radial e axial, permitindo a geração do perfil da rosca de forma gradual(8). Mais pesquisas experimentais sobre a influência das variáveis durante a laminação de roscas têm que ser realizadas. Assim, o processo de laminação de roscas poderá se tornar mais atraente, principalmente, se os tempos de produção forem idênticos ou menores que os tempos do tradicional processo de usinagem de roscas, pois a não geração de cavacos já torna o processo de laminação de roscas bastante competitivo(4). O aço SAE 1045 é amplamente utilizado na indústria, devido à sua vasta aplicabilidade. Possui boa relação entre resistência mecânica e à fratura, tendo como principal característica sua resistência à tensão e razoável tenacidade. O alumínio 7075 T6, extremamente leve, apresenta alta relação entre resistência e peso, alta resistência à corrosão e dureza, além de muitas outras características benéficas. Entretanto, seu custo é mais alto do que o de outros alumínios e aços. Assim, torna-se necessário o estudo sobre o uso desse material no rosqueamento, comparando os resultados obtidos com o aço SAE 1045, relacionando o comportamento de cada material quando submetido à tração e quando se varia o número de filetes.

 

Metodologia

Para a realização do estudo, foram usados corpos de prova de aço SAE 1045 e de alumínio AA 7075-T6 com 31 mm de diâmetro externo e 15 mm de altura, possuindo roscas usinadas e conformadas. Para a preparação das amostras foi usado um centro de usinagem CNC com cabeçote com velocidade de trabalho de 10.000 rpm e motor principal com potência de 12,5 kW, onde ocorreu a furação e o rosqueamento das mesmas usando machos de roscar modelo M8-ISO2/6H, e conformado, usando modelo M8-6HX, ambos com cobertura de titânio e da marca Emuge-Franken (figura 1).

 

Figura 1 – Machos de roscar utilizados nos experimentos (Fonte: os autores)

Também foi utilizado um dispositivo que possibilitou a fixação dos corpos de prova cilíndricos na mesa do centro de usinagem (figura 2). Foram fabricados nove corpos de prova de alumínio AA 7075-T6, sendo três corpos de prova com um filete, três com três filetes e outros três corpos de prova com cinco filetes, possibilitando assim que cada experimento de tração fosse repetido três vezes. Seguindo a mesma metodologia, foram fabricados também nove corpos de prova de aço SAE 1045, sendo três corpos de prova com um filete, três com três filetes e outros três corpos de prova com cinco filetes. Assim, no total foram fabricados e testados 18 corpos de prova.

 

Figura 2 – Rosqueamento dos corpos de prova (Fonte: os autores)

Em seguida, os corpos de prova foram levados à máquina universal de tração EMIC 23-100, com capacidade de carga de 10.000 kgf, e a velocidade de deslocamento usada foi de 1 mm/min. Para que fosse possível o tracionamento das roscas através dos parafusos, se fez necessária a confecção de um suporte que facilitasse a retirada dos mesmos, presos aos corpos de prova rompidos. Ele foi feito em aço 1045, sendo usinado no laboratório de usinagem da instituição, e em seguida foi submetido à têmpera em óleo (figura 3). Para a aquisição de dados, foi usado o software Stress Machine VIEW 1.0, que gerou os gráficos cedidos pela máquina por meio de conversão de sinais pelo módulo da marca National Instruments modelo NI USB-6210. Assim, foi possível encontrar a curva de tensão x deformação de engenharia juntamente com os dados de carga e tensão de escoamento, máxima e ruptura. Neste trabalho não foram considerados os mecanismos de falha das roscas, pois para isso seria necessário o corte transversal das amostras tracionadas e, como todas as amostras de um e três filetes foram destruídas, não foi possível avaliar a microestrutura das roscas.

 

Figura 3 – Conjunto suporte-gabaritoamostra durante o ensaio de tração (Fonte: os autores)

 

Análise dos resultados

Pelo ensaio de tração foram obtidos os dados necessários para as análises de resistência das roscas. Foi considerada apenas a carga máxima de resistência das amostras, visto que é o parâmetro de referência do estudo. Para melhor entendimento pela comparação das amostras ensaiadas, gráficos foram gerados com o auxílio do software mencionado anteriormente. A seguir, há gráficos com três filetes de rosca para os doimateriais, pois os demais gráficos apresentaram comportamento similar ou diferenciando apenas nos valores de resistência. Na figura 4 pode-se perceber que a carga máxima aplicada na amostra usinada foi maior, obedecendo aos demais ensaios realizados no alumínio AA 7075-T6, em que a carga máxima suportada e a tensão de ruptura foi maior. Na figura 5 podemos observar que no caso do aço SAE 1045 a amostra conformada obteve maior resistência à tração, tendo um comportamento inverso ao do alumínio analisado. Porém, obedecendo aos demais dados coletados com valores de resistência próximos aos da variação do tipo de rosca. Na tabela são mostrados os resultados da análise de variância da força máxima (kgf), em que pode-se observar que apenas o número de filetes e o material tiveram influência na força máxima considerando os efeitos principais. Entretanto, a interação entre os dois fatores filetes vs. material e filetes vs. processo influenciou a resposta de força máxima. Analisando as variações de resistência máxima do material (figura 6), observa-se que, como era espera do, a resistência do furo roscado aumenta proporcionalmente ao aumento do número de filetes rosqueados no parafuso. O valor mínimo encontrado foi de 544, 8 kgf para um filete e o valor máximo foi de 4.647,0 kgf, para cinco filetes, que corresponde a um aumento de 752% da resistência da rosca com um aumento de apenas quatro filetes no rosqueamento do parafuso dentro do furo.

 

Figura 4 – Gráfico de força-deformação da amostra de alumínio AA 7075-T6 com 3 filetes de rosca usinada e conformada (Fonte: os autores)

Figura 5 – Gráfico de força-deformação da amostra de aço SAE 1045 com 3 filetes de rosca usinada e conformada (Fonte: os autores)

Figura 6 – Gráfico de efeitos principais da força máxima (kgf) para amostras variando o número de filetes (esquerda) e o tipo de material (direita) (Fonte: os autores)

Entretanto, considerando o tipo de material, observa-se que (figura 6, à direita) o alumínio AA 7075- T6 tem resistência 36% menor que a do aço SAE 1045. Sendo o valor médio para o aço SAE 1045 de 2.848,2 kgf, e para o alumínio foi de 2.092,3 kgf. Neste trabalho esperava-se que a resistência de roscas fabricadas em alumínio fosse menor que a de roscas de aço. Portanto, pode-se definir que existe uma resistência que deve ser considerada na fabricação de componentes de aço SAE 1045 e de alumínio AA 7075-T6.

Na figura 7 observa-se o gráfico de interação entre número de filetes e o material. Nota-se que para um filete existe uma pequena tendência ao aumento de resistência, e considerando a variação do material, nestas condições pode-se definir que para um filete de rosca o alumínio AA 7075-T6 tem maior resistência que o aço AE 1045, sendo a resistência em torno de 174%. Entretanto, à medida que são usados mais filetes de rosca na fixação, percebe-se não apenas que a resistência aumenta, para os dois materiais, mas que o aumento da resistência é mais significativo para o aço SAE 1045 do que para o alumínio AA 7075-T6. No caso de cinco filetes de rosca nota-se uma redução de 49% da resistência das roscas mudando-se o material, do aço SAE 1045 para o alumínio AA 7075-T6. O gráfico de interação (figura 7) confirma a tendência ao aumento da resistência das roscas proporcional ao material, ou seja, roscas fabricadas em alumínio AA 7075-T6 sempre terão menor resistência que as fabricadas em aço SAE 1045.

 

Figura 7 – Gráfico de interação entre o número de filetes e o material (Fonte: os autores)

O gráfico de interação na figura 8 mostra que ao contrário do que ocorreu com a interação do tipo de material com o número de filetes, para um filete fabricado, a resistência é reduzida em torno de 172% para roscas conformadas. O aumento da resistência só pode ser percebido de forma significativa para cinco filetes, pois ocorre um aumento de 32% quando são fabricadas roscas conformadas. Para três filetes de rosca o aumento da resistência foi menor, com uma variação de apenas 5%. Neste caso, deve-se considerar que o valor de 5% está dentro do erro estatístico utilizado nestes experimentos e, assim, pode-se considerar que para três filetes, ambos os processos apresentam a mesma resistência à tração.


Figura 8 – Gráfico de interação entre o número de filetes e o tipo de processo (Fonte: os autores)

A força máxima suportada pelo parafuso usado foi menor que a suportada pela amostra conformada feita de aço e possuindo cinco filetes de rosca. Assim, em todos os experimentos com cinco filetes os parafusos se romperam (figura 9), com uma média de valores de 4.995 kgf, sendo este valor bem acima do previsto pelo fabricante, que define uma carga máxima de 3.550 kgf para parafusos da classe 12.9(2).


Figura 9 – Parafuso rompido após o ensaio (Fonte: os autores)​​​​​​​

Os resultados da análise estatística com cinco filetes correspondem aos valores registrados pouco antes da ruptura do parafuso. A falha do parafuso ocorreu em uma região da parte roscada que estava fora da peça testada. Assim, entende-se que a região roscada pode ter funcionado como um concentrador de tensão, facilitando o rompimento do parafuso.

 

Conclusão

De acordo com os resultados obtidos no estudo das variações de resistência máxima entre o aço SAE 1045 e o alumínio AA 7075- T6, variando o tipo de processo de fabricação e a quantidade de filetes de rosca, pode-se concluir que o número de filetes tem fator decisivo na montagem de produtos roscados. Considerando os materiais testados, sugere-se o rosqueamento de cinco ou mais filetes para ambos materiais nas montagens industriais; roscas fabricadas em peças de aço SAE 1045 terão resistência maior que roscas fabricadas em alumínio AA 7075-T6, independentemente do tipo de processo usado para a fabricação das roscas; roscas conformadas têm maior resistência que roscas usinadas, porém deve-se considerar esta afirmação apenas para o rosqueamento de cinco ou mais filetes; considerando a resistência determinada para o parafuso classe 12.9, a montagem com cinco ou mais filetes de rosca sempre terá uma resistência superior, devendo-se assim considerar que a falha ocorrerá sempre no parafuso.

 

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Referências

1] Carvalho, A. O. Análise da dinâmica do processo de rosqueamento por conformação da liga de Magnésio AM 60. 116f. Dissertação (Mestrado)- Programa de Pós-graduação em Engenharia Mecânica, Universidade Federal de São João del-Rei, São João del-Rei, 2011.

2] CISER, parafusos e porcas; Informações técnicas - Uso orientativo, catálogo técnico, 16 páginas, www.ciser.com.br/download/ informacoes-tecnicas, acesso em 19 de agosto de 2019. 

3] Maciel, D. T. Estudo dos processos de rosqueamento por laminação e usinagem na liga de titânio TI-6AL4V. Dissertação (Mestrado)-Programa de Pós-graduação em Engenharia Mecânica, Universidade Federal de São João del-Rei, São João del-Rei, 2013.

4] Oliveira, J. A. Estudo do processo de rosqueamento por conformação na liga de alumínio 7075-T6. Dissertação (Mestrado)-Programa de Pós-graduação em Engenharia Mecânica, Universidade Federal de São João del-Rei, São João del-Rei, 2016. 

5] Lauro, C. H.; Baldo, D.; Brandão, L. C.; Christoforo, A. L.; Carvalho, A. O. Estudo da deformação de filetes de rosca interna produzida por laminação. Anais do 1º CONEMAT – Congresso das Engenharias, Arquitetura e Agronomia. Mato Grosso, p. 686-695, 2010 

6] Reis, A. M.; Coelho, G. A. B.; Barbosa, F. Q.; Silva, M. B. Estudo da relação entre forças axial e radial e o desgaste da ferramenta para o processo de rosqueamento interno. Anais do 3º COBEF, p. 1-101, 2005. 

7] Reis, A. M.; Júnior, W. S.; Júnior, A. M. S.; Silva, M. B. Avaliação do desempenho de ferramentas de aço-rápido com e sem revestimento no rosqueamento interno do ferro fundido cinzento GH-190. Anais do 3º COBEF, p. 1-10, 2005. 

8] Komura, A.; Yamamoto, M.; Ikawa, N. Study of tapping method for large size threads – consideration for the oversized effective diameter by tapping. Bulletin of the Japan society of precision engineering, v. 24, nº 3, p. 178-183, 1990. 

9] Stemmer, C. E., Ferramentas de Corte 1. 1995. Florianópolis, Universidade de Santa Catarina.


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